domingo, 30 de junho de 2013

Bento Domingues: "Pobreza escandalosa e pobreza virtuosa"

Início do texto de Bento Domingues no "Público" de hoje:

O Papa Francisco não tem precisado das habituais campanhas de marketing destinadas à construção de uma vedeta, para consumo dos meios de comunicação social. Os gestos simples, calorosos e alegres de proximidade surgem como o seu modo de ser. O que lhe importa é deslocar os olhos das pessoas para o mundo dos pobres, excluídos e marginalizados, denunciando as opções económicas e financeiras que aprofundam o abismo entre os muito pobres e a dominação de interesses incontrolados, a nível local e global.

sábado, 29 de junho de 2013

Anselmo Borges: "O sétimo mandamento e a parábola de Francisco"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje.

A quem rouba pouco chamam-lhe gatuno e metem-no na cadeia; pelo contrário, a quem o faz em grande escala chamam-lhe grande financeiro e recebe todo o tipo de elogios e felicitações pelo seu espírito empresarial." Quem isto escreve é um filósofo espanhol que, embora ateu e anticlerical, muito estimo: Fernando Savater, que acaba de publicar um pequeno livro de reflexão sobre - é este o título - "Os Dez Mandamentos no Século XXI".

Não roubar referia-se, antes de mais, ao sequestro de pessoas, ao roubo de outros seres humanos, frequente para arranjar escravos. Esse rapto continua hoje, sobretudo para conseguir órgãos. Mas também continuam os raptos dos opositores políticos e de bebés, como aconteceu na ditadura argentina, tanto mais horrorosos quanto foram praticados também por pessoas ligadas à religião, até de missa diária. Ora, "o corpo é a propriedade elementar que cada um de nós tem e ninguém quer ser utilizado, raptado ou manipulado por outros".

Há múltiplas formas de roubo: o roubo da dignidade, do tempo, de ideias. É impressionante o que se passa em situações de catástrofe, como terramotos e inundações: no meio do caos e da desordem, o saque em massa. É como se populações desfavorecidas pudessem, finalmente, participar no festim do capitalismo e do consumo.

Na realidade, quando falamos em roubo, referimo-nos, em princípio, a tirar às pessoas injustamente os bens que possuem e a que têm direito. Mas, em caso de necessidade, ainda se pode falar de roubo? Quem condenaria alguém por roubo, concretamente se se rouba a uma pessoa rica ou uma instituição endinheirada, para, numa situação de desespero, comprar um remédio ou pão para um filho esfomeado? "Há matizes morais e jurídicos que diferenciam quem rouba um pedaço de pão e quem tira a uma viúva o sustento com que alimenta os filhos." Lá está o carácter insaciável de algumas pessoas com quantidades de dinheiro suficientes para mais de dez vidas e que continuam a roubar. No entanto, só podemos comer três vezes ao dia e dormir numa cama de cada vez. "No fundo, há um limiar a partir do qual o dinheiro se transforma numa doença e não numa ajuda." Aí estão os especuladores gananciosos, que enriquecem utilizando mecanismos e sistemas que, embora não constituam delito no sentido estrito do termo, equivalem a roubar do ponto de vista moral: legalidade e moralidade não coincidem, "sobretudo em situações de penúria e escassez". Ora, no dia em que escrevo, leio, num documento divulgado pela organização não governamental Oxfam, que os paraísos fiscais ocultam 14 biliões (14 seguido de 12 zeros) de euros, que, se fossem taxados, poriam duas vezes fim à pobreza extrema no mundo.

E os impostos? Lá está o dito célebre: duas certezas na vida: morrer e ter de pagar impostos. A justificação destes só pode ser o bem comum e o bem-estar, como bens colectivos, segurança social, protecção no desemprego e na doença, garantidos pelo Estado. Se o Estado não cumpre os seus deveres, nomeadamente na sua função redistributiva, pode chegar-se a "uma forma legal de roubo".

O Papa Francisco não se tem cansado de insistir na necessidade de trazer a ética para a economia e para a finança. Na sua linguagem simples, evocou recentemente uma parábola para explicar a crise. Como se trata de uma "crise do homem, que destrói o homem, que despoja o homem da ética, tudo é possível, tudo se pode fazer, e vemos como a falta de ética na vida pública faz tanto mal a toda a humanidade". E vem a estória, contada por um rabino do século XII. Aquando da construção da Torre de Babel, era necessário fabricar tijolos do barro, meter-lhe palha, levá-los ao forno e, já cozidos, transportá-los para o alto. Cada tijolo era um tesouro, devido a todo o trabalho para o fabricar. Quando caía um tijolo, era um drama e o operário era castigado. Mas se caísse um operário nada acontecia.

"Isso é o que se passa hoje: se os investimentos nos bancos caem, é uma tragédia, mas se as pessoas morrem de fome, se não têm nada para comer nem têm saúde, não acontece nada. Esta é a crise actual."

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Conspiração judaica no Vaticano. E o Papa na SIC

Henrique Cymerman (que nome tão português e tão judeu; até Bob Dylan tem um, Zimmerman), com a cunha do amigo judeu, chegou ao Papa. Conspiração judaica no Vaticano, portanto. Sorte grande para o jornalista e para a SIC. Vem na "Visão" de hoje. Quero ver logo à noite, embora suspeite que não vá ser possível devido a duas pequenas criaturas, não porque dominem a televisão, mas porque após o jantar é hora de brincar às escondidas, a descarregar o resto das pilhas antes do sono (as minhas acabam sempre primeiro). Mas sim, vou gravar.







Como ficar calado?


Como sou são sei o quê de uma certa intelectualidade das esquerdas, partidário do PCI frente à DC, a todos lhes parece mal que eu tenha dado o meu ponto de vista sobre a figura de Jesus de Nazaré.

Pier Paolo Pasolini

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Marco Politi: "O apartamento vazio do Papa Francisco assusta o Vaticano"

É aqui que o Papa Francisco não mora

Admirável prosa de Marco Politi (que já por aqui andou, por exemplo), no “Il Fatto Quotidiano” de domingo passado, sobre os 100 dias do Papa Francisco. Respigo alguns parágrafos (quase tudo, aliás). Texto todo aqui. Enquanto Igreja também me sinto questionado.

A decisão é tão inédita e chocante que o pântano conservador – aninhado no Vaticano e na Igreja universal, embora provisoriamente silenciado pelo fracasso do pontificado ratzingeriano – tenta rebaixar o gesto como "estilo pessoal", um pequeno tique de originalidade. Mas é como se Obama deixasse a Casa Branca, ou a rainha da Inglaterra desertasse oBuckingham Palace, preferindo um alojamento ao lado da Victoria Station. Bergoglio desvaloriza radicalmente o Palácio, exalta o verdadeiro chefe da Igreja – Cristo – e se coloca abertamente entre os "pecadores" como são os fiéis aos quais ele se dirige. 
Os símbolos contam muito. Especialmente quando são arquivados. Dia após dia, o papa que veio do fim do mundo desmontou a simbologia imperial e quase divina dos pontífices. Ele rejeitou o manto e os sapatos púrpuras dos imperadores romanos, eliminou as mitras triunfalistas, ficou na chuva com os fiéis, explicou que viver isolados como soberano não lhe é possível por "motivos psiquiátricos", como se dissesse que é coisa de anormais se encerrar em uma torre de marfim. 
Ele disse a expressão mais afiada – que muitos no Vaticano e nas esferas cardinalícias tentam esquecer – a uma menina (escolha precisa de se dirigir aos inocentes: Bergoglio, assim como João XXIII, nunca fala por acaso). Quem busca o papado, proferiu, não é uma pessoa equilibrada. "Uma pessoa que quer ser papa não quer bem a si mesma, e Deus não a abençoa". 
O Palácio vazio, redimensionado como sede de trabalho, expressa uma reviravolta epocal. Inquieta dentro e fora da Cúria. Despedaça o ícone ideológico da "sede apostólica" como centro de um poder de cunho divino. Impede que a burocracia vaticana se cubra de pretensões de infalibilidade. Reforça o pedido aos bispos do mundo para que não adoeçam com a "psicologia de príncipes". 
Bento XVI, abdicando, humanizou o papel papal. Francisco tira as suas consequências, apresenta-se somente como "bispo de Roma" e arquiva a aura onipotente de Pontífice Máximo. Bergoglio não é o primeiro papa global – Wojtyla marcou o salto de qualidade –, mas é o primeiro papa que descarta a ideologia da onipotência. 
O início do pontificado foi marcado por sinais claros. A Igreja deve ser pobre, clero e bispos não são autorreferenciais, os padres devem se projetar para as periferias existenciais. Não se trata de cuidar do próprio rebanho dentro dos muros das paróquias, porque agora não é a única ovelhinha que está perdida, mas são as "99 ovelhas" de 100 que estão longe. A corrupção e o escândalo de vidas duplas hipócritas no Vaticano (gays ou heterossexuais, pouco importa) deve ser resolvido. 
O enigma desse início de pontificado está aqui. Reestruturar a Cúria Romana não é difícil, limpar o IOR também não é impossível. Mas reformar a Igreja Católica, habituar os bispos a serem missionários sóbrios no estilo de vida e não potentados locais, reprogramar o pessoal vaticano e o clero a um trabalho essencialmente pastoral e não de funcionários mais ou menos sistematizados, erradicar tráficos, tirar da Cúria o papel milenar de centro burocrático e de poder incontestável, fazendo dela um instrumento de unidade em espírito de colaboração com os episcopados do mundo... é um objetivo gigantesco.

Divino

Não creio que Cristo seja Filho de Deus, porque não sou crente, pelo menos conscientemente. Mas creio que Cristo é divino: quer dizer, creio que nele a humanidade é tão alta, rigorosa, ideal, que vai muito para além dos limites habituais do humano.

Pier-Paolo Pasolini

domingo, 23 de junho de 2013

Bento Domingues: "O Pacto das Catacumbas"

Início do texto de Bento Domingues no "Público" de hoje:

João XXIII, um mês antes da abertura do Concílio Vaticano II, na radiomensagem de 11 de Setembro de 1962, espantou os próprios católicos com a declaração: “Hoje, a Igreja é especialmente a Igreja dos pobres”. Em número, esta afirmação não podia ser mais exacta. Por que terá, então, levantado tanta celeuma? Creio que, passados cinquenta anos, continua a ser estranha. O Papa Francisco acaba de surpreender muita gente, com gestos e atitudes, que já deveriam ser uma prática corrente. É certo que o Vaticano II alterou uma eclesiologia piramidal. Mas não podia mudar a mentalidade e representações que foram cimentadas ao longo de séculos. Ainda hoje, quando se fala de Igreja não pensamos logo em comunidades cristãs. Pensamos em padres e na hierarquia eclesiástica presidida pelo Papa, rodeado por um conjunto cardeais, com sede no Vaticano. Essa não é a imagem mais directa da pobreza. Verdadeira ou falsa, não é apenas a propaganda anticlerical a dizer que a Igreja é rica e está ao serviço dos ricos e poderosos.

O resto, aqui, amanhã.

sábado, 22 de junho de 2013

Anselmo Borges: "Atenienses e mélios, Portugal e a Europa, poder e política"

Final do texto de Anselmo Borges no DN de hoje:

Qual é o problema? Nos tempos modernos, nos Estados-nação, houve durante cerca de duzentos anos um casamento entre poder e política, e julgou-se que "poder e política deveriam continuar de qualquer maneira a viver juntos: a arte política como o poder de fazer coisas, diga-se um poder regulado, compensado e orientado pela política". Ora, o que está a acontecer é que numa globalização meramente negativa não conseguimos ainda instituições políticas de carácter global e o poder tende a evaporar-se no ciberespaço, num mundo planetário. Em síntese, "o poder globaliza-se enquanto a política permanece local". O poder já não está subordinado à política nem é por ela limitado. "A política encontra-se cada vez mais desprovida (e torna-se cada vez mais destituída) de poder, e os Estados-nação, como tal, podem fazer cada vez menos do que faziam antes."

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Francisco dá boleia a Messi


 Na quarta-feira, o Papa deu "boleia" a um portador de deficiência com a camisola argentina de Messi. Lindo e comovente. E imagino que alguns poderiam não querer que o jovem, ainda por cima assim vestid0, se aproximasse de Francisco. Mas Francisco tornou-se próximo dele.



Funeral católico recusado a homossexual

Notícia do "Correio da Manhã" de hoje.

Desvio

Antes de ser Cristo, é a verdade.
Se nos desviamos d'Ele para ir para a verdade,
não andaremos um grande troço sem cair nos seus braços.

Simone Weil

quinta-feira, 20 de junho de 2013

100 dias de Papa Francisco

Faz hoje 100 dias que temos o Papa Francisco.

A Ecclesia faz aqui um pequeno balanço. Um Papa próximo.

Também podemos conhecer a perspetiva suíça aqui (obrigado, FCO). Um "Papa dos pobres" que se tornará um decisor determinado.

Pátria

O Evangelho é a minha verdadeira pátria espiritual.

Maurice Blondel

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Jonas e a descida

Inês Fonseca Santos tem um livro de poesia que se chama "A Habitação de Jonas". Não sei se fala da fuga e da descida às profundezas do mar. Mas a autora diz que Jonas quer arrumar o coração para "descer por ele até mais do que uma sílaba:/ até uma palavra". Fala de descidas, portanto.

Aprender com os ateus: Jornada desde a manjedoura

Ao contar a jornada de um homem desde a manjedoura, o cristianismo conta uma história quase universal acerca do destino da inocência e da docilidade num mundo turbulento. A maior parte das pessoas são cordeiros que necessitam de bons pastores e de um rebanho misericordioso.


Alain de Botton, em "Religião para ateus", pág. 223.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Segundo milagre de João Paulo segundo

A comissão teológica da Congregação para a Causa dos Santos atribuiu um segundo milagre ao papa João Paulo II. As fontes citadas pela Ansa (agência italiana), não identificadas, afirmaram que o novo milagre irá "surpreender o mundo". Li no DN.

Vem na Bíblia (1) - Preguiça

O preguiçoso mete a mão no prato, mas cansa-se de a levar à boca.

Provérbios 26,15

Inspirações de João Miguel Tavares: "Mário e o lobo"

Independentemente do que se pense sobre a greve de ontem, registo a inspiração religiosa da crónica de João Miguel Tavares no "Público" de hoje. O realce amarelo fui eu que o fiz.



segunda-feira, 17 de junho de 2013

Bento Domingues: "Um Deus irremediavelmente masculino?

Texto de Bento Domingues no "Público" de ontem.

Um pé na lua e uma pedalada até aos Alpes, sempre por...

Quando Armstrong põe um pé na lua, a religião está ali. Quando Leprince-Ringuet preside aos destinos da física nuclear, ela está ali. Quando Robert Schumann e tantos émulos de hoje constroem uma Europa nova, não fazem mais do que falar d'Ele. Quando tantos e tantos cristãos contribuíram e contribuem para edificar um sindicalismo construtivo e cristão, devemos proclamar: É Jesus quem dá a força à nossa vida.

Eddy Merckx


domingo, 16 de junho de 2013

O que dizia Bento XVI sobre a homossexualidade e o sacerdócio ministerial. Incompatíveis.

Diz Bento XVI:
A homossexualidade não é compatível com o sacerdócio. Se não, o celibato como renúncia também não teria sentido. Seria um grande perigo de o celibato se transformasse numa oportunidade para introduzir no sacerdócio pessoas que não se querem casar, já que, por alguma razão, a sua posição perante o homem ou a mulher está modificada, está alterada, não se encontra em todo o caso orientada no sentido da criação de que falámos.

A Congregação do Ensino adotou há uns anos uma regra segundo a qual não é permitido que candidatos homossexuais sejam ordenados padres, porque a sua orientação sexual os distancia do seu sentido de verdadeira paternidade, da essência do sacerdócio. A seleção dos candidatos ao sacerdócio deve ser muito cuidadosa. Aqui, deve prevalecer a maior atenção, para que um equívoco deste tipo não penetre e, no final, leve identificar o celibato dos padres com a tendência para a homossexualidade.
Da página 148 de “Luz do Mundo”, entrevista de Peter Seewald a Bento XVI, na Lucerna.



Este excerto vem responder às dúvidas de um leitor, nos comentários a "O que é um lóbi gay?".

Devo acrescentar que não concordo com Bento XVI. Ainda que me pareça que, no primeiro parágrafo, ele pensa na homossexualidade concretizada em atos explicitamente homossexuais, no segundo, está implicado que os seminários devem afastar os candidatos homossexuais somente por causa da orientação homossexual em si mesma.

Na realidade, julgo que em nenhum momento se pergunta a um candidato a padre: "És hetero ou homossexual?". Ou pergunta-se?

Bento Domingues: "Um Deus irremediavelmente masculino?"

Consta que, nas “redes sociais”, circulam campanhas para correr com o Papa Francisco. Como João Paulo I não se soube defender das consequências de ter ressuscitado o estilo das atitudes, palavras e gestos de João XXIII, diz-se que o papa Francisco pode sair-se mal com o seu “populismo”, diversamente interpretado.


Início do texto de Bento Domingues no “Público” de hoje.

sábado, 15 de junho de 2013

Anselmo Borges: "O Papa Francisco, um novo João XXIII"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje:

1. Quando naquele dia 28 de Outubro de 1958 Angelo Giuseppe Roncalli foi eleito papa, escolhendo o nome de João XXIII, pensou-se que, atendendo à idade, seria um papa de transição. Rapidamente, porém, os mais atentos se aperceberam de que ele chegara para renovar a Igreja. Concretamente, convocando o Concílio Vaticano II, um dos acontecimentos decisivos na história do século XX - houve quem o considerasse até o acontecimento mais importante do século -, operou uma verdadeira revolução na Igreja Católica, com consequências fundamentais para o mundo inteiro.

Era um homem bom, generoso, simples, cristão. Próximo das pessoas - na noite da abertura do Concílio Vaticano II, em 11 de Outubro de 1962, observou que até à Lua o acontecimento não passara indiferente e saudou a todos, solicitando que fôssemos bons uns para com os outros e pedindo aos pais que levassem um beijo do papa para os filhos -, era ao mesmo tempo um conhecedor do mundo: a carreira diplomática levou-o, em tempos conturbados, à Bulgária, Grécia, Turquia e França.

Na inauguração do Concílio, tinha dito que "devemos discordar dos profetas de desgraças, que anunciam acontecimentos sempre infaustos, como se estivesse iminente o fim do mundo". A Igreja, que quer servir a humanidade com a luz de Cristo e aprender a discernir "os sinais dos tempos", "prefere nos nossos dias usar mais o remédio da misericórdia do que o da severidade: julga satisfazer melhor às necessidades de hoje mostrando a validez da sua doutrina do que condenando erros".

Seis meses depois dessa abertura e quando já se encontrava gravemente doente, publicou, com a data de 11 de Abril de 1963, a encíclica Pacem in Terris, considerada por alguns como a mais importante da história, com imenso eco na opinião pública mundial. Nela, proclama-se a exigência da paz, fundamentada no reconhecimento da dignidade inviolável e dos direitos inalienáveis de todos os seres humanos.

Pelo seu sorriso, bondade, humildade, simpatia, capacidade de renovação a favor da liberdade, verdade e dignidade, ficou conhecido como o "Papa bom". Morreu no dia 3 de Junho de 1963 - neste ano de 2013 celebra-se o cinquentenário da sua morte e da publicação da Pacem in Terris - e foi chorado por todos, crentes e não crentes, políticos e intelectuais de várias ideologias e gente do povo.

2. Quando no passado dia 13 de Março o Papa Francisco apareceu à multidão, simples, quase tímido, inclinando-se e pedindo a bênção e a oração dos fiéis, muitos pensaram que podia vir aí um novo João XXIII. E não têm faltado sinais a confirmar a intuição. Ficou na Casa de Santa Marta, evitando os apartamentos pontifícios; não se esquece dos pobres; anuncia sem cessar o amor, a misericórdia e o perdão de Deus; quer a transparência na Igreja; critica o carreirismo eclesiástico; beija as crianças e os deficientes; recebe sem pompa e senta-se no meio do povo, depois de celebrar a Missa; lavou os pés a mulheres, incluindo uma muçulmana... Pela simplicidade, cordialidade, serviço, Francisco conquistou a simpatia de todos, crentes e não crentes. O Evangelho avança como notícia boa e felicitante.

Mas a Igreja, uma estrutura complexa, também precisa, e urgentemente, de reformas. E Francisco está na disposição de implementá-las, apesar das dificuldades. Os media fizeram-se eco da notícia em todo o mundo. "Reflexión y Liberación", esclareceu entretanto que as declarações atribuídas ao Papa podem não ser completamente textuais, mas exprimem "o seu sentido geral". Numa conversa cordial com a Confederação Latino-americana e Caribenha de Religiosas e Religiosos (CLAR), Francisco disse o que já se sabia, mas agora é dito por ele: "Na Cúria há gente santa, mas também uma corrente de corrupção. Fala-se do lóbi gay, e é verdade: está aí." E advertiu contra certos grupos restauracionistas. "A reforma da Cúria romana é algo que quase todos os cardeais pedimos, nas congregações que precederam o conclave. Eu também a pedi. A reforma não posso fazê-la eu." Mas confia na comissão de oito cardeais de todo o mundo, nomeada por ele: "Vão levá-la por diante."

sexta-feira, 14 de junho de 2013

O que é um lóbi gay?

Confesso alguma perplexidade perante as afirmações do Papa Francisco sobre o "lóbi gay" no Vaticano. Como a coisa surge nas notícias, não temos afirmações diretas do Papa, mas apenas o eco do que ele terá dito a um grupo sul-americano.

Em todo o caso, há muito se fala do "lóbi gay". Será um grupo de influência sobre assuntos da homossexulaidade? Um lóbi é um grupo de pressão de interesses próprios ou a mando de outros. Lóbi gay será, portanto, um grupo para fazer passar assuntos gays, nas leis e nos costumes, tipo casamento homossexual, adoção de crianças por casas gays, etc., etc. (Ressalvo que considero que estes assuntos não devem ser apenas do interesse dos homossexuais, mas de toda a sociedade - mas costumam ser apresentados como quase exclusivos dos gays.) Neste sentido, não creio que haja um "lóbi gay".

Referir-se-á o Papa aos homossexuais na cúria romana? Certamente os haverá. Mas então não se trata de um lóbi. Se se trata de clérigos, que sejam hetero ou homossexuais, é irrelevante, pois têm de respeitar o compromisso do celibato. Ou não é irrelevante? Bento XVI dizia que não. Dizia que apenas os heterossexuais poderiam ser padres, porque, caso contrário, não estaria a ser cumprida a renúncia à paternidade biológica para se assumir a paternidade espiritual. Será que ele pensava que a ordenação de homossexuais é inválida?

Por último, a associação dos gays aos corruptos é, em tudo, injustificada, tipo "expulsar os gays e os corruptos da cúria romana". Qual é o problema, mesmo à luz da mais ortodoxa doutrina católica de se ser gay? Nenhum.

Espero que estas questões sejam esclarecidas em breve.

Abismo

Cristo é um abismo de luz.

Kafka

quinta-feira, 13 de junho de 2013

13 de junho, dia dos dois Antónios


No dia 13 de junho de de 1231 morreu em Pádua o franciscano António, nascido em Lisboa, que antes de ser António era Fernando.

No dia 13 de junho de 1888 nasceu em Lisboa Fernando Pessoa, o poeta, que entre "Fernando" e "Pessoa" tinha o nome "António" (Fernando António Nogueira Pessoa).

13 de junho é, portanto, o dia dos dois Antónios e Fernandos mais célebres de Portugal.

Muros das Lamentações eletrónicos

Entre os anúncios de calças de ganga e de computadores colocados bem alto nas rus das nossas cidades, deveríamos colocar versões eletrónicas de Muros das Lamentações que transmitiriam anonimamente as nossas angústias interiores e nos dariam desse modo uma noção mais clara do que é estar vivo.

Alain de Botton, pág. 189 de "Religião para ateus"

Quem disse isto? "Apostolado de bicicleta por toda a terra"


Quem disse isto?

Se o meu amor a Cristo pode servir para qualquer progresso do amor, estou disposto a fazer apostolado de bicicleta por toda a terra.

a) Eddy Merckx
b) Lance Armstrong
c) Marco Pantani
d) Jorge Bergoglio nos tempos em que preferia o basquete e o ciclismo.

Resposta (selecione): a) Eddy Merckx. Quanto a Jorge Bergoglio, de facto, preferiu o basquete quando era jovem. Mas desconheço qualquer interesse nele pelo ciclismo.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Lóbi gay no Vaticano 2 - Jornal de Notícias

No JN de hoje.

Lóbi gay no Vaticano 1 - Correio da Manhã


No CM de hoje.

D. Clemente na cadeira papal


Notícia da "Sábado" desta semana, que saiu hoje porque amanhã é feriado em Lisboa. O título tem piada, mas está errado. D. Manuel Clemente "só" é patriarca de Lisboa. Cardeal, somente quando o Papa o nomear, em princípio no primeiro consistório após a entrada no novo patriarca em Lisboa, o qual, julgo eu, ainda não está marcado.

Quem disse isto? Deus e a razão

Quem disse isto?

Não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus.

a) um perigoso racionalista
b) Bento XVI
c) Kant
d) Lutero

Resposta (selecione): b) Bento XVI no polémico discurso de Ratisbona, em 2006. Lutero nunca diria tal coisa. Pelo contrário, dizia que a razão é a rameira do diabo...

terça-feira, 11 de junho de 2013

José Diogo Quintela: "Ver no Instagram para crer":

José Diogo Quintela, no seu texto na revista 2 (no "Público" de domingo), "Ver no Instagram para crer":

Antes, se avisasse que ia chegar atrasado por causa de um acidente na auto-estrada, a minha mulher acreditava. Mas agora exige que lhe mande uma fotografia que o prove. (E, com as aplicações que já existem para editar fotografias, chegará o dia em que me vai obrigar a trazer um pedaço do pára-choques acidentado, só para certificar.) Quase dois mil anos depois de Jesus ter admoestado Tomé com o célebre: “Felizes os que creem sem terem visto”, a indústria dos telemóveis dá esta machadada num dos pilares da fé cristã."

Expresso: "Nossa Senhora desceu à Terra"

No "Expresso" de sábado passado.

Encontro

Podem acusá-lo de ser um sonho, aqueles que não o viram. Mas os que o viram, não podem esquecê-lo.

H. Lacordaire

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Do argumento das nódoas da Igreja


Há aquele velho argumento de que conhecendo as sujidades da Igreja temos que admitir que se a Igreja continua é porque é obra divina. Mutatis mutandis, o mesmo se pode dizer de Portugal, neste dia dele e do seu anjo, tendo em conta os sucessivos governos. Quem diria que os países também têm um anjo.

Mas quem usou pela primeira vez o argumento das nódoas? Até os Padres da Igreja o conheciam, visto que alguns deles aplicaram profissões pouco recomendáveis à Mãe Igreja. Mas não sei se alguém o levou tão a sério como Ludwig von Pastor (1854-1928). Escreveu 16 volumes (na edição inglesa, disponível online, são 40, cada um com cerca de 400 a 600 páginas, o que dá cerca de 20 mil páginas) sobre os Papas (título original: “Geschichte der Päpste seit dem Ausgang des Mittelalters”), mas só dos finais da Idade Média até Pio VI, que morreu em 1799.

O que aconteceu a von Pastor? Converteu-se ao catolicismo. E com fervor. Não por causa das glórias dos Papas, mas por causa dos crimes, das infidelidades, dos pecados. Se a Igreja sobrevive apesar de tudo, só pode ter origem divina.

Consta que , no leito de morte, von Pastor pediu: "Digam ao Papa que a última batida do meu coração é para a Igreja e o Papa". Não sei o que pensou ou respondeu Pio XI.

Bento Domingues: "O Sagrado Coração de Jesus mal pintado"

Texto de Bento Domingues no "Público" de ontem.

E a porta

Cristo é a chave do mundo.

Novalis

domingo, 9 de junho de 2013

Igualdade de crenças

Símbolos para ateus.

Sentido da vida?

São Google

Multiplicação da fealdade pelo Sagrado Coração de Jesus, segundo Bento Domingues

Excerto da crónica de Bento Domingues no "Público" de hoje:

Em Lisboa, existe uma igreja paroquial dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, obra dos arquitectos Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas, que recebeu o Prémio Valmor em 1975 e é monumento nacional, desde 2010. Apesar de todas as diligências, o Sagrado Coração de Jesus não conseguiu, na altura, encontrar nenhum grande artista que o quisesse pintar ou esculpir. Fui ao Google verificar se teria havido algum esquecimento. Entre as mais de 400 imagens visitadas não encontrei uma que lá pudesse figurar, sem atentar contra a qualidade daquela arquitectura. Aliás, a reprodução de tais imagens é sempre a multiplicação da fealdade.


Transcendência e condescendência

A transcendência acompanha inseparavelmente a condescendência.

Yves Congar

sábado, 8 de junho de 2013

Abriu a época das transferências

Partindo das frequentes críticas do Papa Francisco ao carreirismo eclesiástico, Sandro Magister escreveu há dias um texto pertinente sobre as transferências de bispos de umas dioceses para as outras. Na realidade, duvido que as críticas franciscanas se dirijam especificamente aos bispos que mudam de diocese, porque, e julgo que não sou ingénuo por pensar assim, tal mudança deve-se mais à vontade do Vaticano do que aos desejos dos próprios.

Vale a pena ler o texto aqui. Em todo o caso, quando tanto se houve falar de transferências (não só para a Diocese do Porto), há citações relevantes que merecem ser meditadas:

- Vincenzo Fagiolo, cardeal, em 1999: “A dignidade do episcopado está no ‘munus’ que comporta, e este por si mesmo prescinde de toda hipótese de promoção e transferência, que deveriam ser, quando não eliminadas, cada vez mais raras. O bispo não é um funcionário, um interino, um burocrata, que se prepara para outros cargos mais influentes”.
- Bernardin Gantin, cardeal, em 1999: “Quando é nomeado, o bispo deve ser um pai e um pastor para o povo de Deus. E pai é para sempre. Do mesmo modo, um bispo, uma vez nomeado numa determinada sede, em linhas gerais e por princípio, deve permanecer nela para sempre. Sejamos claros: o que existe entre o bispo e a diocese é representado como um matrimônio; e um matrimônio, segundo o espírito evangélico, é indissolúvel. O novo bispo não deve ter outros projetos pessoais. Podem existir motivos graves, gravíssimos, por razão dos quais a autoridade pode decidir que o bispo saia, para passar de alguma maneira, de uma família para outra. Fazendo isto, a autoridade tem presente inúmeros fatores e, entre estes, não se encontra, é claro, o possível desejo de um bispo mudar de sede”.
- Joseph Ratzinger, cardeal, em 1999: “Especialmente, na Igreja não deveria existir nenhum sentido de carreirismo. Ser bispo não deve ser considerado uma carreira com diversos escalões, de uma sede para outra, mas, um serviço muito humilde. Penso que também o debate sobre o acesso ao ministério seria mais sereno, caso fosse visto no episcopado um serviço e não uma carreira. Também uma sede humilde, com poucos fiéis, é um serviço importante na Igreja de Deus. É claro, pode haver casos excepcionais: uma sede muito grande para a qual é necessário ter experiência do ministério episcopal; neste caso, pode se dar... Porém, não deveria ser uma práxis normal; somente em casos muito excepcionais”.
- Timothy Radcliffe, frade dominicano, em 2013:  “Pergunto-me também se é um bem para os bispos ser deslocados de uma diocese para outra. Carregam um anel que é um sinal de que estão ‘casados’ com a diocese, mas, muitas vezes, são separados de suas dioceses originais e casados com outras dioceses. Se soubessem, ao contrário, que permaneceriam em suas dioceses, então poderiam prestar-lhe sua completa atenção. É verdadeiramente estranho que seja permitido aos bispos se divorciarem de sua diocese, mas não as pessoas unidas em matrimônio!”

A acrescentar a isto, deveria desaparecer os bispos auxiliares, que são sempre bispos titulares de dioceses defuntas, como Mitilene ou Luperciana. Que ficção. E claro que as dioceses teriam de ser mais pequenas e muitas mais em número.

Anselmo Borges: "O diabo, possessões demoníacas e exorcismos"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje:

O Papa Francisco terá alegadamente realizado um exorcismo num mexicano. O porta-voz do Vaticano apressou-se a desmentir. Mas o célebre exorcista Gabriele Amorth, a caminho dos 90 anos e que diz já ter feito mais de 70 mil exorcismos, não duvida de que "o Papa fez mesmo um exorcismo". Por mim, confesso que estou plenamente convencido de que Francisco não o fez: apenas tentou ajudar aquela pessoa doente, impondo-lhe as mãos e rezando.

Diabo é, etimologicamente, o contrário de símbolo: enquanto diabállo, em grego, significa desunir, enganar, symboléo quer dizer encontrar-se com, reunir. O simbólico une; o diabólico desune.

O diabo é uma figura com muitos nomes, embora o seu sentido não seja exactamente idêntico: satã, demónio, satanás, belzebu, lúcifer, mafarrico, maligno... Aqui, serão usados indistintamente.

Seja como for, o decisivo é que o diabo aparece no contexto do sofrimento, da maldade, enfim, do mal. Como se explica tanto mal e sofrimento no mundo? Uma vez que Deus não pode ser a causa do mal, pois é infinitamente bom, supõe-se que o diabo poderia ser uma boa explicação. Ele tentou e tenta o ser humano, que cai na tentação e provoca o mal. Mas já o filósofo Kant colocou na boca de um catequizando iroquês esta pergunta: Por que é que Deus não acabou com o diabo? E sobretudo: quem é que tentou os anjos, para que, de bons, se transformassem em anjos caídos e maus, demónios?

Para explicar o mal, contrapor o diabo a Deus, como se fosse uma espécie de anti-Deus, no quadro de um dualismo maniqueu, não passa de uma explicação aparente e, sobretudo, é uma contradição.

Se é certo que Jesus, nos Evangelhos, aparece expulsando demónios, isso deve ser compreendido no contexto das crenças da altura. Hoje, sabemos que se tratava de doenças do foro psiquiátrico ou de pessoas com ataques epilépticos ou sofrendo de histeria. De qualquer forma, Jesus anunciou Deus e não satanás, e, felizmente, o diabo não faz parte do Credo cristão. O núcleo da mensagem de Jesus foi o Reino de Deus, e o Reino de Deus consiste na salvação total e plena do ser humano. Neste contexto, o diabo pode aparecer apenas como um símbolo personificado de todo o mal que ainda aflige o homem, mas a que Deus há-de pôr termo, segundo a promessa de Jesus. O diabo é a expressão personificada do que não é o Reino de Deus. Precisamente para realçar mais e melhor o que constitui o centro da mensagem de Jesus enquanto notícia boa e felicitante: o futuro do Reino de Deus.

O diabo não pode, pois, ser apresentado como uma espécie de concorrente de Deus. E não tem sentido continuar a pensar e a pregar que ele se mete nas pessoas, para tomar conta delas através das possessões diabólicas. Não há possessos demoníacos. Apenas há doenças e doentes de muitas espécies e com múltiplas origens e com imenso sofrimento, a que é preciso pôr fim, na medida do possível e, pelo menos, aliviar. Os rituais de exorcismos não têm justificação.

Se Jesus não pregou satanás, mas Deus, então a fé do cristão dirige-se a Deus e não ao diabo, o que inclui na prática a urgência de expulsar da vida pessoal e pública tudo o que é demoníaco e diabólico.

Já em 1969, Herbert Haag, um dos maiores exegetas do século XX, que conheci bem, se despedia da crença na existência pessoal do diabo, na obra Abschied vom Teufel (Adeus ao diabo). H. Bietenhard também escreveu: "A pregação cristã não deve especular sobre a origem e a essência ou o ser de Satanás - a Bíblia também não o faz: as pregações sobre o diabo e sobre o inferno, quando não fomentam a necessidade de emoções de pessoas pseudopiedosas e a excitação dos seus nervos, só servem para difundir a insegurança, a angústia e o medo. Essas pregações, em vez de libertar, colocam fardos aos ombros das pessoas".

Como diz o teólogo José M. Castillo, a Igreja, em vez da preocupação com o número de exorcistas para os demónios inexistentes, deve preocupar-se com os outros demónios, os que na realidade existem, que andam por aí à solta e são responsáveis por imensos sofrimentos de milhões de pessoas.

Hereges

Diz Seth Godin que "a gestão de topo (...) quer hereges capazes de criar mudança antes que a mudança lhes caia em cima".

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Fernando Calado Rodrigues: O "Papa Bom"

No "Correio da Manhã" de hoje.

Sr. Paulo de Tarso

Diz o meu amigo Luís Silva, que leu o livro “S. Francisco de Assis”, de Chesterton, que há lá um certo bispo que se queixa que um não-conformista [basicamente, reformador dentro da Igreja Anglicana nos séculos XVI-XVIII] chama “Paulo” ao Apóstolo em vez de o tratar por  “São Paulo”. E acrescenta o bispo: “Podia ao menos tratá-lo por Sr. Paulo”.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Já toda a gente tinha reparado, mas ainda ninguém lhe tinha dito

O Bispo de Bérgamo, diocese-natal de João XXIII, disse ao Papa Francisco: “Permita-me que faça uma confidência. Para muitos de nós parece que há [em si] uma semelhança nos gestos, na linguagem, na atitude, na paixão evangélica, na abertura para todos com João XXIII”.

Atração

Hoje, quando a fé se apresenta tão difícil e a linguagem sobre Deus parece tão velada, Jesus Cristo mantém um grande poder de atração.

Yves Congar

segunda-feira, 3 de junho de 2013

João XXIII morreu há 50 anos


João XXIII morreu há 50 anos. O historiador António Matos Ferreira fala deste Papa na Ecclesia. Na imagem, quando ele, o Papa, esteve em Fátima. Era então Patriarca de Veneza.

"Falta de provas"

1947. Giulio Andreotti, com uns papéis na mão, tem ao seu lado esquerdo Battista Montini (Paulo VI a partir de 1963)

Quando morreu Giulio Andreotti, no dia 6 de maio deste ano, quis assinalar aqui o acontecimento. Tinha em mente que ele, além de político democrata cristão, foi diretor da revista católica 30Gionri / 30Dias e escreveu alguns artigos de interesse, como este, por exemplo, precisamente sobre a Democracia Cristã.

Foi apenas uma das muitas coisas que não fiz.

Mas hoje, ao ler o mais recente número do “Courrier Internacional”, dou com um breve texto que insinua que esteve ligado a segredos, terrorismo e crimes e relacionado com a Máfia, coisa muito falada em maio passado. Diz o texto – e é por causa dessa nota de humor que escrevo isto: “Quando acusado, defendeu-se respeitando sempre os juízes. «Foi para o céu por falta de provas», comentou um internauta”.

Religiões em autocrítica

domingo, 2 de junho de 2013

Tu, quem és?

Messias, Verbo de Deus, Filho de Deus, Salvador, Rei, Cordeiro de Deus... Por uma vez, queria abafar esta litania, aproximar-se desse Homem, sem prestar atenção a estas etiquetas, que de certo ele não ostentava sobre o seu peito como outras tantas condecorações, queria aproximar-se dele e ver a sua vida. Simplesmente, como vive, anda, sorri, sente. Então, perguntar-lhe-ia: Tu,quem és?

A. M. Bernard

Bento Domingues: "O segredo da alegria de João XXIII (2)"

Bento Domingues no "Público" de hoje:

É próprio do moralismo destilar maldições sobre as mais autênticas alegrias humanas. Instalou-se, há muitos séculos, em certas correntes do cristianismo e reaparece, periodicamente, como se fosse a sua versão mais genuína pelo seu “desprezo do mundo”. É, na verdade, uma importação estranha à poética pregação de Cristo que respira, em cada gesto e em cada parábola, o gosto da plenitude da vida ( Jo 20,30-31).

sábado, 1 de junho de 2013

De Corpus Christi


No "Público" de hoje. Uma ideia que também me tinha ocorrido, mas com mais piada nos desenhos de Luís Afonso.

Anselmo Borges: "Já não há valores"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje:

Já não há valores! Aí está uma afirmação que se ouve constantemente, vinda de ex-presidentes da República, bispos, professores, padres, pais e mães, educadores. De quase toda a gente.

A afirmação, porém, não é verdadeira. Evidentemente, continua a haver valores. Não é possível viver sem valores. Não há sociedade sem valores. O que se passa é que mudou a escala de valores. A hierarquia dos valores, agora, é outra.

Abraham Maslow estabeleceu uma famosa pirâmide: a pirâmide das necessidades humanas. Segundo o psicólogo norte-americano, essas necessidades têm uma hierarquia ascendente, que vai, portanto, da base até aos níveis superiores. As necessidades básicas confundem-se com as necessidades fisiológicas, condição de sobrevivência: respirar, comer, beber, dormir, reproduzir-se. No segundo patamar, encontra-se a necessidade de segurança, que tem a ver com a integridade do corpo, da saúde, a salvaguarda dos bens e da propriedade. As necessidades de pertença estão no terceiro plano e referem-se à necessidade de identidade e de afecto; daí, a importância da amizade, do amor, da vida familiar e grupal. O quarto nível é ocupado pelas necessidades de estima, tanto no que se refere a si mesmo - auto-estima - como confiança nos outros: estimar-se a si e aos outros e ser estimado e respeitado pelos outros. No quinto nível, temos a realização pessoal, com tudo o que isso implica de criatividade, ética, vida interior, sentido e transcendência.

Evidentemente, esta escala é discutida e discutível, pois pode não ser tão universal como pode parecer, não tendo na devida conta a sua determinação histórica e cultural. No entanto, como escreveu Frédéric Lenoir, parece possível "considerar estes cinco tipos de necessidades como sendo todos, e com a mesma dignidade, condições do bem-estar, da felicidade, da realização de si".

A esta escala de necessidades corresponde uma escala de valores. É claro que as necessidades biológicas são as mais urgentes - sem a sua satisfação, não se sobrevive -, mas isso não significa que sejam as mais humanas, já que são partilhadas com os outros animais.
Valor vem de valere - vale, valete era a saudação romana: passa bem!, passai bem! -, que significa ser forte, ter saúde, passar bem, estar de saúde. E está em conexão com perguntas como: quanto custa isto?, quanto vale?, qual o seu preço? No contexto desta conexão, percebe-se que rapidamente venha à ideia a ligação ao dinheiro.

E não é o dinheiro um valor? A questão é saber se é o valor primeiro - é o mais urgente, pois dele depende a salvaguarda da vida -, mas é o mais humano, aquele que determina verdadeiramente a nossa realização humana?

Jesus disse que havia incompatibilidade entre Deus e o Dinheiro: "não podeis servir a dois senhores, a Deus e ao Dinheiro; ou a um ou a outro." É evidente que Jesus não condena o dinheiro enquanto tal, isto é, enquanto meio. Ele próprio teve de servir-se dele, ganhando a sua vida através do trabalho. O que se passa é que a palavra utilizada no Evangelho para dizer este dinheiro é Mamôn, isto é, o Dinheiro divinizado e fim em si mesmo. De facto, não é possível servir o Deus da Vida, que quer a vida de todos, e o Dinheiro enquanto ídolo. Quem faz do dinheiro e da riqueza o objectivo essencial da sua vida de certeza que fará muitas vítimas pelo caminho e impedirá muitos de viver.

Continua a haver valores. Mas a sua hierarquia transtornou-se e o que é meio tornou-se fim. E aí está o culto do bezerro de ouro, o egoísmo feroz, a avareza, a ganância sem limites. Mas são o dinheiro e a riqueza a finalidade última da vida? Os gregos apresentaram sabiamente a famosa lenda do rei Midas: tudo o que tocasse transformar-se-ia em ouro. Ora, quem ele tocou primeiro foi a filha. Depois, quando levava algo à boca para comer, também se transformava em ouro. E viu a sua desgraça trágica.

Precisamos é de repor uma escala decente de valores. Comecemos pela justiça, em ligação com a verdade e a igualdade; junte-se-lhe a liberdade, coroada pelo amor. Afinal, há gente riquíssima que é infeliz e quem viva feliz na sobriedade.

Erros de olhar

Na sociedade, comete-se com frequência o erro que consiste em avaliar o passado com os olhos do presente. Na Igreja, comete-se com elevada f...