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domingo, 12 de novembro de 2017

Lucas 15, a esquerda e a direita

Tem piada o artigo de Inês Teotónio Pereira, "A esquerda que queremos ser", no DN de ontem.

"Somos [os da direita] aquele irmão que ficou em casa a servir o pai mas não tem direito a um banquete em sua honra. Não, o carneiro mais gordo é para ser servido ao delinquente de esquerda que só faz asneiras, que é irresponsável, manipulador, arrogante e que nem sabe pedir desculpa. E nós, que sempre nos portámos bem, que nunca gastámos mais dos que podíamos, que cumprimos as regras todas, que nem uma escutazinha mais atrevida temos para dar ao CM, meu Deus, não recebemos sequer um apertãozinho na bochecha, uma festinha na cabeça, vá".

Ler tudo aqui.

domingo, 15 de dezembro de 2013

Henrique Montreiro: "O Papa Francisco e o 'arrependimento' da esquerda"

Henrique Monteiro, no "Expresso":


A esquerda não costuma gostar de Papas. Não gosta do que é transcendente, não racional, embora adore o lado emocional das manifestações e dos discursos, e tem da Igreja sempre a ideia da Inquisição, como se a Inquisição tivesse acontecido antes de ontem e não tivesse, mesmo no séc. XVI, sido imposta pelo Estado e pelo poder político que a esquerda gosta de contrapor à Igreja.

Sendo laico, embora crente, concordo com a estrita separação de Igreja e de Estado e penso que um e outro devem viver o mais independentemente possível. Congratulo-me por perceber ser esse o pensamento do Patriarca de Lisboa e, de um modo geral, da Igreja moderna. Por isso não entendo a militância anti-religiosa que parece ser apanágio da parte mais ativa da nossa esquerda militante.

João Paulo II que disse umas verdades acerca do Leste europeu quando este era dominado pelo comunismo, foi por eles abominado. Bento XVI que disse umas verdades acerca da natureza da Teologia da Libertação, era odiado ("o pastor alemão") ainda que seja um dos grandes intelectuais europeus. Chegou Jorge Bergoglio (após a resignação de Bento XVI, num exemplo de retiro e abdicação do poder que quase nenhum político teve coragem) e, para não variar, a esquerda inventou uma cumplicidade do antigo Cardeal de Buenos Aires com a ditadura argentina.

A coisa foi desmentida e, finalmente, desmontada. O Papa revelou-se uma pessoa diferente, mais aberta, mais expansiva, mais ousada. E disse duas ou três coisas sobre o dinheiro e o capitalismo que, por acaso, os seus diversos antecessores já tinham também dito; mas parte da esquerda, que nunca olhou para a doutrina, mas apenas para o estilo, passou a endeusá-lo. Não me refiro aos católicos de esquerda, que são uma corrente respeitável da Igreja e que preferem seguramente o seu envolvimento mais próximo dos simples, mas àqueles que sendo "ateus, graças a Deus" a contra as hierarquias religiosas descobriram há apenas um mês:  que a mensagem da Igreja há muito que é contra o "consumismo", a "ditadura dos mercados" e o "lucro desenfreado". Ou seja, que não foi Bergoglio a doutrinar, que o Papa apenas citou o que está nas escrituras e em encíclicas há muito escritas, desde a Rerum Novarum, de Leão XIII, escrita em 1891: "Os trabalhadores, isolados e sem defesa têm-se visto, com o decorrer do tempo, entregues à mercê de senhores desumanos e à cobiça de uma concorrência desenfreada. A usura voraz veio agravar ainda mais o mal. Condenada muitas vezes pelo julgamento da Igreja, não tem deixado de ser praticada sob outra forma por homens ávidos de ganância, e de insaciável ambição" - este texto tem 123 anos.

Mas há mais antigos: "Ninguém pode servir a dois senhores; ou não gostará de um deles e gostará do outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro" (Mt 6:24) - assim resumia São Mateus o pensamento de Cristo. " A raiz de todos os males é a ganância do dinheiro" (primeira carta a Timóteo, de São Paulo).

Não há dúvida que a doutrina é antiga. Pelo que o súbito amor da esquerda pelo Papa tem o sabor de uma conversão: não do Papa, como pretende a esquerda, mas da própria esquerda. E como também está escrito (São Lucas), "haverá mais alegria no céu por um pecador que se arrepende do que por 99 justos".


Haja fé!

sábado, 14 de dezembro de 2013

Anselmo Borges; "Francisco: a alegria do Evangelho (2)"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje.

O Papa Francisco é hoje, senão a figura mundial mais popular, uma das mais populares e influentes. Como escrevi aqui na semana passada, a sua recente exortação apostólica "A alegria do Evangelho", em que traça os caminhos fundamentais do seu pontificado, foi objecto de imenso interesse e análise por parte dos media mundiais de referência. E fizeram-no sobretudo na parte dedicada à situação económico-financeira e social do nosso mundo.


A causa de Deus é a causa do ser humano, de todo o ser humano, feliz e pleno, começando, evidentemente, pelos mais pobres e marginalizados, os das periferias. Essa tem de ser também a causa da Igreja. Por isso, escreve: para quem quer seguir o Evangelho "há um sinal que nunca deve faltar: a opção pelos últimos, por aqueles que a sociedade descarta e deita fora". "Estamos chamados a descobrir Cristo neles, a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas." Por isso, "hoje devemos dizer "não a uma economia da exclusão e da desigualdade social". Esta economia mata. Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem-abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos na Bolsa. Isto é exclusão. Hoje tudo entra no jogo da competitividade e da lei do mais forte, em que o poderoso engole o mais fraco", e a consequência é que "grandes massas da população vêem-se excluídas e marginalizadas" e "os excluídos não são "explorados", mas resíduos, "sobras"".

Denuncia a nova tirania de um capitalismo desregulado e desenfreado. Há quem pressupõe que "todo o crescimento económico, favorecido pelo livre mercado, consegue por si mesmo produzir maior equidade e inclusão social. Esta opinião, que nunca foi confirmada pelos factos, exprime uma confiança vaga e ingénua na bondade daqueles que detêm o poder económico e nos mecanismo sacralizados do sistema económico reinante. Entretanto, os excluídos continuam a esperar", pois o ideal egoísta desenvolveu "uma globalização da indiferença."

Este desequilíbrio "provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controlo dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras." Neste sistema devorador para aumentar os lucros, quem ou o que é frágil, como o meio ambiente, fica indefeso perante "os interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta".

Está aí uma cultura do bem-estar que reduz o ser humano a consumidor e que nos anestesia, a ponto de perdermos a serenidade, se o mercado nos oferece algo que ainda não possuímos. Uma das causas desta situação é a idolatria do dinheiro. "A crise financeira que atravessamos faz-nos esquecer que, na sua origem, há uma crise antropológica profunda: a negação da primazia do ser humano". Criámos novos ídolos: o bezerro de ouro é na sua nova versão "o fetichismo do dinheiro e a ditadura de uma economia sem rosto e sem um objectivo verdadeiramente humano". Ora, "o dinheiro deve servir e não governar". Como escreveu São João Crisóstomo, "não fazer os pobres participar dos seus próprios bens é roubá-los e tirar-lhes a vida. Não são nossos, mas deles, os bens que aferrolhamos".

Para uma sociedade mais humana, é essencial a ética, uma "ética não ideologizada". E previne: "Enquanto não se eliminar a exclusão e a desigualdade dentro da sociedade e entre os povos será impossível erradicar a violência. Sem igualdade de oportunidades, as várias formas de agressão e de guerra encontrarão um terreno fértil que, mais cedo ou mais tarde, há-de provocar a explosão."

Francisco: um perigoso esquerdista? Enquanto uma certa esquerda faz aproveitamento político-partidário, a ultradireita, como o Tea Party, acusa-o de marxismo. Mas ele apenas anuncia o Evangelho, cujo único interesse é a vida plena para todos. "Não podemos mais confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado." Assim, pede a Deus que "nos conceda mais políticos que tenham verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres."

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Alberto Gonçalves, a economia, a esquerda e Francisco

Alberto Gonçalves escreveu no DN de ontem:

O reino dos céus
Perante as críticas do Papa Francisco ao capitalismo e aos "mercados", as pessoas que gostam do Vaticano recordam que isso não é mais do que a costumeira doutrina social da Igreja. As pessoas que abominam o Vaticano acham que a retórica é novidade e não só vai arrasar o capitalismo e os "mercados" como, se a coisa correr pelo melhor, arrasará a Igreja. Eu, neutro na matéria, prefiro notar que, apesar do aparente embaraço de uns e do evidente entusiasmo dos outros, o próprio Papa talvez fizesse melhor em começar por comentar o desemprego, a pobreza e a fome nos felizardos países sem inclinações capitalistas e nos quais os mercados se limitam aos lugares onde o povo compra, quando consegue comprar, hortaliças e galinhas. Se a devoção materialista tem muitos defeitos, uma virtude ninguém lhe nega: não se confunde com nenhuma das maravilhosas alternativas disponíveis.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Como ficar calado?


Como sou são sei o quê de uma certa intelectualidade das esquerdas, partidário do PCI frente à DC, a todos lhes parece mal que eu tenha dado o meu ponto de vista sobre a figura de Jesus de Nazaré.

Pier Paolo Pasolini

sábado, 1 de junho de 2013

sábado, 29 de dezembro de 2012

A edição dos 148 anos do DN foi toda escrita com a mão esquerda?



O DN faz hoje 148 anos. Parabéns. É um jornal que leio quase todos os dias em papel e cuja página na Internet consulto várias vezes ao dia. E nunca esquecerei a alegria de ter visitado a redação deste jornal tendo por cicerone Acácio Barradas, grande jornalista que morreu no dia 28 de outubro de 2008. Nem as tardes maravilhosas que passei nos arquivos deste jornal a ler as edições à volta de morte de João XXIII (que andava eu lá a investigar? – disso não me lembro).

Mas hoje, apesar de a edição ser maior, em número de páginas e formato (“berliner”), sinto-me defraudado. Esperava o suplemento “Q” e nada. Esperava o texto de Anselmo Borges e nada.

A edição comemorativa é dirigida por Manuel Carvalho da Silva e, como opinadores, surgem, entre outros, Mário Soares, Boaventura de Sousa Santos e Carlos Carvalhas. Opiniões que não vou ler, porque já sei não saem da cartilha. Também lá está a opinião de D. Manuel Clemente. E essa vou ler e copiar para este blogue porque considero que o bispo do Porto lança pontes, enquanto os três opinadores atrás referidos dinamitam-nas. É a minha visão das coisas, com certeza.

O jornal tem algumas peças interessantes, como uma reportagem sobre o Estado social na China (hei de ler), e outras de interesse nulo (hei de evitar), como um debate com Arménio Carlos (CGTP), João Proença (UGT) e Manuel Carvalho da Silva (ex-CGTP). Deve ser algo como um debate entre Mr. Dupond, Mr. Dupont e, sei lá, Mr. Duponth. Só que uns estão mais à esquerda do que outros.

E como se faltasse esquerda no jornal, ainda entrevistam Lula e publicam opiniões de Tarso Genro (PT - Brasil) e José Antonio Griñan (PSOE - Espanha) entre outros. Se escrevessem “Pravda” em gótico no topo da primeira página, ficava a condizer.

Para contrabalançar, talvez em 2013 convidem João César das Neves para diretor por um dia.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Quando a esmola é de menos, até o santo se chateia


Na "2" de hoje ("Público"). Muito me ri com esta crónica e a nova exegese de Mt 6,3. Este é o humorista português que mais conhece da Bíblia. Provam-no alguns textos aqui postados.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Os "pingos amargos" do sr. Pingo Doce



Bento Domingues referiu há dias (ver aqui e comentários), na sua crónica, a entrevista que Alexandre Soares dos Santos deu a Anabela Mota Ribeiro (revista “2” do “Público” de 2 de setembro). Aqui ficam os “pingos amargos” do acionista principal da Jerónimo Martins.

(…) Sou católico, crente, praticante, e gostava, se na realidade houver alguma coisa para lá, de encontrar o meu pai (…). 
Tem na sala uma fotografia com o Papa João Paulo II. Foi importante para si o encontro com ele? O que é que representou? 
Foi importante conhecê-lo, mas o Papa que conheci era um Papa com muita idade. Era uma reunião privada, organizada por um padre muito nosso amigo. Eu tinha esperado uma hipótese de… falar. 
Sobre o quê? 
Por que é que a Igreja é tão lenta a reformar-se? São coisas que discuto como bispo D. Manuel Clemente. Por que é que não se devem admitir mulheres padres? Por que é que não se há-de admitir o casamento? Por que é que a Cúria Romana é constituída por uns tipos que têm 80 anos, que não sabem nada de nada da vida, que estão ali fechados? (…) 
A conversa com o Papa seria para discutir a sociedade. Não seria para falar dos seus problemas íntimos. Tudo está direccionado para o domínio social. 
Filha, quando se chega à minha idade, sei exactamente para onde vou. (...)
Tanto diz coisas que politicamente consideraríamos à esquerda como outras à direita. 
Mas isto não é um problema de esquerda ou de direita. Eu não sou de esquerda nem de direita. O António Barreto diz-me que sou um conservador liberal. Sou é cristão. Não digo que sou católico. Sou cristão. Como tal, tenho um conjunto de valores e princípios que tenho de respeitar (...).

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Quatro teses e uma leitura sociológica do Vaticano II


O leitor João (Fernando) Duque, que não é o teólogo de Braga nem o economista de Lisboa, deixou um extenso comentário no último texto de Anselmo Borges, que, com a devida autorização, reproduzo aqui.


O tema do Concilio Vaticano II dá muito “pano para mangas”, como se costuma dizer, e muito mais neste ano de 2012, em que se comemoram os 50 anos do início desse magno acontecimento (eclesial e civilizacional).

É provável que ao longo deste ano saiam vários livros sobre o tema, algumas memórias de bispos que nele participaram (embora o contributo dos portugueses tenha sido insignificante, o que todos os historiadores dizem).

Na Comunicação Social, receio bem que os jornalistas afinem todos pelo mesmo diapasão e que venham glosar até à exaustão o mote do “Concílio-oportunidade-perdida-para-a-renovação-da-reacionária-Igreja-Católica-concílio-esse-cujas-premissas-foram-traídas-nos-anos-subsequentes-pelos-Papas-e-pelo-aparelho eclesiástico”).

Basicamente, julgo que há quatro teses interpretativas sobre o Concílio Vaticano II, e começo por apresentá-las, da Esquerda para à Direita (usando uma linguagem política, que também pode ser eclesial... embora se trate de uma simplificação algo abusiva):

1) Tese dos Progressistas radicais (os que ainda estão - mais ou menos - dentro da Igreja): “O Concílio foi apenas uma mudança cosmética e superficial numa Igreja irreformável, autoritária, patriarcal, e misógina; deveria ter ido muito mais longe (abolição do celibato sacerdotal, ordenação de mulheres, reconhecimento dos anticoncetivos, do divórcio, regime parlamentar na Igreja, - e toda uma agenda progressista radical tipo BE, muito anos 60-70) - mas não foi, e daí o seu fracasso”.

2) Tese dos Progressistas moderados: “O espírito do Concílio foi travado pela reação neoconservadora de João Paulo II e da Cúria romana e de movimentos conservadores (Opus Dei, Comunhão e Libertação, etc.), mas virá um dia um novo João XXIII e será retomado”; “Estamos a atravessar um Inverno, um parêntesis, mas virá uma nova Primavera da Igreja”.

3) Tese dos Conservadores moderados (Bento XVI, e também linha atual da Igreja, pelo menos desde 1978): “O Concílio foi bom e inspirado pelo Espírito Santo, mas os progressistas e modernistas deturparam o sentido dos documentos conciliares e daí a crise pós- conciliar. É preciso ler o Concílio à luz da tradição da Igreja, que começou há dois mil anos com Jesus Cristo e não em 1962. Na Igreja há espaço para reformas, mas nunca para revoluções (cortes abruptos com o passado)”; “Temos que descobrir o verdadeiro Concílio Vaticano II e não a caricatura que os progressistas radicais dos anos 60-70 quiseram veicular e que foi a verdadeira causa da crise”.

4) Tese dos Conservadores radicais (Integristas de Mons. Lefebvre e similares): “O Concílio foi a vitoria dos hereges “modernistas” sobre a verdadeira Tradição católica, apoiados por dois Papas de ortodoxia duvidosa (João XXIII e Paulo VI) e o resultado foi uma enorme crise da Fé católica, da Moral, de vocações, que infetou a Igreja até aos dias de hoje”; “Só um milagre é que salvará a Igreja da sua decomposição às mãos dos modernistas/progressistas”; “Bento XVI é apenas um gestor moderado e não um verdadeiro restaurador da Tradição”.

Haveria também uma quinta tese, mais e laica e “sociológica”, que se poderia formular mais ou menos da seguinte maneira:

1. Nos anos 60 produziu-se, no mundo ocidental, uma revolução cultural e de mentalidades, que se caracterizou pela contestação geral de qualquer tipo de Autoridade (do Estado, da família, no Exército, na Universidade, na Igreja); à separação definitiva do sexo e da reprodução (invenção e comercialização da pílula); à entrada maciça e definitiva das mulheres (de todos os estratos sociais) no mercado de trabalho e à sua autonomia sexual e financeira; por um ideal simultaneamente Individualista e Coletivista (movimentos sociais, como os Hippies, etc.), pelo trunfo de uma Contra-Cultura baseada na exaltação do momento, do instante, do prazer momentâneo (música, sexo casual, droga, “happenings”); pela ascensão de uma sociedade de abundância, depois da penúria do Pós-guerra (apogeu dos “Trinta Gloriosos”, de Jean Fourastié, antes da crise petrolífera de 1973); pela consolidação das classes médias neste capitalismo “civilizado” e social-democratizado, governado alternadamente pelos Socialistas e pelos Conservadores democratas-cristãos.

2. Esta revolução usou ainda uma linguagem marxista, dado o “zeitgeist” dominante na Europa Ocidental do Pós-Guerra, em que um marxismo difuso dominava as ciências humanas, e até o jornalismo: mas na sua essência, era libertária-individualista.

3. Nos anos 70-80, quando o Marxismo perde a aura que o envolvia há décadas como horizonte utópico da Historia humana (graças às revelações de Soljenitsine sobre o Gulag soviético, o genoidio do Cambodja, a revelação das atrocidades do Maoismo depois da morte de Mao em 1976, os “Nouveaux Philosophes” parisienses que desmarxizaram a intelectualidade francesa e europeia), o que ficou de todo este vasto movimento foi a ideia de uma autonomia do indíviduo em todas as esferas; assim, da comuna “hippie” ou da célula maoísta ou trotskista dos anos 60 para o escritório “chic” dos arrogantes e sôfregos “yuppies” neoliberais dos anos 80, há mutação mas não rutura;

4. Uma instituição conservadora, como é a Igreja Católica tentou uma conjunto de reformas e adaptações ao mundo contemporâneo num período de grande turbolência , como foram os anos 60; ora era impossível não ser envolvida pelos “ventos “ que então sopravam; a isto há ainda a acrescentar a celebre frase de Tocqueville que o pior momento para um sistema “autoritário” (sem sentido pejorativo, referia-se à Monarquia de Luís XVI) é quando decide enveredar pelo caminho das reformas;

5. Os ventos desta “revolução cultural” (muito mais profunda que a chinesa de Mao Tse Tung, embora com muitíssimos menos mortos...) entraram na Igreja católica através das janelas abertas pelo Concílio, Igreja católica essa que era “quase” um vaso hermético desde pelo menos, o pontificado ultramontano de Pio IX (meados do século XIX), e o resultado foi não tanto a renovação ou um novo impulso (como desejavam o “bom Papa João” e numerosos católicos de boa vontade…) mas sim a confusão, o caos instalado, as crises de consciência de numerosos padres e fieis, a quebra das vocações religiosas, a sedução pelas ideologias revolucionárias por parte do “Progressismo católico” (mais de um século depois dos socialismos utópicos de 1830-1848 que ainda sonhavam com a síntese Cristianismo/Socialismo), a contestação da autoridade do Papa (o celebre episódio da encíclica “Humanae Vitae”, de 1968, contestada em todo o mundo, até por alguns bispos e teólogos), o desânimo e desagregação de numerosos movimentos eclesiais, o decréscimo do número de praticantes, o esvaziar dos seminários e toda uma decadência/crise eclesial que persiste, com muito mal-estar interno , mesmo após os movimentos “retificativos” de João Paulo II e Bento XVI.

6. O movimento de secularização, iniciado em meados do século XVIII, prosseguiu ao longo dos últimos dois séculos, com fases alternadas de avanço rápido e de “slow motion”; nos anos 60-70, toda esta revolução cultural produziu uma aceleração acentuada deste processo, que reduziu a Igreja Católica, nos países europeus (o resto do Mundo: América Latina, África, Ásia é um caso a analisar à parte) a uma sombra do que foi. Ainda assim, resistiu melhor que as Igrejas anglicanas (Grã-Bretanha) e luteranas (países escandinavos), muito mais permeáveis ao “ar do tempo”, mas que curiosamente (ou talvez mesmo por causa disso), conheceram um declínio muito mais acentuado.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Leiamos os ateus que lêem muito


“Vamos continuar a lê-lo por muitos anos. Para, como ele gostava, concordar e discordar”, escreve José Manuel Fernandes no “P2” de hoje, sobre Christopher Hitchens, que morreu no dia 15 de Dezembro nos EUA.

Hitchens era um homem de excessos, tanto na saúde (“bebo diariamente o suficiente para matar ou inutilizar uma mula”) como na escrita e na ideologia. “Move-se exclusivamente em função daquilo em que acredita em cada momento, sem olhar a conveniências, sem preocupações de grupo, sem olhar a inimizades”. Tanto desagradava a esquerda quando escrevia que o “feto era um ser vivo desde o momento da concepção”, diz JMF (eu escolheria outras palavras, mas percebe-se a ideia), como enervava a direita quando criticava o sionismo e apostolava pelo ateísmo.

Escreveu um livro contra a Madre Teresa de Calcutá, “A Posição do Missionário”, porque dizia que ela defendia a pobreza e não os pobres. O livro esteve para chamar-se “Vaca Sagrada”.

JMF diz que Hitchens, pela “sinceridade desconcertante”, pela “frontalidade tonitruante”, “merece fazer parte do panteão sagrado dos grandes intelectuais públicos”.

Não me parece. Daqui a três ou quatro anos, Hitchens parecerá do século passado. Mas como leitor de “deus não é Grande” (é assim que é o título da obra publicada na Dom Quixote), confesso que aprendi alguma coisa – factos e cultura geral. Mas muitos factos podem não fazer uma razão. Um exemplo: diz Hitchens, e não é mau que qualquer católico o saiba, para ir mais fundo, que Tertuliano (não um padre da Igreja, como diz, porque morreu fora da ortodoxia, mas, mesmo assim, teólogo considerado pela Igreja), descrevendo o paraíso, diz que “um dos prazeres mais intensos da vida depois da morte seria a contemplação eterna das torturas dos condenados” (pág. 75). Aprende-se sempre com os ateus que lêem muito.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Komrade Papa


Veio na "Sábado". Queria saber o contexto em que disse tal frase e procurei em elmundo.es, mas não encontrei a declaração.


Encontrei, por outro lado, uma entrevista de perguntas feitas pelos leitores, nos "encuentros digitales". Pergunta um leitor: La Iglesia Católica ha censurado su película, ¿qué censuraría usted de ella? Moretti responde: De la Iglesia católica puedo censurar muchas cosas. Pero no me parece que haya censurado mi película. Lido aqui.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Na hora das eleições, católicos e não católicos comportam-se da mesma forma. É de lamentar.

Católicos ou não católicos, os portugueses têm os mesmos comportamentos eleitorais. Não é ir ou não ir à missa que faz a diferença – pode-se concluir da entrevista ao sociólogo Mário Bacalhau. Os resultados deste inquérito devem ser interpretados pela Igreja. Como é que a fé católica pode não influenciar as opções políticas? Se não influência isso, é provável que não influencie nada. A entrevista vem na "Visão" desta quinta, 28 de Abril de 2011.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Entrevista ao bispo Jacques Gaillot


Há dias referi o bispo Jacques Gaillot, destituído da sua diocese de Evreux e dedicado à diocese virtual de Partenia (aqui). Pois no dia 20 de Janeiro de 2011, o portal esquerdista brasileiro “Carta Maior” fez-lhe uma entrevista. Fica-se a saber que processo político-eclesial da destituição foi e continua a ser obscuro. Por outro lado, o bispo mantém uma voz profética, necessariamente incómoda, quando diz:
A situação atual é perversa e destruidora tanto para os indivíduos como para a Igreja. O Vaticano é a última monarquia absoluta da Europa. A Igreja deve aceitar a democracia em todos os níveis. E deve mudar de modelo porque o atual não é evangélico.
E aponta algumas situações:
A Igreja deve mudar, modernizar-se, reconhecer que os casais têm direito a se divorciar e a usar a camisinha, que as mulheres podem abortar, que homens e mulheres podem ser homossexuais e se casar, que as mulheres podem chegar ao sacerdócio e ter acesso às esferas de decisão. Deve-se revisar a disciplina do celibato para que os sacerdotes possam amar como qualquer outro ser humano, sem ter que viver relações clandestinas, como delinquentes.
Ora, na questão do aborto, não vejo como é que a Igreja pode “modernizar-se”. Pode mudar alguma prática pastoral, mas não pode mudar o princípio da defesa da vida humana desde o princípio até ao fim.

Por outro lado, realça o dever e valor da justiça.
Eu julgo uma sociedade em função do que ela faz pelos mais desfavorecidos. E é claro que eu só posso fazer um juízo severo, porque na França não se respeita a todos os seres humanos. Para mim o problema número um é a injustiça que reina por toda parte. Os que estão no poder não investem nos pobres. Temos um governo que só favorece os ricos. Por isso temos três milhões de pobres.
(…)
Como disse o escritor Victor Hugo: “Fazemos caridade quando não conseguimos impor a justiça”. Porque não é de caridade que necessitamos. A justiça vai às causas; a caridade, aos efeitos. Eu não estou dizendo que não se deve ajudar com um prato de sopa ou um abrigo a quem está nas ruas. Existem urgências. Eu faço isso, mas minha consciência não fica tranquila, porque penso que devemos lutar contra as causas estruturais que prendem essas pessoas na injustiça. O mais triste é que as pessoas vão se acostumando com a injustiça. E eu digo: Despertem! Tenham vergonha! Vamos nos indignar contra a injustiça!
Mas parece sacrificar o da democracia, quando opta incondicionalmente pelos palestianianos em detrimento de Israel (“Estado colonialista”, diz) e diz o que diz de Cuba.
Cuba. Este é um país que tem futuro. Eu pude constatar que é um povo digno, corajoso e solidário. Em Cuba pode haver pobreza, mas não existe a miséria que se vê em qualquer país da América Latina, ou na França, ou nos Estados Unidos. Apesar do bloqueio imposto pelos EUA, todos têm saúde e educação gratuita, e ninguém dorme nas ruas. É incrível!
Dá a sensação que a ideologia de Esquerda lhe deturpa o olhar. É mesmo preciso sacralizar a Esquerda radical para defender a justiça e os pobres? Para desejar mudanças eclesiais? Ler a entrevista toda aqui.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Ala católica quer PR de Direita

Do artigo de opinião do “Público” de hoje (25 de Agosto) há um facto notável a assinalar: a existência de uma “ala católica” em Portugal e a sua putativa relação com a Direita. Na minha opinião, não só não existe a tal ala católica (o que não exclui que Portugal seja um país sociologicamente católico), como identificá-a com a Direita é claramente abusivo.

Mas seria muito interessante que existisse, de facto, uma “ala católica”, de Direita ou de Esquerda, que se fizesse ouvir tanto nas questões de moral sexual e familiar como social, que justificasse uma boa revista católica ou um jornal em Portugal, que formasse uma associação empresarial forte e também sindicatos, que justificasse um partido político, escolas católicas pautadas pelo pensamento eclesial, etc. Claro que também há a visão contrária, a de que os católicos devem estar em todos esses âmbitos, a do “pessoas católicas sim, instituições católicas não”. Mas, assinale-se: há uma ala católica. De Direita. Pelo menos para a imprensa.

sábado, 8 de maio de 2010

Jesus: de direita ou de esquerda? - Pergunta Anselmo Borges

“A pergunta decisiva não é então se Jesus é de direita ou de esquerda, mas quantos católicos tentam ser cristãos”. Anselmo Borges no DN de hoje (08-05-2010).

Determinamos o espaço a partir da nossa posição corporal: lá em cima, lá em baixo, atrás, à frente, à esquerda, à direita.

Porque a maior parte das pessoas tem mais maleabilidade e força na mão direita, a parte direita ficou privilegiada. Deve-se entrar com o pé direito, dá-se a direita à pessoa mais importante, Cristo está sentado à direita de Deus... Justo deve ser o Direito. Antes dos avanços da neurologia, a situação dos esquerdinos não foi feliz. De alguém radicalmente maléfico, diz--se que é uma pessoa sinistra (do latim: mão esquerda). As seguradoras devem tratar dos sinistros.

Em termos escandalosamente genéricos, diria que, em política, a direita andava ligada aos valores ditos tradicionais, como a família, por exemplo, à ordem e ao capitalismo e a esquerda, a valores que se diziam de esquerda, como mais justiça, por exemplo, à revolução e ao socialismo. Hoje, quando impera a lógica aparentemente triunfante do capitalismo neoliberal e do pensamento único e se julga que a história chegou ao fim, sem lugar para mais revoluções, as fronteiras estão muito esbatidas.

E Jesus?

Logo à partida, dão que pensar as razões que o levaram à morte. Morreu como blasfemo, condenado pela classe sacerdotal, e como socialmente perigoso. Foram os interesses de Jerusalém e de Roma em coligação que o crucificaram.

Era um judeu piedoso, mandou rezar e rezava intensamente, em meditação, a Deus seu Pai, mas escalpelizou de modo virulento a beatice hipócrita. "Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, sepulcros caiados", etc.

No Reino de Deus, centro da sua mensagem, estavam todos incluídos, mesmo aqueles que a sociedade e a religião excluíam, o que constituiu o mais fundo escândalo. Foi a uma samaritana, mulher, estrangeira, herética, a caminho do sexto marido, que se revelou como Messias, e vários episódios mostram como as mulheres, ao contrário da doutrina oficial, também tinham lugar privilegiado como discípulas. Contra o mau exemplo do sacerdote e do levita, foi também um samaritano que, na parábola, foi próximo do desgraçado que, depois de espancado pelos salteadores, tinha ficado semimorto no caminho.

Por causa da sua abertura ao novo, as crianças, que então não tinham significado social, foram apresentadas como modelo da entrada no Reino de Deus. E ai de quem as escandalizasse: "Mais valia atá-lo à mó de um moinho e lançá-lo ao mar". Logo ao nascer, o primeiro anúncio foi para os mais pobres entre os pobres: os pastores. E veio para Israel e para todos os outros: tal é o sentido da história dos reis magos. A quem se escandalizava por comer com os pecadores públicos lembrou o dito do profeta: "Ide aprender: eu não quero sacrifícios, mas misericórdia".

Mas, neste novo Reino, não vale tudo. Sobre Zaqueu, um desses pecadores, não se diz que tenha mudado de profissão, mas arrependeu-se e disse: "Senhor, vou dar metade dos meus bens aos pobres e a quem roubei vou restituir quatro vezes mais". Declarou mal-aventurados os ricos sem ponta de misericórdia. Lá está a parábola do rico avarento e do pobre Lázaro, que nem às migalhas da mesa tinha direito. O Reino é-o da graça, da misericórdia, mas não pertence ao facilitismo. O perdão requer arrependimento: "Vai em paz, não voltes a pecar", dizia ao pecador/a, e é preciso estar vigilante e pôr os talentos a render.

No fim, o que estará em julgamento é a justiça e o amor: "Destes-me de comer, de beber, de vestir, fostes visitar-me à cadeia e ao hospital." "Sempre que o fizestes a um qualquer foi a mim que o fizestes".

O que é mais: para tratar de seres humanos em dificuldade, transgrediu a lei sagrada do Sábado. "O Sábado é para o homem, não o homem para o Sábado." Afinal, toda a lei, mesmo a lei de Deus, fica subordinada ao bem do homem. No limite, agora, só o homem e a sua dignidade são sagrados.

Neste enquadramento, a pergunta decisiva não é então se Jesus é de direita ou de esquerda, mas quantos católicos tentam ser cristãos.

(Fim)

Nota: Em Dezembro de 2009, a revista "Visão" perguntou a várias pessoas se Jesus é de direita ou de esquerda. Ver resumo aqui.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Jesus é de esquerda ou de direita?

A revista “Visão” colocou a questão a vários católicos na penúltima edição (n.º 877; 24 a 30 de Dezembro de 2009). Quando reparei na revista, que obviamente me atraiu pela capa, já que não sou leitor habitual da publicação, estava prestes chegar outra edição às bancas. E qual é a resposta à pergunta? Todos os que responderam fizeram-no como católicos e disseram mais ou menos o seguinte, em resumo.

Jaime Nogueira Pinto, de direita, recusa-se a enfeudar Jesus Cristo a uma área ideológica.

José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda, diz que de direita não podia ser, porque se pôs ao lado da transformação.

Joaquim Carreira das Neves, franciscano, teólogo, diz que “se vivesse hoje, Jesus era de esquerda, porque andava com os desclassificados e com os marginalizados”.

João César das Neves, economista, de direita, recusa-se a encaixar ideologicamente a doutrina cristã.

Maria José Nogueira Pinto, de direita, só diz que a discussão sobre o casamento dos homossexuais nada tem a ver com o casamento religioso e com os ensinamentos de Jesus.

Maria do Rosário Carneiro, deputada independente pelo PS, diz que a luta de Jesus pela igualdade põe-no do lado da esquerda.

Ana Vicente, escritora, diz que Jesus estaria à esquerda, por ser pelos excluídos e pela posição sobre o dinheiro nas parábolas.


Conclusão, dos sete interpelados, quatro dizem que era (ou seria hoje) de esquerda, dois dizem que é incatalogável e um não diz nada. Pelo que dá mais ou menos isto: Jesus era de esquerda ou direita? Esquerda – 4; Direita – 0. Abstenções 3. O resultado é curioso a vários títulos. Primeiro, vitória esmagadora da esquerda. Segundo, os de esquerda não têm dúvidas em dizer que era de esquerda (ressalva para o facto de eu não saber qual é a tendência ideológica do P.e Carreira das Neves). Os da direita política (Jaime e Maria José Nogueira Pinto e João César das Neves) não querem conotar Jesus com qualquer área política.

Parece-me, aliás, que este não eufeudamento ideológico de Jesus é a opção mais correcta. Ou seja, a direita, quanto a mim, compreende melhor Jesus. Porque, se na realidade Jesus tem um discurso contra os ricos, é mais contra a riqueza que oprime o pobre – o que não é bem a mesma coisa que dizer simplesmente que “era contra os ricos”. Nicodemos, um amigo, era rico. Zaqueu, feito amigo, era rico e passou a ser generoso. E a parábola dos talentos parece capitalista. Mas não se tome a parte pelo todo.

Diz Manuel Pureza que Jesus não podia condenar a mulher que abortava. E penso que tem razão. Mas não me parece que Jesus não tivesse respeito pela vida intra-uterina. Foi dos aspectos que distinguiram os cristãos, logo nos primeiros séculos, em relação aos pagãos. E Jesus disse também que nem sequer um yod (a mais pequena letra hebraica) mudava à Lei – o que faria dele um conservador, a julgar pelos critérios da “Visão”, ele que também dizia que “no princípio não era assim”, falando do divórcio que a Lei de Moisés aceitava (e que o cristianismo nascente também aceitou durante séculos).

Há quatro evangelhos e todos eles são ideologicamente diferentes. Teologicamente diferentes. Talvez o Jesus dos sinópticos seja em geral mais de esquerda, para o de João ser mais de direita – pelos critérios da revista. O primeiro parte de baixo para chegar ao alto. Tem uma cristologia ascendente. O segundo vem do alto para chegar à humanidade. “No princípio era o Verbo”, escreve João.

Jesus não nos chega por um livro, mas por quatro, o que logo à partida impossibilita arrumá-lo numa única categoria. Esta pluralidade à nascença é um grande trunfo do cristianismo. Mas mesmo que Jesus fosse marcadamente de alguma dessas correntes ideológicas, não nos evitaria a pergunta: o que devo ser eu, hoje, aqui, para melhor encarnar o espírito evangélico? E, mais uma vez, não haveria uma resposta unívoca.

Sinodalidade e sinonulidade

Tenho andado a ler o que saiu no sínodo e suas consequências nacionais, diocesanas e paroquiais. Ia para escrever que tudo se resume à imple...