sábado, 31 de outubro de 2015

Anselmo Borges fala da morte no seu artigo de hoje

Anselmo Borges fala da morte no seu artigo de hoje (tema, aliás, da sua tese de doutoramento na Alemanha) no DN:


A morte é impensável em si mesma. Quando pensamos nela, é sempre no abismo do impensável que mergulhamos. Só por ilusão de linguagem é que dizemos, diante do cadáver do pai, da mãe, da mulher, do amigo: ele (ela) está aqui morto (morta). Na realidade, ele ou ela não está ali: o que falta é precisamente ele ou ela. E ninguém leva o pai ou a mãe, o filho, o amigo, à "última morada", para enterrá-los ou cremá-los. Como não tem sentido dizer que eles estão no cemitério e que vamos lá visitá-los. Nos cemitérios, com excepção dos vivos que lá vão, não há ninguém. Então, porque é que a sua violação é uma profanação execranda? O que há verdadeiramente nos cemitérios? Naquele espaço sagrado, do silêncio recolhido, está, paradoxalmente, a fonte da linguagem enquanto espaço da abertura e da pergunta. O que há nos cemitérios é um infinito ponto de interrogação: "O que é o homem?" A morte e o seu pensamento abrem a condição humana ao desconhecido, à Transcendência inominável, que apela e que invocamos.

Aqui.

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

O que é que antes de ser já o era?

D. Manuel Clemente diz que é preciso “investir muito mais” na preparação para o Matrimónio e no acompanhamento da vida conjugal, prioridades apontadas pelo Sínodo dos Bispos sobre a família.

Li na Ecclesia.

Mais fica reforçada a ideia de que os bispos andaram a perder tempo em Roma neste sínodo (como quase em todos, até agora).

Bispos bergoglianos

Em Itália, dois bispos bergoglianos em dioceses tidas como "cardinalícias", Palermo e Bolonha. Um, talvez à falta de metro, anda de bicicleta. O outro escreveu um livro de "combate espiritual contra a máfia". Por outro lado, parece que agora manda mais a Comunidade de Santo Egídio do que a Opus Dei. Ler aqui.

Do uso dos crucifixos

Um crucifixo de bronze também pode ser usado para parir a cabeça a alguém, mas não é uma boa razão para se proibir o fabrico de crucifixos.

Claudio Magris, pág. 135 de "A história não acabou"

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Fornece-se uma parafernália de refugo paranormal a cada passo...

Fornece-se uma parafernália de refugo paranormal a cada passo, cartomantes adivinham o passado e o futuro dos pacóvios com fórmulas vazias que querem dizer tudo e nada, os horóscopos são consultados como laboratório e milagres repetidos como os televisivos; o ocultismo faz-se acompanhar de profecias sempre desmentidas e sempre readaptadas como pastilha elástica. Poucos acreditam em Cristo mas muitos nas nossas senhoras de gesso que choram e nas nuvens que assume o perfil do Padre Pio; quase todos têm vergonha de rezar, mas não de perguntar ao primeiro que aparecer de que signo astrológico é. Patetices como o satanismo e missas negras recebem uma atenção que conviria dedicar à leitura de Kant ou dos Evangelhos, ou mesmo de agradáveis romances policiais.


Claudio Magris na página 139 de “A história não acabou” (ed. Quetzal)

domingo, 25 de outubro de 2015

Comer ciancinhas


Pedro Bidarra, no DN de hoje:


Comer criancinhas não começou como prática comunista. Foi, sim, consequência da política bolchevique de confisco de grão e cereais aos agricultores russos, que, com a guerra civil e a seca, levou à grande fome de 1921. Desesperados e famintos, os russos tiveram de recorrer a extremos desumanos: foi a fome, o canibalismo e a morte de seis milhões de russos que estiveram na origem da expressão "os comunistas comem criancinhas". Uma reputação de que nunca se livraram.

Na realidade, o "comer criancinhas" não é um exclusivo dos comunistas. Julgo que os cristãos foram os primeiros a serem acusados de comer criancinhas, logo no primeiro século, talvez por comerem um "corpo de Cristo". Se era o corpo de alguém, devia ser o de um tenrinho.

Um outro exemplo de comer criancinhas vem na imagem a seguir. Na propaganda anticatólica da Guerra dos 30 anos, os croatas (católicos) também comiam criancinhas.


Bento Domingues: Sínodo das Famílias ou dos Bispos? (2)

Bento Domingues no "Público" de 25 de outubro de 2015.


sábado, 24 de outubro de 2015

Primeiro comer, depois filosofar

A fé cristã não é uma experiência que se possa planificar primeiro para a ter depois conforme se previu. Não resulta de uma qualquer racionalidade laboratorial. Impõe-se com a sua própria dinâmica à consciência daquele que reflete sobre ela. É claro que viver e pensar são dois momento que se devem conjugar no itinerário da fé. Mas convém notar que existe, aqui, uma ordem de prioridade. Normalmente é o viver que está primeiro; o pensar vem a seguir, procurando acompanhá-lo o melhor que pode.

Domingos Terra, in "A fé da Igreja", Paulus, pág. 131

Heróis do hospital



O Diário de Notícias de hoje em vez de fotografias traz desenhos. Desta vez tem a ver com o festival de BD da Amadora. Já há cinco meses fez coisa parecida, numa edição que, diz o jornal, "foi um sucesso".

Copia o que o Público já fez há uns anos, várias vezes, aliás. E também o que fez “O Independente” no final dos anos 80 ou no princípio dos 90, julgo que, por sua vez, imitando o que o “Liberation” fazioa a propósito do festival de BD de Angoulême.

Nestas edições todas, na minha opinião, a única que teve piada foi a de "O Independente", que guardo, como muitas outras, algures em casa dos meus pais.

De resto, o DN de hoje perde muito do seu valor informativo. As imagens estorvam, como esta, que por meter uma cruz provocou este meu comentário. A reportagem fala do pessoal não médico que trabalha no hospital (início aqui). Padre (P.e Fernando Sampaio, do Santa Maria) incluído.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Há um cardeal que vai ser o ministro da família

Pelo que percebi, a família deixa de ser uma secretaria de estado e passa a ser um ministério. Por outras palavras, uma congregação. No Vaticano.

"Decidi instituir um novo dicastério com competência sobre leigos, a família e a vida, que vai substituir o Conselho Pontifício para os Leigos e o Conselho Pontifício para a Família, ao qual vai estar ligada a Academia Pontifícia para a Vida", disse o Papa.

E o que adianta? Não sei.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

O que é o inferno


Leio na "Ler" que Jón Kalman Stefánsson escreveu uma trilogia em que "a procura de sentido para a ideia da existência de um Deus bom e todo-poderoso que permite o sofrimento dos homens, quando Lhe seria tão fácil evitá-lo, é a bússola" que o guia.

Dessa trilogia estão publicados em português os títulos "Paraíso e Inferno" (2013) e "A Tristeza dos Anjos" (2014).

Não sei onde foi buscar a ideia de que seria tão fácil a Deus evitar o sofrimento dos homens. Nunca foi fácil. Pelo menos pelos critérios humanos, está patente. Deve vir da afirmação da omnipotência de Deus a ideia da facilidade de fazer tudo. Não sendo Deus omnipotente, ainda pode ser Deus? Talvez Deus tenha dito que é omnimpotente e quem ouviu percebeu mal. E Deus, na sua omnimpotência, não percebeu que o perceberam mal. E gerou-se o equívoco.

Mas concordo com Stefánsson: "O Inferno é ter braços mas ninguém para abraçar". 

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Enzo Bianchi: A misericórdia vem antes da justiça

Enzo Bianchi escreveu o artigo mais esclarecedor sobre o decorrer do sínodo dos bispos. Bom, não tenho lido muitos. Mas todos muito pífios.

Neste, diz que ao sínodo tem valido principalmente pela partilha entre diferentes situações familiares numa Igreja  que é mesmo global, mas que começa a pensar localmente, ou pelo menos continentalmente (parte não citada).

Recolho, contudo, a parte de que mais gostei, embora continue sem perceber como é que poderá haver comunhão para recasados e manter-se a indissolubilidade do casamento sem contradições.


Em todos os casos, o que mais ocupou os Padres e acendeu os ânimos foram as disposições pastorais a serem assumidas em relação aos divorciados recasados, isto é, aqueles que trazem em si mesmos as feridas da ruptura ou do fim do matrimônio celebrado e sancionado diante de Deus na Igreja.

Todos os Padres sinodais estão convencidos de que o matrimônio cristão é indissolúvel, que essa indissolubilidade é um fim que sempre deve ser buscado com esforço, mas também que se trata de um valor de ordem revelativa e profética, porque mostra a fidelidade de Deus na aliança com o seu povo e com a humanidade inteira.

O que está sendo discutido diz respeito a "como" a Igreja pode ter uma palavra e agir com uma atitude de acordo com o Evangelho pelas famílias concretas de hoje: situações de divórcio, pessoas recasadas civilmente, mães abandonadas, mulheres jovens grávidas e deixadas sozinhas, famílias monoparentais...

Tornou-se de domínio público o episódio de um menino que, no dia da sua Primeira Comunhão, partiu a hóstia recebida para dar uma metade para o pai, que, divorciado recasado, não poderia recebê-la. Alguns bispos, ouvindo o relato, se comoveram, mas essa situação não é uma exceção: divisões intrafamiliares como essa são vividas rotineiramente por cônjuges cristãos que participam da missa, mas sem poder comungar, ambas fazendo parte do corpo de Cristo, mas impedidos de manifestar sacramentalmente essa sua verdade.

Pense-se também em cônjuges cristãos de confissão diferente, também eles unidos no amor selado em uma celebração eclesial, unidos na vida de fé, na educação cristã dos seus filhos e, depois, divididos no momento de participar do alimento eucarístico que nutre a sua vida cristã...

De várias partes, assim, prospecta-se uma possibilidade de acesso aos sacramentos por parte de cônjuges divorciados recasados, mas com algumas condições específicas: que o pedido dos sacramentos parta da sua consciência cristã, que estejam convencidos de terem que assumir a responsabilidade pela ruptura do vínculo matrimonial como contradição com a vontade de Deus – salvo o caso do cônjuge abandonado –, que tenham feito toda a justiça em relação ao cônjuge anterior e aos filhos nascidos da primeira união, que vivam eclesialmente o seguimento de Cristo, que estejam disponíveis a um caminho penitencial sob o discernimento e a custódia do bispo.

Portanto, não se trata de negar a indissolubilidade do matrimônio cristão, até porque essas disposições não diriam respeito indiscriminadamente a todos os divorciados recasados cristãos, mas apenas a alguns casos sabiamente avaliados e acompanhados não por escritórios burocráticos diocesanos, mas pelo bispo, pessoalmente ou através de pessoas competentes encarregadas, peritas em humanidade, obedientes ao Evangelho e refratárias a lógicas mundanas ou a pedidos que não se configuram como fruto de uma consciência iluminada pelo Evangelho.

Essa possibilidade está no espaço da misericórdia que a Igreja sempre deve colocar em prática em relação aos seus filhos e aos homens todos, em conformidade com o seu Senhor Jesus Cristo. Misericórdia não vendida, mas a caro preço: o preço do dom da vida que Cristo deu por nós.

Então, não existe nenhuma contraposição entre misericórdia, justiça e verdade, porque em Deus, que é o legislador, a misericórdia vem antes da justiça, e esta nunca é punitiva, nunca é retributiva, nunca é meritocrática: é uma justiça não enfaixada, porque olha para o rosto de cada um e discerne o sofrimento, o desejo do amor e, só depois, o pecado.
Copiado daqui.

A jantarada dos bispos

Enquanto termina e não termina o sínodo dos bispos sobre a família (porque não um sínodo das famílias sobre os bispos?), sem nada para mostrar, ao que se saiba, dizem as notícias que o cardeal Marx deu uma jantarada (terá sido uma "cheat meal"?) a uma série de bispos numa "villa" que a arquidicose de Munique tem em Roma. Isso foi no domingo.

Parece que hoje há outra. Se alguém poder ir, o casarão de nove milhões de euros fica na Via delle Medaglia d’Oro.


Alguns poderão ficar admirados com a jantarada dos padres sinodais, cerca de 20, de vários países. Mas já houve concílios que terminaram com bailes.
Voltei.

Só há doze bispos no mundo. São todos homens e judeus

No início de novembro este meu texto foi publicado na Ecclesia. Do meu ponto de vista, esta é a questão mais importante que a Igreja tem de ...