Texto de Tolentino Mendonça, na Agência Ecclesia.
O teólogo Karl Rahner escreveu que “A Igreja tem sido
conduzida pelo Senhor da história para uma nova época”. Não se trata só de
baixas drásticas nos indicadores estatísticos quando se compara a atualidade
com aquele que já foi o quadro da vivência da Fé. A questão é bem mais
complexa. Talvez o que o nosso tempo descobre, mesmo entre convulsões e
incertezas, seja um modo diferente de ser crente, traduzido de formas
alternativas nas suas necessidades, buscas e pertenças. Não estamos perante o
crepúsculo do cristianismo, como defendem aqueles que se apressam a chamar
pós-cristãs às nossas sociedades. Quem não se apercebe que o radical lugar do
cristianismo foi sempre a habitação da própria mudança não o colhe por dentro.
Mas há eixos que se vão tornando suficientemente claros para que seja cada vez
mais um dever os enunciarmos e contarmos com eles. Podem-se apontar três:
Primeiro, os cristãos regressam à condição de “pequeno
rebanho”. Com a evaporação de um cristianismo que se transmitia geracionalmente
como herança inquestionada, os cristãos voltam a sê-lo por decisão pessoal, uma
decisão muitas vezes em contra-corrente, maturada de modo solitário em relação
aos círculos mais imediatos de pertença. Já não é de modo previsível que nos
tornamos cristãos. Isso acontece e acontecerá cada vez mais como uma opção e
uma surpresa.
Depois, à medida que se assiste a um enfraquecimento da
inscrição institucional das Igrejas no horizonte da sociedade redescobrimos o
valor e as possibilidades de uma presença discreta no meio do mundo. Em tantas
situações, nesta diáspora cultural onde estamos semeados, a única palavra
verosímil é a do testemunho de uma vida vivida com simplicidade e alegria no
seguimento de Jesus.
E, em terceiro lugar, esta grande mudança epocal mostra-nos que
precisamos recuperar aquilo que Karl Rahner chama o “santo poder do coração”.
Os cristãos são chamados a viver a amizade como um ministério. “Isto é o que
vos ordeno: amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,17). Há, de facto,
uma revelação do cristianismo que só a prática da amizade é capaz de
proporcionar. E nisto, o mundo, que pode até perder-se em equívocos sobre os
cristãos, não se engana. Mesmo se for um único instante de contacto o que
tivermos, tal basta para deixar transparecer uma amizade.
1 comentário:
Mais uma triste recordação de que "Tolentino" é sinónimo de "pastiche recauchutado". Mesmo o seu novo estudo sobre a amizade é um reaquecer de textos de Mary E. Hunt.
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