sexta-feira, 31 de maio de 2013
Teologia e espiritualidade
Diz Bruno Forte, "parafraseando Kant, uma teologia sem espiritualidade corre o risco de ser vazia, uma espiritualidade sem teologia corre o risco de ser cega" (pág. 102 de "Uma teologia para a vida").
Fica a mensagem. Mas não era Einstein que dizia: "A ciência sem a religião é manca, a religião sem a ciência é cega"?
Fica a mensagem. Mas não era Einstein que dizia: "A ciência sem a religião é manca, a religião sem a ciência é cega"?
Humor pela manhã
"Ah, não soubesse eu escrever!", dizia Nero, enquanto, supostamente relutante, assinava as ordens de execução das sentenças de morte.
quinta-feira, 30 de maio de 2013
Extrema esquerda na procissão
Li no rodapé dos telejornais que partidos da esquerda e extrema esquerda assinalaram o fim do feriado religioso. Assinalaram, opondo-se, evidentemente. Estranho. Quereriam eles ir à procissão do Corpo de Deus?
Bruno Forte: "Uma teologia para a vida"
O livro que me tem acompanhado nos últimos dias (e que fez com que a revisão do carro custasse menos a passar, por exemplo). É uma boa introdução à teologia. Sobre alguns pontos, inclusive de discordância, havemos de falar em breve. Informação da editora Paulus:
Num estilo de livro-entrevista com o escritor Marco Roncalli, Bruno Forte põe em relação fé e história, teologia e filosofia, reflexão e ação pastoral, religião e estética, educação e vida quotidiana. Um livro que apresenta a busca de Deus no nosso tempo, a crise da pós-modernidade, o confronto entre identidade e diálogo, a religião, a globalização, o futuro do Cristianismo. Temas que fazem parte da vida de crentes e não crentes.
"Precisamos de mais exorcistas"
No "Correio da Manhã" de hoje. As declarações do padre e o testemunho da ex-possessa confirmam o que tenho vindo a dizer (como outros): os céticos e os ateus estão mais bem preparados para combater o diabo. A eles o diabo não lhes toca.
Por outro lado, contrariando um comentário de alguém defensor da existência pessoal do diabo num texto anterior, os supersticiosos e adeptos de subprodutos religiosos e para-religiosos estão de facto mais vulneráveis aos ataques do mafarrico. Em vez de "precisamos de exorcistas" para combater os sintomas, deveria ser "precisamos de cristãos mais esclarecidos" que não procurem superstições e caminhos erráticos (causas).
Quanto ao recato destes atos, pois. Se deixassem entrar uma entidade independente (um parapsicólogo, um psiquiatra, um investigador destes casos - nos EUA há um grupo de cientistas que ainda está à espera de uma possessão real, embora confirme o efeito que dizem ser "placebo" dos exorcismos e orações), seria interessante.
Era feriado hoje?
Hoje seria feriado do Corpo de Deus se não tivesse aparecido a trindade profana que é a troika. Na realidade, quase ninguém sente a falta deste feriado, "dia santo de guarda". Perguntei a três pessoas e nenhuma delas sabia que hoje seria feriado noutras circunstâncias. Tenho cá para mim que nunca mais será feriado.
Novo
A vida de Jesus caracteriza-se pela pretensão (feita em nome do Deus com quem Jesus se sabe em particular intimidade) de um homem novo, "utópico".
González Faus
González Faus
quarta-feira, 29 de maio de 2013
29 de maio de 1453. Queda de Constantinopla
No dia 29 de maio de 1453, termina o cerco de Mehmed II a Constantinopla. Ele conquista-a. Cai a "Roma do Oriente", termina a Idade Média. Na realidade, muitos anos antes diversos sábios bizantinos tinham fugido do império, procurando guarida na península itálica. Sabiam grego e eram altamente valorizados na Europa. Com as obras que trouxeram, reforçaram, sem dúvida, o Renascimento.
Eu e o Papa Francisco (2) - "A Festa de Babette"
Francesca Ambrogetti e Sergio Rubin perguntam a Jorge Bergoglio (agora Papa Francisco):
- Há algum filme que recorde especialmente?
Ele fala de vários argentinos, mas mas diz em primeiro:
- Há algum filme que recorde especialmente?
Ele fala de vários argentinos, mas mas diz em primeiro:
- A Festa de Babette, mais recente, tocou-me imenso.
Note-se que, para o Papa, "mais recente" corresponde a 1987, ano do filme dinamarquês.
Note-se que, para o Papa, "mais recente" corresponde a 1987, ano do filme dinamarquês.
Ainda estou a pensar nisto
O humorista segue o princípio do Evangelho: ama o próximo como a ti mesmo.
José Luis Martín Descalzo
José Luis Martín Descalzo
La Biblia de los Niños
Uma página de "La Biblia de nos Niños". Pode ver ou descarregar o primeiro capítulo aqui.
terça-feira, 28 de maio de 2013
Solução «jesuítica» para falar de temas tidos como controversos
Um dia convidaram Carlos González Vallés para fazer uma
série de conferências num país da América Latina sobre “Espiritualidade
Oriental”. Quando já tudo estava tratado, incluindo as passagens aéreas,
telefonam-lhe a dizer que tudo fora cancelado em certa diocese, porque o bispo
não autorizava tais palestras. Certamente, o bispo não conhecia o jesuíta
espanhol com longos anos dedicados à Índia.
Carlos González Vallés manteve a viagem. Se não podia falar
em público, dedicar-se-ia ao turismo, “que é mais divertido”. Mas quando chegou
ao aeroporto, receberam-no e disseram-lhe que estava tudo pronto e que no dia
seguinte iniciariam as conferências. O que acontecera?
Conta o jesuíta:
Todo o «oriental» era perigoso, e isso bastava para proibir-me de falar. Mas tampouco meus anfitriões eram tolos. Voltaram à presença do bispo, disseram-lhe que acatavam obedientemente a suas decisão e que eu, como consequência, falaria em minhas palestras de um tema diferente: «Espiritualidade inaciana». Algum problema? Nenhum, plena bênção episcopal. Ela me foi transmitida no aeroporto por meus amigos, que acrescentaram: «Agora você fala tranquilamente o que preparou». Solução «jesuítica». Atrapalharam o meu turismo.
Adaptado das páginas 71-72 de “Querida Igreja” (Paulus -
Brasil)
Eu e o Papa Francisco (1) - Marc Chagall
Esta é uma nova secção cá no blogue. Pouco mais que brincadeira.
Já disse que se o Papa acredita no diabo enquanto ser pessoal que de vez em quando possui pessoas (para mim ainda não é claro se ele acredita mesmo nisto), não estou com ele. E, digo já, também não estou com ele nas críticas abertas e sem grandes precisões ("quem não distingue confunde", como dizia um célebre professor meu) que faz ao "capitalismo". Na minha opinião, o capitalismo é como a democracia. Podem ser maus, mas ainda não temos sistemas melhores. São reformáveis. E os outros sistemas são muito piores.
Onde me encontro com papa Francisco? Refiro-me a coisas particulares, não às grandes linhas da fé católica, que, como é claro, pelo menos para mim, procuro seguir. Encontro-me com ele na pintura.
Perguntam-lhe Francesca Ambrogetti e Sergio Rubin:
- Um quadro?
E ele responde:
- "A Crucificação Branca", de Marc Chagall.
Já disse que se o Papa acredita no diabo enquanto ser pessoal que de vez em quando possui pessoas (para mim ainda não é claro se ele acredita mesmo nisto), não estou com ele. E, digo já, também não estou com ele nas críticas abertas e sem grandes precisões ("quem não distingue confunde", como dizia um célebre professor meu) que faz ao "capitalismo". Na minha opinião, o capitalismo é como a democracia. Podem ser maus, mas ainda não temos sistemas melhores. São reformáveis. E os outros sistemas são muito piores.
Onde me encontro com papa Francisco? Refiro-me a coisas particulares, não às grandes linhas da fé católica, que, como é claro, pelo menos para mim, procuro seguir. Encontro-me com ele na pintura.
Perguntam-lhe Francesca Ambrogetti e Sergio Rubin:
- Um quadro?
E ele responde:
- "A Crucificação Branca", de Marc Chagall.
segunda-feira, 27 de maio de 2013
27 de maio de 1871. Nasce Georges Rouault, autor de alguns dor mais belos rostos de Cristo
Georges Rouault, francês, nasceu no dia 27 de maio de 1871 e morreu no dia 13 de fevereiro de 1958. Pintou alguns dos mais belos rostos de Cristo.
História sem história
Que desolada, que vazia e que morta parece a história, privada de conteúdo divino, a partir do momento em que se abandona a sua relação com a história interior, divina, transcendente, quer dizer, com a verdadeira história, a história por excelência.
Schelling
Schelling
domingo, 26 de maio de 2013
Amor e audácia
Lido num livro de Carlos González Vallés:
Karl Rahner disse pouco antes de morrer que lamentava duas coisas em sua vida: não ter amado mais as pessoas e não ter tido mais audácia com as hierarquias da Igreja.
Karl Rahner disse pouco antes de morrer que lamentava duas coisas em sua vida: não ter amado mais as pessoas e não ter tido mais audácia com as hierarquias da Igreja.
Bento Domingues: "O segredo da alegria de João XXIII (1)"
Primeira parte (de três) do texto de Bento Domingues no "Público" de hoje:
Para certos frequentadores dos textos do Novo Testamento não lhes basta o simples prazer de os ler. Interessa-lhes o que neles podem encontrar para a orientação da sua vida pessoal, familiar e social. Querem, talvez, descobrir o programa de Jesus de Nazaré e o que dele podem tirar para resolver os problemas do seu dia-a-dia. Não me parece que seja fácil satisfazer este pendor pragmático. Se quiserem colher, nos Evangelhos, um programa de governo, seja para que país for, fi carão decepcionados. Jesus, no sector da agricultura, manifestou que conhecia bem as condições e técnicas para as boas sementeiras e colheitas. Mas uma reforma agrária não se faz recomendando: Olhai os lírios do campo e as aves do céu. Quando aborda a questão dos trabalhadores para a vinha, tem uma política de salários que prima pelo arbitrário e que qualquer central sindical teria de combater. No sector das pescas, provocou iniciativas que multiplicaram o peixe, mas não deixou a receita para garantir futuras experiências de sucesso. Além disso, até retirou barcos e pescadores à sua utilidade normal, fazendo dos pescadores pregadores. Para a montagem de uma indústria próspera, como podia ser a da construção e a dos têxteis, não foi boa ideia recomendar que não se preocupassem com o dia de amanhã. No sector de comércio e negócios, tinha uma teoria que levaria tudo à falência: não encoraja nem exportações nem consumo interno. A atitude perante o dinheiro e a riqueza provocava a troça dos fariseus. A saúde e a assistência foram a sua preocupação permanente. No entanto, não criou uma rede hospitalar, nem lares de terceira idade. Resolvia tudo com milagres. Rejeitou, liminarmente, qualquer programa político, tanto para Si como para os discípulos. Seria de supor que, pelo menos, no plano religioso, se apresentasse como um grande especialista em organizar lugares de culto, peregrinações e cerimoniais que se impusessem como a melhor alternativa para o contacto com o divino. E nada.
O resto cá estará amanhã.
Para certos frequentadores dos textos do Novo Testamento não lhes basta o simples prazer de os ler. Interessa-lhes o que neles podem encontrar para a orientação da sua vida pessoal, familiar e social. Querem, talvez, descobrir o programa de Jesus de Nazaré e o que dele podem tirar para resolver os problemas do seu dia-a-dia. Não me parece que seja fácil satisfazer este pendor pragmático. Se quiserem colher, nos Evangelhos, um programa de governo, seja para que país for, fi carão decepcionados. Jesus, no sector da agricultura, manifestou que conhecia bem as condições e técnicas para as boas sementeiras e colheitas. Mas uma reforma agrária não se faz recomendando: Olhai os lírios do campo e as aves do céu. Quando aborda a questão dos trabalhadores para a vinha, tem uma política de salários que prima pelo arbitrário e que qualquer central sindical teria de combater. No sector das pescas, provocou iniciativas que multiplicaram o peixe, mas não deixou a receita para garantir futuras experiências de sucesso. Além disso, até retirou barcos e pescadores à sua utilidade normal, fazendo dos pescadores pregadores. Para a montagem de uma indústria próspera, como podia ser a da construção e a dos têxteis, não foi boa ideia recomendar que não se preocupassem com o dia de amanhã. No sector de comércio e negócios, tinha uma teoria que levaria tudo à falência: não encoraja nem exportações nem consumo interno. A atitude perante o dinheiro e a riqueza provocava a troça dos fariseus. A saúde e a assistência foram a sua preocupação permanente. No entanto, não criou uma rede hospitalar, nem lares de terceira idade. Resolvia tudo com milagres. Rejeitou, liminarmente, qualquer programa político, tanto para Si como para os discípulos. Seria de supor que, pelo menos, no plano religioso, se apresentasse como um grande especialista em organizar lugares de culto, peregrinações e cerimoniais que se impusessem como a melhor alternativa para o contacto com o divino. E nada.
O resto cá estará amanhã.
"Se Jesus fala de demónios e eles não existem, enganou-nos"
Por estes dias, regressou um velho argumento sobre a
existência real de demónios (enquanto seres sobrenaturais que por vezes possuem
pessoas e depois são expulsos por exorcismos). Digo regressou porque já por cá andou há um
ano. E regressou num ou noutro comentário
de entradas recentes neste blogue, tal como nas mensagens privadas do meu
espaço no Facebook. É de lá que retiro as seguintes frases, sem dizer quem é o
autor. Ele poderia ter escrito no blogue, mas preferiu o recato do FB e por isso não digo o seu nome.
Cristo expulsou demónios. Está em todos os evangelhos. Os apóstolos fizeram o mesmo. Está nos Actos dos Apóstolos. Também nega isso tudo? Ou Cristo (que é Deus, nisso concordamos) desconhecia factos clínicos psicológicos, inacessíveis à ciência da época? Os apóstolos, coitados, ainda vá lá: poderiam desconhecer as diferenças entre doenças psicológicas e possessões. Agora, Deus? Cristo não consegue ver a diferença entre epilepsia e possessão? E, já agora, Cristo não podia ter sido mais claro, e ter dito que o Diabo não existia? É que Cristo, ao falar sobre o Diabo como se ele existisse, acaba por nos baralhar...
Resumiria assim o que está acima: Jesus Cristo sabe tudo e
não engana ninguém (ou não seria Deus). Jesus Cristo expulsou demónios, como os
evangelhos atestam. Logo, eles existem, pois Jesus não quereria induzir-nos em
erro.
Em parte, estas questões já aqui foram abordadas. Primeiro,
nos evangelhos, Jesus expulsa demónios (e não o diabo – são distintos) pela
força da palavra e não por sortilégios (como faziam outros) no contexto do
anúncio da soberania absoluta de Deus (reinado de Deus); depois, é possível
interpretar as possessões como doenças do foro psíquico e, mais do que isso,
vitimizações num contexto social opressor. Diz um autor, em parte afastando-se
da ideia das doenças, que as possessões eram uma estratégia complexa utilizada
de maneira mórbida por pessoas oprimidas para se defenderem de uma situação
insuportável. Vale a pena ler e reler o texto (aqui, refiro-me às páginas digitalizadas). No final, com aquela
interpretação, sinto que os evangelhos são ainda mais reais e significativos
para aqueles tempos e os tempos de hoje.
A linha de fundo do argumento “não podia enganar-nos”
repousa na convicção de que Jesus, sendo Deus, sabe tudo; ou, sendo Deus, não
pode mentir, errar, enganar.
Há aqui três questões subjacentes. Aponto: a) O que é
Jesus ser Deus? (podemos ter entendimentos diferentes sobre isto); b) Estar
errado é pecado? (julgo que todos concordamos que não) c) Podemos dizer que
mente ou erra quem pensa de acordo com as conceções do seu tempo, se estas mais
tarde mudam? (julgo que todos concordamos no não).
Fica-se com a ideia, obviamente inaceitável para um crente, de que se Jesus falou de demónios e eles não existem, enganou-nos,
esquecendo que mentira (e erro moral) seria se Jesus soubesse uma coisa e
dissesse algo deliberadamente diferente (alguns dizem: “Sendo Deus, tinha de
saber”; nós dizemos: “Não tinha, não”). Mas se pensava de acordo com as
conceções culturais do tempo (e temos muitos motivos para pensar que sim), não
é mentir dizer algo que não corresponde ao que em fase posterior é tido por
verdade. Jesus diz que o grão de mostarda é a semente mais pequena. Talvez
pensasse mesmo que é. Fala do sinal de Jonas. Como qualquer judeu da época,
pensava num Jonas real e não numa figura literária. Diz que “o princípio não
foi assim”, ao falar do divórcio. Certamente pensaria num Adão e Eva reais,
como aparecem nas primeiras páginas da Bíblia. E os exemplos poderiam
continuar.
Desconfio que o tipo de teologia que nega a comunhão de
Jesus com os conhecimentos do tempo desconhece o significado da kenose de
Jesus, do abaixamento, do fazer-se humano, do caminhar com os contemporâneos.
Desconhece, certamente o que Bento XVI escreveu no livro
sobre a infância de Jesus:
É verdade também que a sua sabedoria cresce. Enquanto homem, Jesus não vive numa omnisciência abstrata, mas está enraizado numa história concreta, num lugar e num tempo, nas várias fases da vida humana, e de tudo isto toma forma concreta o seu saber. Manifesta-se aqui, de modo muito claro, que Ele pensou e aprendeu de maneira humana.
Ele pensou e aprendeu de maneira humana.
Com isto chego finalmente ao que me moveu a escrever isto.
Relendo um livro de Carlos González Vallés, dei com a página que condiz com as
cristologias do Jesus que sabia tudo mesmo tudo. Quando a mim, padecem, como noutra altura já escrevei, de uma espécie de docetismo gnoseológico.
O jesuíta cita gigantes da teologia (Santo Hilário: “Jesus
comia e bebia, não porque precisasse de fazê-lo, mas tão-somente para que não
se surpreendessem os que viviam com ele”; São Cirilo de Alexandria: “Jesus
sabia tudo desde seu berço, mas aparentava ir-se inteirando das coisas para
dissimular”; Santo Atanásio: “Jesus nunca pôde adoecer nem envelhecer”; os
salmanticenses: “Jesus foi de facto desde o princípio, e não apenas em potência
como possibilidade futura, o maior filósofo, matemático, pintor, navegador…
jamais existente” [esta faz lembrar os ditadores norte-coreanos]) e seguir fala
da sua experiência:
Eu ouvi dizer em sermões que Jesus, desde o berço em Belém, poderia ter contado à Mãe tudo o que lhe aconteceria na vida; que podia ter falado com os Reis Magos na língua destes; que quando o Evangelho diz que «se surpreendeu» diante da fé do centurião, isso não passava de um gesto condescendente de Jesus, que na realidade não podia «surpreender-se» com nada, já que conhecia tudo; que, quando perguntou ao cego: «O que quer que eu faço por você?», esta era uma simples pergunta teórica, já que Jesus sabia sempre o que cada um pensava e queria; que, quando rezava era sói para dar bom exemplo aos discípulos, uma vez que ele, sendo Deus não precisava de oração; que, se dormia na barca, não era por cansaço físico, mas para testar a fé dos apóstolos; e que, se gritou na cruz: “Por que me abandonaste?”, não foi por sofrimento pessoal, mas como consolo para os nossos.
Como ficamos em relação aos demónios? Repito Bento XVI: “Ele [Jesus Cristo] pensou e aprendeu de maneira humana”.
sábado, 25 de maio de 2013
Anselmo Borges: "O mundo dos afectos, a fé e a cura"
Artigo de Anselmo Borges no DN de hoje:
A definição do Homem como animal racional não dá conta adequada do que somos: de facto, não começamos por pensar, mas por sentir. Somos afectados pelo meio ambiente, desde o ventre materno. Daí, não ser indiferente uma gravidez querida e serena e uma gravidez vivida no meio da inquietação e do sobressalto.
No instante da concepção, está-se no que alguns chamam a "inocência do sentimento". Depois, começamos a ser afectados, positiva ou negativamente, e assim se vai formando uma atitude positiva ou negativa face ao mundo e aos outros, com consequências na auto-estima e autoconfiança ou não, com confiança no mundo e nos outros ou, pelo contrário, com desconfiança e inquietação.
Na altura, ainda se não pensa, mas sente-se. Primeiro, são os afectos. Suponhamos que, depois do nascimento, não se cuida convenientemente do bebé, ninguém lhe sorri, ninguém o acarinha. O que fica? O sentimento de frustração. Afinal, o que vale o mundo? Para que serve? Não começa aqui o sentimento de revolta, violência e destruição?
Depois, com a aquisição lenta do uso da razão, há-de estudar-se a vida afectiva, para aproveitar a sua força - querer ser e viver - na condução da existência, sabendo conviver com ela nas suas dimensões positivas e negativas. Porque a razão, sem os afectos, pode ficar paralisada, mas estes, sem aquela, podem tornar-se cegos. E assim se constata a importância do que hoje se chama a razão que sente, razão sensível, razão emocional.
É neste fundo anímico-vital afectivo que mergulha a própria fé religiosa. Esquece-se frequentemente que a fé não começa por ser religiosa, mas uma atitude fundamental da existência enquanto confiança de base. Hoje, quando o que faz falta é confiança e crédito, percebe-se melhor o tema. Mas, a um dado momento, há-de colocar-se também a questão da fé religiosa, na medida em que se põe a pergunta pelo fundamento último da confiança.
A realidade da fé como atitude fundamental de toda a existência e como possível abertura à fé religiosa, garante do sentido último e pleno, é sublinhada cada vez mais, também em estudos científicos referentes à doença e à cura. Aliás, não há aqui nenhuma descoberta, pois sempre se soube que a atitude do Homem face à vida, à doença e à própria morte depende do grau da sua confiança.
Também da confiança em Deus? "Uma grande maioria do corpo científico considera que a religião tem um impacto positivo na saúde", explicou na Time Magazine Andrew Newberg, da Universidade da Pensilvânia.
Agora, Le Monde des Religions (n.° 54, 2012) foi investigar e dá conta de um artigo da Universidade de Oxford em 2001, com a síntese de 1200 estudos sobre a questão, concluindo que "crer , rezar, praticar uma religião levam a uma melhor resiliência às doenças mentais como a esquizofrenia e têm uma acção positiva sobre a pressão arterial e as funções imunitárias". Isto não significa que a oração seja um medicamento, mas que acreditar permite suportar melhor a doença, favorecendo o tratamento. A imagem de Deus, bom ou castigador, é fundamental.
Gail Ironson, da Universidade de Miami, num estudo sobre a ligação entre VIH e crença religiosa, conclui que, "mesmo tendo em conta os medicamentos, a espiritualidade traz um melhor controlo da doença". Nel Krause, da Universidade do Michigan, mostrou que as pessoas que acreditam que "a sua vida tem um sentido" vivem mais tempo.
O acto médico não pode ser de modo nenhum o de um técnico perante uma máquina estragada que é preciso reparar. É necessário aproximar-se do paciente dentro de uma compreensão global do Homem. Georges Engel, num artigo célebre - "The Need for a New Medical Model" -, falou de uma aproximação "bio-psico-social", que, segundo o teólogo Guy Jobin, teve enorme impacto. "Já não se trata de uma divisão do trabalho entre cura do corpo e cura das almas. Em vários sectores do cuidado - em geriatria, nos cuidados de longa duração, nos cuidados paliativos -, o acompanhante espiritual faz agora parte integrante da equipa de cuidados. É considerado um profissional como os outros membros da equipa."
sexta-feira, 24 de maio de 2013
24 de maio de 1844. A primeira mensagem em morse diz “What hath God wrought”
Fernando Calado Rodrigues: "O diabo não existe"
Madrid nomeia oito exorcistas. Aumenta a oferta emprego no setor
Notícia do "i" de hoje. Há uma lei que ainda não vi escrita, e cuja autoria, portanto, julgo poder reivindicar: quanto mais se fala do diabo/demónio, mais ele atua. Não é preciso que exista o diabo para que ele atue. Basta que se fale dele. E se houver exorcistas, não falta clientela. Alguma chega lá a pensar que tem o demónio e sai de lá, por vezes passados anos, curada porque finalmente se livrou dele, que entretanto foi bem inculcado. Há nisto tudo uma patranha imensa, em que até os psiquiatras, sem realmente colaboraram, colaboram. Eles dizem para o exorcista: Isso eu não sei explicar. E o exorcista esfrega as mãos de contente: Cá está, é o demónio. Antes era assim em quase todas as doenças mentais. Depois o espaço do demónio foi diminuindo. Agora é assim numa franja de casos. O demónio ainda não foi extinto.
E enquanto o demónio faz sofrer algumas pessoas (está estudada a psicologia demoníaca: ataca mais mulheres do que homens, ataca mais os supersticiosos, não ataca ateus, e nunca se manifesta perante céticos, ao ponto de não haver uma única possessão credível, apesar de haver muita gente aliviada com orações e exorcismos), o que é verdadeiramente demoníaco, humanamente demoníaco, o mal moral na vida política, económica, social, etc., vai fazendo o seu curso. E não há exorcista que valha.
quinta-feira, 23 de maio de 2013
O diabo da bola
Já me perguntaram se estou com o Papa Francisco na questão do diabo/demónio. Se o diabo/demónio andar por aí a possuir algumas pessoas, não, não estou (e isto tem pouco a ver com o facto de algumas delas se sentirem aliviadas com orações e exorcismos, os quais, feitos por pessoas convencidas de que o outro tem um demónio, parece que têm efeitos positivos em pessoas que pensam que estão possuídas por um ser sobrenatural).
Mas não é o único assunto em que não estou com o Papa Francisco. Também não iria à bola com ele. Na realidade, quando penso no futebol das grandes equipas, dificilmente concebo atividade mais capitalisticamente selvagem. Demoníaca, até.
Mas não é o único assunto em que não estou com o Papa Francisco. Também não iria à bola com ele. Na realidade, quando penso no futebol das grandes equipas, dificilmente concebo atividade mais capitalisticamente selvagem. Demoníaca, até.
"Vou montar uma loja de roupa desportiva", pensou o Papa Francisco
Já perdi a conta às camisolas. Mais duas camisolas de futebol para o Papa Francisco. N'"A Bola" de hoje. Fé, futebol e Francisco.
E o bispo da diocese mais importante do país vai ser...
Na revista "Visão" desta quinta. Fontes habitualmente bem informadas dizem-me que vai ser o segundo a contar da esquerda. Apesar de não ter carta de condução.
Quem escreveu isto?
Quem disse esta frase tão citada, glosada, parafraseada?
Os feitos se Sócrates, dos quais ninguém duvida, estão menos provados do que os de Jesus Cristo.
a) Tomás de Aquino
b) Jean Jacques Rousseau
c) Alfred Loisy
d) Rudolf Bultmann
Resposta (selecione): Jean-Jacques Rousseau. Nunca imaginava, mas dei agora mesmo com essa afirmação do filósofo genebrino.
Os feitos se Sócrates, dos quais ninguém duvida, estão menos provados do que os de Jesus Cristo.
a) Tomás de Aquino
b) Jean Jacques Rousseau
c) Alfred Loisy
d) Rudolf Bultmann
Resposta (selecione): Jean-Jacques Rousseau. Nunca imaginava, mas dei agora mesmo com essa afirmação do filósofo genebrino.
quarta-feira, 22 de maio de 2013
O livro sublinhado de João XXIII
João XXIII - daqui a dias faz 50 anos que ele morreu - foi núncio em Paris até 1953. Dizem que, apreciando o nível cultural do clero francês e não por ironia, um dia afirmou: "Nenhum padre francês se dá por satisfeito enquanto não fizer gemer as prensas com um livro seu".
Na realidade, lia os autores franceses. Mais tarde foi encontrado entre os seus haveres um livro intitulado "Verdadeira e falsa reforma na Igreja", sublinhado e anotado, publicado originariamente em 1950. Autor: Yves Congar, o teólogo mais influente no II Concílio do Vaticano.
O grande contraditor
Veio para passar fome e dar-nos fartura, veio para ter sede e dar-nos de beber, veio vestir-se de morte e revestir-nos de imortalidade, veio pobre para nos tornar ricos.
Agostinho
Agostinho
terça-feira, 21 de maio de 2013
O diabo outra vez
Há uma série de blogues e comentadores, alguns em grandes jornais italianos (e também neste blogue, nos comentários), que anda exultante com as referências do papa Francisco ao diabo e, agora, com um suposto exorcismo.
O porta-voz do Vaticano já veio dizer que aquilo não era exorcismo nenhum, era apenas uma oração do Papa sobre um portador de deficiência. Ler aqui. Mas já se sabe como é. Quem acredita no diabo, vê-o em todo o lado. É uma explicação fácil. Desresponsabilizante. Que só justifica (e é justificado por) teologias poeirentas. Mas adiante.
Ou existe ou não existe. Mesmo que não exista, não estamos proibidos de usar a palavra em sentido metafórico, como julgo que o Papa faz. Mesmo que não exista, tem grandes efeitos em quem nele acredita. E mesmo que exista - o que é a existência de um ser não-ser? - , não creio. Não se pode crer no negativo. Só creio em "coisas" positivas.
O porta-voz do Vaticano já veio dizer que aquilo não era exorcismo nenhum, era apenas uma oração do Papa sobre um portador de deficiência. Ler aqui. Mas já se sabe como é. Quem acredita no diabo, vê-o em todo o lado. É uma explicação fácil. Desresponsabilizante. Que só justifica (e é justificado por) teologias poeirentas. Mas adiante.
Ou existe ou não existe. Mesmo que não exista, não estamos proibidos de usar a palavra em sentido metafórico, como julgo que o Papa faz. Mesmo que não exista, tem grandes efeitos em quem nele acredita. E mesmo que exista - o que é a existência de um ser não-ser? - , não creio. Não se pode crer no negativo. Só creio em "coisas" positivas.
Coisas grandes sem caminho?
Se o Senhor te tivesse dito unicamente "Eu sou a Verdade e a Vida", poderias replicar-lhe: Grandes coisas me ofereces, mas como se chega lá?
Agostinho de Hipona
Agostinho de Hipona
segunda-feira, 20 de maio de 2013
Aprender com os ateus
De vez em quando gosto de ler os ateus. Penso mesmo que é um défice do catolicismo que se pretende informado desconhecer as ideias dos que pensam diferente. E pensar diferente não é necessariamente pensar o oposto. E mesmo que seja.
Frequentemente, ler ateus, mesmo que não se concorde com eles na generalidade, é oportunidade para questionar catolicíssimos comportamentos e práticas.
Há dias dei com esta passagem de "O significado das coisas" (Gradiva), de A. C. Grayling (aquele que compilou uma "bíblia" sem Deus; ver aqui e aqui) que me leva a questionar a presença social do cristianismo, que é essencialmente missionário. Não que a ponha em causa. Nada disso. Interrogo-me é sobre o modo como é levada a cabo. Uma questão de pedagogia, portanto. Escreve Grayling:
Frequentemente, ler ateus, mesmo que não se concorde com eles na generalidade, é oportunidade para questionar catolicíssimos comportamentos e práticas.
Há dias dei com esta passagem de "O significado das coisas" (Gradiva), de A. C. Grayling (aquele que compilou uma "bíblia" sem Deus; ver aqui e aqui) que me leva a questionar a presença social do cristianismo, que é essencialmente missionário. Não que a ponha em causa. Nada disso. Interrogo-me é sobre o modo como é levada a cabo. Uma questão de pedagogia, portanto. Escreve Grayling:
Ao obrigar os outros a agir de acordo com as preferências deles, revelam pelo menos algumas das seguintes características: insensibilidade, intolerância, falta de amabilidade, insuficiência de imaginação, incapacidade de compreender os sentimentos alheios, ausência de compreensão, ignorância relativamente à existência de interesses e necessidades alternativos na experiência humana e arrogância na convicção de que a sua forma de ver as coisas é a única aceitável.
domingo, 19 de maio de 2013
"O exame da 4.ª classe e outras pragas do Egipto", por José Diogo Quintela
Texto de José Diogo Quintela na "2" do "Público" de hoje. Mais uma vez, humor com inspiração bíblica no título e mais para o final.
Bento Domingues: "Celebrar a subversão"
Dois parágrafos do texto de Bento Domingues no "Público" de hoje:
No campo católico, a reforma litúrgica do Vaticano II, sem perder o sentido plural da ritualidade, tentou vencer a doença da obsessão ritualista. O fundamentalismo de uns, a incultura de outros, a preguiça e a mediocridade geral têm dificultado os caminhos de uma genuína criatividade. Em nome da ortodoxia e da piedade, está a ressurgir, em alguns grupos e paróquias, a mentalidade restauracionista.
...
O mundo não parou em 1965. Para se tornar católica, a Igreja no seu devir na história humana tem de rever, continuamente, as suas posições. Não pode dizer que não há alternativas. As configurações actuais dos ministérios ordenados já não correspondem ao que deles se deve exigir, para estarem abertos às surpresas do Espírito de Cristo, que não é exclusivo dos homens. A exigência desta mudança e da reforma da Cúria estão interligadas.
Esta é uma das prosas admiráveis do dominicano. E irritante para alguns dos leitores deste blogue. Amanhã estará cá o texto todo.
sábado, 18 de maio de 2013
Anselmo Borges: "Identidade narrativa, a ética, a Europa e a esperança"
Texto de Anselmo Borges no DN de hoje. Aqui.
Se fosse vivo, teria feito 100 anos no passado dia 27 de
Fevereiro. É um dos maiores filósofos do século XX, que "se tornou
filósofo para se não tornar esquizofrénico".
Refiro-me a Paul Ricoeur, sendo o que aí fica, evitando
tecnicismos, uma homenagem ao grande pensador humanista e cristão, que também
influenciou a teologia, com a hermenêutica.
1. Pergunta nuclear da filosofia é: o que é o Homem?, quem
sou eu? Ora, não se pode duvidar do facto de que eu sou; mas quem sou, o que é
que eu sou: isso é duvidoso. O Homem não é transparente a si próprio. Para
chegar a si mesmo, tem de fazer um grande desvio de interpretação, passando
pelas obras da cultura: a literatura, as artes, as religiões, as ciências
naturais - no quadro das neurociências, em diálogo com J.-P. Changeux, fez
questão de acentuar a distinção fundamental entre o conhecimento científico e a
experiência vivida: o sujeito não é redutível a dados empíricos -, as ciências
humanas... É mediante esse percurso que o Homem vem a si próprio; reconhece-se,
narrando a sua própria história, sempre aberta e em transformação. A identidade
humana é narrativa.
2. A ética ocupa lugar central no pensamento ricoeuriano. É
famoso, neste campo, o seu triângulo ético: a ética é "o desejo da
"vida boa" com e para outrem em instituições justas". Tudo
arranca do desejo: o esforço de existir, a capacidade de querer e agir, ser.
Mas "eu" (primeira pessoa) não sou sem o outro, sem o "tu"
(segunda pessoa), que me solicita: "O outro é meu semelhante. Semelhante
na alteridade, outro na semelhança." O encontro, porém, dá-se no contexto
de um "ele", "ela" (terceira pessoa), que remete para o
impessoal e institucional (instituições justas).
3. A sua filosofia está profundamente enraizada. Di-lo
também um texto sobre a Europa, numa entrevista de 1997, agora publicada pela "Philosophie Magazine": "Estamos em guerra económica. É um problema muito
perturbador, sobre o qual nunca tinha dito nada. É hoje o problema de toda a
Europa ocidental. Onde, para sobrevivermos, devemos manter uma ética e uma
política da solidariedade. O combate a travar tem duas frentes: por um lado, as
nossas economias têm de permanecer competitivas; por outro, não podem perder a
alma - o seu sentido da redistribuição e da justiça social. Um problema enorme,
quase tão difícil de resolver como a quadratura do círculo...
Ainda não acabámos com a herança da violência e da última
guerra. Nem com a dureza e a brutalidade do sistema capitalista, que deu KO ao
comunismo, ficando sem rival. É hoje a única técnica de produção de riqueza,
mas com um custo humano exorbitante. As desigualdades, as exclusões são
insuportáveis.
Estou um pouco tentado por uma solução que se poderia dizer
cínica. Pode causar-lhe espanto da minha parte, mas enquanto este sistema não
tiver produzido efeitos insuportáveis para um grande número, continuará o seu
caminho, pois não tem rival... Penso que vamos conhecer na Europa ocidental uma
travessia no deserto extremamente dura. Porque já não somos capazes de pagar o
preço que os mais pobres do que nós pagam. A ascensão das jovens economias
asiáticas, concretamente a da China, supõe um custo que seremos incapazes de
suportar. Não só não queremos isso, mas não devemos fazê-lo. Não vamos voltar
aos tempos do trabalho infantil!... É por isso que eu sou tão fortemente
pró-europeu; só uma economia de grande dimensão permitirá à Europa sair
disto."
4. "O Homem é a Alegria do Sim na tristeza do
finito." Ricoeur sabe da finitude e do mal e da violência e da morte. Mas,
em primeiro lugar, há a vida e o seu esforço de ser: "a morte não é eu
como a vida, é sempre a estrangeira." Aqui, radica a esperança como
sentimento fundamental: "a esperança diz: o mundo não é a pátria
definitiva da liberdade; consinto o mais possível, mas espero ser libertado do
terrível." Assim, na última página da sua última grande obra: La Mémoire,
l"Histoire, l"Oubli (2000), publicada aos 87 anos, deixou este texto
que dá que pensar e que assinou pelo próprio punho: "Sob a história, a
memória e o esquecimento. Sob a memória e o esquecimento, a vida. Mas escrever
a vida é uma outra história. Inacabamento. Paul Ricoeur."
Só às 11h é que se sabe que D. Manuel Clemente é o Patriarca de Lisboa
Só hoje às 11h se pode dizer que D. Manuel Clemente é o próximo Patriarca de Lisboa, segundo pede a Santa Sé, porque é a essa hora que a coisa se torna oficial em Roma. Já toda a gente sabe, ontem vários jornais diziam (pelo menos online) quem é, e hoje aparece na primeira página de alguns, mas a notícia anda pelas redações com embargo. Alguns meios cumprem-no. Outros não, como a Lusa. E outros chegam ao cúmulo de dizer mais ou menos isto: eu tenho aqui o comunicado que diz quem é o próximo Patriarca, mas não posso dizer quem é antes das 11 horas de sábado. Mas a Lusa diz que é D. Manuel Clemente.
sexta-feira, 17 de maio de 2013
Mais que evolução
O Cristo meramente humano não é mais do que uma figura, uma peça de eleição artificial, como a do homem evolutivo.
Chesterton
Chesterton
quinta-feira, 16 de maio de 2013
Imagem
O Novo Testamento, ao relatar a vida de Jesus, não dá qualquer pista acerca da sua aparência externa. Contudo, quando lemos os evangelhos, podemos perfeitamente fazer uma ideia muito viva de Jesus, graças ao facto de as pessoas que realmente o conheceram não mais o terem esquecido ao longo das suas vidas.
Shusaku Endo
Shusaku Endo
quarta-feira, 15 de maio de 2013
Banco do Vaticano vai publicar contas e balanços
Sede do IOR
Agora só falta que…
as dioceses,
as paróquias,
as congregações,
os institutos,
os jornais diocesanos e paroquiais,
os centros sociais paroquiais,
as confrarias,
as irmandades,
as fundações
e todas as outras instituições da Igreja católica que vivem,
pelo menos em parte, do dinheiro dos fiéis tornem públicas anualmente as suas
contas.
Provavelmente, a poucos interessarão. E algumas destas entidades já o
fazem. Mas se todas o fizessem, de modo sistemático, aconteceriam duas coisas,
pelo menos. A verdade e a transparência passariam a estar mais patentes nas
instituições. E o semimito (porque nalguns sítios é mito e noutros realidade) de
que a Igreja é rica começava a ruir.
Tarântulas
Falando da importância do acolhimento nas estruturas da Igreja, Jorge Bergoglio diz que "numa diocese havia uma secretária a que os paroquianos chamavam a tarântula" (pág. 77 de "Papa Francisco, Conversas com Jorge Bergoglio", nas Paulinas). Eu também conheci uma. Só uma, não com esse nome, mas com o mesmo efeito dissuasor.
terça-feira, 14 de maio de 2013
A época das Salomés dançantes
João Miguel Tavares diz no “Público” de hoje, na última
página, que um certo político do norte…
…simplesmente, já está em campanha para as autárquicas, e nesta campanha o que mais vai andar por aí são Salomés dançantes a quererem entregar a cabeça do ministro das Finanças numa bandeja.
Fica registada a inspiração evangélica desta nota sobre a
política nacional.
segunda-feira, 13 de maio de 2013
Definição de teologia
Harold Wilson, um teórico da "teologia"
Por um motivo que não interessa para o caso - mas eu explico: do outro lado do Atlântico, um leitor pergunta-me se tenho o livro "Nisso não acredito", de John A. T. Robinson, aqui referido - , abro o livro do bispo anglicano numa página dobrada e leio:
Há alguns anos, Mr. Gaitskell propôs uma revisão das famosa Cláusula Quatro (sobre a nacionalização) da constituição do Partido Trabalhista.Cá está uma boa definição de teologia para começar a debater o que realmente ela é.
Wilson, que se lhe opôs, apelidou isso tudo de «teologia» - afirmações teóricas acerca de coisas que não fazem nenhuma diferença na ordem prática.
É a reputação que tem a «teologia».
Fala a todos e não é propriedade de ninguém
Numa palavra, o mistério de Jesus, hoje como sempre, consiste em que ele pode falar de Deus e do ser humano aos grupos mais diversos, empregando para cada um a linguagem mais apropriada e compreensível e fazendo que todos reconheçam a sua autoridade, embora a expressem em termos tão diferentes que se torna impossível qualquer ensaio de síntese. O mistério de Jesus consiste em que foi e continua a ser o objeto que todos contemplam, mas que nunca se converte em propriedade de ninguém, nem sequer dos discípulos.
Etiénne Trocmé
Etiénne Trocmé
domingo, 12 de maio de 2013
Bento Domingues: "Ainda há muito que fazer"
Bento Domingues no "Público" de hoje:
Na celebração deste domingo, Jesus ressuscitado, antes de se
despedir, deixa-nos algumas recomendações: abandonar a inveterada vontade de
poder e mantermo-nos disponíveis para as aventuras do Espírito de Deus. Há
muito que fazer e não basta estar sempre a olhar para o céu (Lc 24, 46-53; Act
1, 6-11). A história da Igreja no mundo está aberta, é nosso encargo. Não nos
deixou um manual de instruções do tudo previsto. Os que depois nos arranjaram,
não satisfazem.
Texto na íntegra, aqui, amanhã.
sábado, 11 de maio de 2013
11 de maio de 1979. Óscar Romero encontra-se com João Paulo II
No dia 11 de maio de 1979, D. Óscar Romero teve uma audiência com João Paulo II. Dizem os relatos, do próprio em primeiro lugar, que saiu do encontro triste com o Papa polaco, tal foi a frieza demonstrada. João Paulo II pediu-lhe para ser mais cooperante com o governo de El Salvador.
Mais tarde, em 1983, numa visita a El Salvador, João Paulo II rezou no túmulo do bispo mártir. E em 1997, declarou-o "Servo de Deus".
Entretanto, há muito que os anglicanos o veneram no dia 24 de março, dia da sua morte (em 1980), enquanto alguns católicos contestam o estatuto de "mártir".
Mulheres de tallit
As mulheres podem finalmente rezar no muro das lamentações usando o xaile ("tallit") que até agora era exclusivo dos homens.
Os judeus ultra-ortodoxos, homens, opuseram-se e, com eles, muitas mulheres. Por lá, aquela espécie de véu significa conquista. Por cá, na Igreja católica, continuam a insistir que a mulher não pode destapar a cabeça para receber a imposição das mãos da ordenação.
Anselmo Borges: "Animais humanos e os outros"
Texto de Anselmo Borges no DN de hoje.
Na reflexão sobre o ser humano, divulga-se hoje a tese do
animalismo, isto é, entre o homem e os outros animais não haveria uma diferença
qualitativa, mas apenas de grau. Por mim, continuo a pensar que a diferença é
qualitativa e essencial. Com isto, não estou a retirar-lhes valor intrínseco e
até penso que lhes é devido tratamento adequado, recusando sofrimentos cruéis e
inúteis.
Como escreveu Edgar Morin, "embora muito próximo dos
chimpanzés e gorilas, e tendo 98% de genes idênticos, o ser humano traz uma
novidade à animalidade". Há, apesar de tudo, entre etólogos e
antropobiólogos, convergência bastante no reconhecimento de que entre o animal
e o homem se deu um salto qualitativo essencial. Esse salto manifesta-se, em
termos gerais, na autoconsciência, na autoposse de si mesmo como eu único e
centro de identidade, na linguagem simbólica e reflexiva, na capacidade de
abstrair e formar conceitos, na transcendência em relação ao espaço e ao tempo,
na criação e assunção de valores éticos e estéticos, no pré-saber da morte
própria vinculado às crenças religiosas, na pergunta pelo ser e pelo seu ser.
O médico e filósofo Pedro Laín Entralgo chamou a atenção
para o facto de haver um conjunto de características que mostram essa diferença
e chamou-lhes "notas", precisamente porque são observáveis.
O homem não se encontra na simples continuidade da vida no
sentido biológico. Como escreveu Max Scheler, o homem é "o asceta da
vida", pois é capaz de dizer não aos impulsos instintivos. Perante a
comida apropriada, o animal não resiste a comer, mas o homem é capaz de dizer
não, por motivos de ascese ou pura e simplesmente para mostrar a si mesmo e aos
outros que tem a capacidade de resistir e dizer não. F. J. Ayala vê aqui
"a base biológica da conduta moral da espécie humana, nota essencialmente
específica dela". Porque é capaz de renunciar, abster-se, deliberar,
optar, o homem é um animal livre e moral.
Evidentemente, os outros animais também comunicam, mas a
linguagem duplamente articulada, que nos permite o pensamento simbólico e
abstracto e nos dá acesso à reflexão, ao mundo da cultura, à abertura ao ser,
ao passado e ao futuro, ao que há e ao que não há, à transcendência, à
distinção entre o bem e o mal, entre o justo e o injusto, como já Aristóteles
viu, manifesta a singularidade única do ser humano, a ponto de, por causa dela,
o Prémio Nobel J. Eccles concluir por uma descontinuidade ontológica entre o
homem e os outros animais.
Mesmo biólogos (por exemplo, Jakob von Uexküll) notaram que
só o homem tem mundo (Welt), já que os animais têm meio (Umwelt, mundo
circundante). Por isso, estes vivem na imediatidade da estimulação enquanto o
homem vive no real, é um "animal de realidades", como repetia Zubiri.
O repouso de "O Pensador", de Rodin, não é simples repouso. O
que nele se mostra é a capacidade de ensimesmamento, descida à sua intimidade e
submersão na sua subjectividade pessoal. Paradoxalmente, porque o ser humano é
abertura à totalidade do ser, vem a si como único, na experiência de um eu
pessoal. Escreveu Lacan: "Possuir o Eu na sua representação: este poder
eleva o homem infinitamente acima de todos os outros seres vivos sobre a terra.
Por isso, é uma pessoa."
Na abertura ilimitada ao ser, tem o seu fundamento a
pergunta sem limites, que caracteriza o homem: toda a resposta dá sempre lugar
a novas perguntas. Por isso, o homem é criador do novo e ser do
transcendimento, de tal modo que não pode deixar de perguntar pelo próprio
Deus, pelo Fundamento e Sentido últimos.
Se admitimos a evolução, não é de estranhar que encontremos
já nos chimpanzés, gorilas, bononos, antecedentes do que caracteriza os
humanos. No entanto, com o homem, o salto foi para uma realidade essencialmente
nova. Para lá das notas apontadas e outras que poderíamos apresentar, como a
criação e contemplação da beleza, o levantamento de edifícios jurídicos para
dirimir pleitos, o sorriso e a sepultura, está o facto de só o homem levar
consigo precisamente a questão da diferença entre ele e os outros animais. Só
ele tem deveres para com eles, sem reciprocidade.
sexta-feira, 10 de maio de 2013
10 de maio. Hoje é dia de S. Karl Barth
"Karl Barth" por Oliver Crisp
Karl Barth nasceu no dia 10 de maio de 1886, em Basileia, na Suíça. É o teólogo protestante, da Igreja Reformada, que mais teólogos católicos gostariam que fosse católico. Alguns de facto tentaram aproximá-lo do catolicismo. Mas ele, bem dentro do espírito luterano-calvinista dizia que nunca poderia aceitar essa coisa da analogia do ser (analogia entis). De facto, nás achamos que há pontes, alçapões que fazem sonhar o absoluto. Eles acham que o abismo é intransponível e que só a graça nos vale. Nós também acreditamos nisso, porque saber isso é a principal analogia (intelig)entis.
Três papas no Vaticano
A gente pensa que há dois Papas e aparece sempre mais um. O Papa dos Coptas. Três no Vaticano. Notícia na Ecclesia. O da direita é aquele de cuja eleição se falava neste texto.
P.e Calado Rodrigues: "Ordenação de mulheres"
Ainda bem que lembra
Os crentes devem tirar o chapéu ao entrarem na igreja, não a cabeça.
Chesterton
Chesterton
quinta-feira, 9 de maio de 2013
O Papa agora também é cromo
Já houve de João Paulo II, em 2005. Bento não era tão popular, pelo que não teve caderneta. Agora aí está a vida de Bergoglio/Francisco em 400 cromos. Cada carteira traz 5 e custa 60 cêntimos. Para completar a coleção, é preciso gastar 48 euros. E que não saia nenhum repetido.
Porta
Aplico o ouvido e aprendo a discernir os sinais dos tempos, oiço claramente os sinais da tua presença confortante à minha porta.
Carlo M. Martini
Carlo M. Martini
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