quarta-feira, 30 de abril de 2014

Dois textos de João César das Neves

João César das Neves escreveu na segunda-feira, no DN, sobre "A festa dos cinco papas", os quatro da canonização do dia 27 mais um outro.
Ontem foi um dia especial. Dois papas vivos declararam perante o mundo que dois papas mortos estavam na vida plena. A canonização de João XXIII e João Paulo II pelo Papa Francisco, na presença do papa emérito Bento XVI, constitui um acto único na história do mundo. Será que interessa ao mundo?
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Oito dias antes, JCN escreveu um conto de Páscoa.

O meu amigo fora claro: o seu prédio ficava entre a igreja e a livraria. Cedinho nessa manhã de Páscoa ali estava eu totalmente perdido, apesar das indicações. Ele dissera que não havia nada que enganar, porque a grande cruz no cimo da torre se via à distância. Além disso eu visitara-o há uns anos e esperava reconhecer o local. Apesar disto, não fazia a menor ideia onde me devia dirigir. Estava totalmente perdido.
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domingo, 27 de abril de 2014

Bento Domingues: "Domingo de canonizações"

Texto de Bento Domingues no "Público" de 27 de abril de 2014.

Morreu Vasco Graça Moura

Morreu Vasco Graça Moura. Não tinha relação especial com ele para além de ser leitor habitual das suas crónicas. Citei-o sete vezes neste blogue, como aqui, o suficiente para ficar triste com a morte deste intelectual. E surpreendido, como acontece geralmente com a manifestação da irmã morte.

Santos

João Paulo II e João XXIII são santos desde há minutos - diz a imprensa online. Antes não eram.

Bento Domingues: "A noção de infalibilidade tem pouco de infalível"

Início do texto de Bento Domingues no "Público" de hoje:

Hoje é domingo de canonizações, de surpresas e decepções. Fizeram-me, a este respeito, uma pergunta estranha: será verdade que uma canonização envolve a infalibilidade pontifícia?

Digo estranha porque, nas questões de ordem teológica, o que me preocupa, em clima cristão, é saber se um determinado acontecimento, atitude, gesto ou palavra servem a dimensão imanente e transcendente dos seres humanos, como criaturas de relação e de interajuda. Respondi que uns teólogos dizem que sim e outros dizem que não. Sabem tanto uns como outros. Estamos, portanto, em matéria opinável. Como a própria noção de infalibilidade tem pouco de infalível, é melhor não ligar muito a esse género de preocupações.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

JOC: Jovens Organizados e Combativos


A JOC belga, no fundo, a mãe de todas as juventudes operárias católicas e do próprio movimento mais geral da Ação Católica, fundada pelo quase beato Cardijn, deixou de ser Operária e Católica. Agora, JOC quer dizer Jovens Organizados e Combativos.
“Há dois anos, os jovens jocistas decidiram iniciar um longo processo de reflexão sobre a identidade da JOC”, explica o movimento num comunicado. Foram realizados debates internos sob a forma de questionário, dirigido aos membros, e encontros com os militantes históricos. 
Visto à luz do novo nome, a combatividade torna-se o principal valor do movimento num contexto de crise. “A JOC procura organizar todos aqueles que estão revoltados e querem lutar contra todas as formas de opressão causadas especialmente pelo sistema capitalista, precisa o comunicado. Não se trata apenas de denunciar as injustiças que os jovens vivem, mas também de lutar concretamente para aboli-las”. Li aqui.

Isto provoca-me duas ou três reações (ainda não as contei, porque é tudo tão rápido que não dá tempo). A primeira seria uma peroração sobre o fim da identidade católica da Bélgica. Mas isso há muito que foi feito. A segunda, seria uma breve dissertação sobre o catolicismo enquanto religião (ou confissão) da saída da religião, à Marcel Gauchet. Mas neste momento até duvido do nome do autor e da correcção da ideia. A terceira seria uma saudação por os jovens jocistas belgas terem feito o que muitos jocistas e emeceístas (do Movimento Católico de Estudantes) portugueses no fundo querem, mas não têm coragem para tal. A quarta seria um lamento vattimista sobre a dentidade débil do catolicismo no séc. XXI. A quinta seria ver aqui um sinal dos tempos. E a sexta, seria falar dos pobres tempos que vivemos. A sétima, porque está mesmo a ser pedida, seria.

Anselmo Borges: "Francisco e o 25 de Abril"

Texto de Anselmo Borges no DN de 12 de abril (aqui):


1. A fotografia percorreu mundo: o Papa Francisco de joelhos, diante de um padre no confessionário, a confessar-se à vista de quem estava. Sabia-se que o Papa também peca e portanto se confessa. Mas agora está mesmo lá a confessar-se normalmente, como qualquer católico. Afinal, também é pecador, como repete constantemente, e tem dúvidas e engana--se como toda a gente, não é infalível. É simplesmente um homem, que acredita no perdão de Deus. E quer melhorar a sua vida, tanto mais quando tem uma imensa responsabilidade perante a humanidade inteira.

Pouco depois, na semana passada, Francisco deu uma entrevista a um grupo de cinco estudantes católicos belgas de comunicação. E foi-lhes dizendo, textualmente: "Enganei-me e engano-me. Diz-se que o ser humano é o único animal que cai duas vezes no mesmo sítio. Os erros foram grandes mestres de vida. Não diria que aprendi com todos os meus erros; com alguns, não, também sou casmurro. Mas aprendi com muitos outros erros e isso faz-me bem." Entre os equívocos na sua vida recorda que, quando ainda jovem, com 36 anos foi nomeado superior da Companhia de Jesus, cometeu erros "com o autoritarismo". Depois, deu-se conta de que "é preciso dialogar, escutar o que os outros pensam".

Já ouviu dizer : "Este Papa é comunista!", por causa do seu discurso sobre os pobres, mas esclarece que não. "Não, esta é a bandeira do Evangelho, a pobreza sem ideologia, os pobres estão no centro do anúncio de Jesus."

Confessa que é feliz, com uma grande paz, apesar dos problemas. "Sempre houve problemas, mas esta felicidade não vai embora com eles." Lamenta é que "neste momento da história o ser humano foi retirado do centro", sendo o seu lugar ocupado "pelo poder e pelo dinheiro". Referindo o desemprego dos jovens, arremete contra "uma cultura do descartável": o que não serve a globalização reinante deita-se fora: "Os jovens são expulsos, são expulsas as crianças, não queremos filhos, só famílias pequenas, e são expulsos os velhos, muitos deles morrem com uma eutanásia oculta, porque não se cuida deles." Mas está confiante: ainda na Argentina, falou com muitos políticos jovens e comprovou que, de direita ou de esquerda, falam "com uma nova música, um novo estilo de política". E faz uma pergunta: "Onde está o teu tesouro?" Porque, "onde estiver o teu tesouro, aí estará o teu coração", como diz o Evangelho. E responde: pode estar no "poder, no dinheiro, no orgulho" ou na "bondade, na beleza, no desejo de fazer o bem".

2. Pelo menos 80% dos portugueses ainda se consideram católicos, e é nesse pressuposto que faço uma breve reflexão.

Há uma herança indiscutivelmente imensa e positiva do 25 de Abril. A democracia, as liberdades, os direitos humanos, erradicação do analfabetismo, algum desenvolvimento, uma nova consciência de cidadania... são bens inestimáveis. Mas muita coisa correu mal, de tal modo que a gente pergunta como é que, tendo podido fundar um país moderno, se está onde nos encontramos. Incompetência e irresponsabilidade política, ganância desmesurada, anteposição de interesses próprios e partidários ao bem comum, cumplicidades entre partidos e negócios, investimentos irracionais, corrupção, justiça inoperacional, multiplicação cega de instituições de ensino superior e perda de autoridade nas escolas, consumismo hedonista leviano, um tsunami demográfico, abismo cada vez mais fundo entre os muito ricos e os pobres, incapacidade de pensar o futuro com um projeto viável para Portugal... eis alguns dos responsáveis.

Será preciso parar. Para pensar - do latim, pensare: pesar razões, também em conexão o penso para cura das feridas. Para confessar os erros e aprender com eles: é espantosa a "inocência" de comentadores que falam como se a maioria não tivesse estado no poder.

E a Igreja oficial precisa, tornando-se verdadeiramente livre, acima de interesses e partidos, de ser mais interventiva enquanto voz político-moral, iluminada e iluminante.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Um bispo para Itália e outro para o Norte de África

Há dois novos bispos para Portugal. Ou melhor, portugueses, já que são bispos de dioceses no Norte de África e na Itália. Um é bispo de uma terrinha da Numídia, perto dos sítios por onde andou Agostinho de Hipona; o outro é bispo de uma diocese perto de Roma. Como têm de ser bispos de algo, nem importa que sejam de dioceses já não existem.

sábado, 12 de abril de 2014

Acumulação burguesa de Cristos?


Boaventura Sousa Santos fala na sua segunda casa, em São Pedro de Alva, perto de Coimbra, no "Fugas" de hoje:

"Abandonei a religião aos 22 anos. A religião católica era extremamente conservadora.”

E a reportagem acrescenta: "Criado na religião católica, com comunhão diária até aos 16 anos, deixou de acreditar. É agora um não-crente que tem uma coleção de Cristos como objetos de arte-sacra".

Anselmo Borges: "O dinheiro faz a felicidade?"

Texto de Anselmo Borges no DN de sábado passado (5 de abril; tirado daqui):


Lá está Epicuro: "É preciso meditar sobre o que traz a felicidade, pois, se ela estiver presente, temos tudo, mas, se estiver ausente, fazemos tudo para obtê-la." E é o que faz F. Lenoir, num belo livro recente, exigente e acessível, Du bonheur. Un voyage philosophique: como alcançar a felicidade, ser feliz. E não podia faltar um capítulo sobre o dinheiro: ele traz a felicidade?

J. Renard atirou: "Se o dinheiro não faz a felicidade, dê-o." Mas quantos estão dispostos a isso? No entanto, num artigo célebre de 1974, o economista americano R. Easterlin mostrou que no seu país, embora o rendimento bruto por habitante tenha dado o salto extraordinário de 60%, entre 1945 e 1970, a proporção de pessoas a considerar-se "muito felizes" não tinha variado: 40%. Não se confirma a fórmula mágica do capitalismo liberal: crescimento do PIB = aumento da felicidade. Aliás, as estatísticas do Insee diziam o mesmo em relação à França: embora entre 1975 e 2000 se observe um crescimento global do PIB superior a 60%, a proporção das pessoas "satisfeitas ou muito satisfeitas" permaneceu à volta de 75%. Mas há mais. Na Inglaterra, por exemplo, enquanto a riqueza nacional quase triplicou em meio século, as pessoas que se declaram "muito felizes" passaram de 52% em 1957 para 36% em 2005. E quando se compara o índice de satisfação em países com níveis de vida incomparáveis? Ao contrário do que se poderia esperar, a taxa de satisfação é praticamente a mesma nos Estados Unidos ou na Suécia e no México ou Gana, embora o rendimento por habitante nestes países divirja numa escala de um a dez.

Depois, para o sentimento de felicidade, é determinante a comparação social. O grau de felicidade é influenciado pela comparação que se faz da situação própria com a dos vizinhos e de pessoas de nível social próximo. Por exemplo, uma investigação com estudantes mostrou que uma grande maioria deles (62%) se sentiria "mais feliz" a ganhar num primeiro emprego 33 mil dólares, sabendo que os colegas receberiam 30 mil, do que a receber 35 mil, sabendo que os outros ganhariam 38 mil. "O que revela a nocividade de uma disparidade de rendimentos demasiado forte no seio de uma sociedade, devido à frustração criada." A questão agrava-se com a globalização mediática, que leva a comparações à escala planetária. Lá está Séneca: "Nunca serás feliz enquanto fores torturado por alguém mais feliz." A comparação com outros acaba por envenenar a felicidade própria.

Repare-se agora no paradoxo. Por um lado, quando se pergunta: "Que coisas lhe parecem mais importantes para ser feliz?", o que surge em primeiro lugar não é o dinheiro e o conforto material, mas sim, em todos os continentes, a família, a saúde, o trabalho, a amizade e a espiritualidade, pilares do bem-estar e da felicidade. Diga-se que a religião ocupa um lugar importante nos Estados Unidos, já que as pessoas praticantes de uma religião se dizem mais felizes, vivendo em média mais sete anos que as outras (menos álcool, menos droga, menos suicídios, depressões e divórcios).

Mas, por outro lado, agora, quando se pergunta: "Que coisas gostaria de ter para ser mais feliz hoje?", a maioria responde: "Dinheiro." Três explicações. Vivemos na mais grave crise económica do pós-guerra e ao mesmo tempo numa sociedade que exacerba o desejo de posse. Depois, um período de enorme incerteza, com o perigo de desemprego, de ameaças financeiras, e dificilmente se consegue viver sem aquelas facilidades que entretanto se tornaram necessidades: televisão, telemóvel, carro. Finalmente, o dinheiro dá possibilidades de satisfação de desejos, desde viajar a uma vida independente.

A sabedoria de viver, neste campo, ouvi-a uma vez ao grande Viktor Frankl, o da logoterapia: "A medida exacta do dinheiro é aquela que não nos obriga a pensar nele, nem por cima nem por baixo." É evidente que a falta cruel de um mínimo impede até a possibilidade de viver, mas fazer-se escravo dele, tornando-se o objectivo da vida enriquecer a todo o custo, impede o melhor: a família, os amigos, a poesia, a música, as alegrias simples, a vida interior, a transcendência.

O dinheiro não faz a felicidade, mas uma chuva de notas...

terça-feira, 8 de abril de 2014

D. António Francisco. Do Paço aos Paços

Até há pouco era o meu bispo. Julgo que nunca falei dele no meu blogue (talvez apenas num ou noutro comentário, como reação). Agora que já não é meu, por cá estará sempre que... (na verdade, não sei qual é a condição), como hoje. Começa com um gesto simples. Caminhar a pé, do Paço até aos Paços. Um gesto simples de um homem grande. Que espero que conquiste o Porto com a sua simplicidade, humildade, serviço.


sexta-feira, 4 de abril de 2014

Génios da literatura - do santo ao ateu

As minhas cem figuras, desde Shakespeare até ao recentemente falecido Ralph Ellison, representam talvez cem atitudes diferentes para com a espiritualidade, abrangendo todo o espetro desde São Paulo e Santo Agostinho até ao secularismo de Proust e de Calvino.

Harold Bloom, "Génio", Temas e debates

terça-feira, 1 de abril de 2014

Le Goff (1924-2014)


Morreu Jacques Le Goff. Quem gosta da Idade Média (mas não de feiras medievais), como eu, deve estar triste.

Só há doze bispos no mundo. São todos homens e judeus

No início de novembro este meu texto foi publicado na Ecclesia. Do meu ponto de vista, esta é a questão mais importante que a Igreja tem de ...