sexta-feira, 30 de abril de 2010
Instituto Português de Santo António é o mesmo que Colégio Português de Roma?
Sabe quem foi o primeiro ateu português?
Entrevista ao reitor do Instituto Português de Santo António
30 de Abril de 1834. O padre Lamennais publica “Paroles d’un croyant”
Lamennais (1782-1854), ordenado padre em 1816, começou por ser ultramontano (adepto do poder papal quando na França o poder político se opunha à influência de Roma, que vinha do lado de lá dos montes), mas tornou-se mais tarde propagador de um do catolicismo liberal, social, democrata, até.
Em 1830 fundou com Montalembert e Lacordaire o jornal “L’Avenir” (“O futuro”), defendendo a separação Igreja/estado e a liberdade de consciência, de imprensa e de religião. Estava mais de cem anos à frente do tempo eclesial.
Em 1831 zanga-se com o Papa Gregório XVI porque este não apoia o levantamento popular na Polónia. Lamennais achava que o Papa devia estar ao lado do povo e não dos príncipes. O Papa responde com a célebre encíclica “Mirari vos”, que condena as ideias do francês, embora não o nomeie.
A ruptura com a Igreja dá-se, no entanto, em 1834, com a publicação de “Paroles d’un croyant” (“Palavras de um crente”). A obra condenada pela encíclica “Singulari nos”, de 25 de Junho de 1834.
Em Paris, apoiantes de Lamennais lêem pela rua excertos da obra: “Jeune soldat, où vas-tu ? Je vais combattre contre les hommes iniques, pour ceux qu'ils reversent et foulent aux pieds, contre les maîtres pour les esclaves, contre les tyrans pour la liberté ; que tes armes soient bénies, jeune soldat!”
quinta-feira, 29 de abril de 2010
Bispo do Porto quer que louvemos os vivos
Um rabino e um bispo são convidados para um jantar...
Um rabino e um bispo são convidados para um jantar. O rabino aceita com a condição de que a comida seja pura (“kosher”). Durante a refeição, o bispo olha de soslaio para os pratos do rabino, diferentes dos demais comensais, e, a certa altura, não consegue deixar de perguntar com alguma indignação:
- Caro rabino, quando é que chegará o dia em que, finalmente, eu e o senhor poderemos comer da mesma comida?
O rabino responde no mesmo tem:
- Se Deus quiser, senhor bispo, será no dia do seu casamento.
No autoconhecimento o homem conhece melhor a Deus, diz Catarina de Sena
“No autoconhecimento o homem conhece melhor a Deus. Ao contemplar a bondade divina em si e no espelho, ele compreende que tem em si uma dignidade e uma indignidade. Dignidade por reconhecer-se imagem divina por dom gratuito da criação; indignidade por ver no espelho da divindade o pecado humano. Quem se olha num espelho vê as manchas do próprio rosto; o mesmo acontece com a pessoa que, com amor e fé, se contempla em Deus. A pureza divina mostra-lhe melhor os defeitos da própria face”.
Excerto de “O Diálogo”, de Catarina de Sena, pág. 51 (ed. Paulus, Brasil)
29 de Abril de 1380. Morre Catarina de Sena
Catarina Benincasa nasceu em Siena (ou Sena, na Itália) no dia 20 de Março de 1347 e morreu em Roma no dia 29 de Abril de 1380. Há 630 anos. Vigésima quarta filha de um casal de comerciantes, Catarina não sabia ler nem escrever, mas ditou mais de 300 cartas e um livro, “O Diálogo” (ver aqui), em que a sua alma dialoga com Deus.
Catarina desde os 15 anos (outros dizem 16) que integrou a Ordem Terceira de São Domingos, uma organização para leigos, vivendo em recolhimento. Passava longos dias sem comer. Talvez fosse mesmo anoréctica.
Quando a peste atingiu a Itália, distinguiu-se no cuidado aos doentes. Adepta do papado em Roma, lutou pelo regresso do Papa à cidade eterna, quando este estava em Avinhão.
Está sepultada na Basílica do Vaticano. É a única leiga proclamada “doutora da Igreja” (por Paulo VI, em 1970) e é co-padroeira da Europa (proclamou-a João Paulo II em 1999).
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Ingrediente essencial da aprendizagem
“O ingrediente essencial para se ter amor pela aprendizagem é o mesmo que para o amor romântico, o amor ao país ou o amor a Deus: é a paixão por um tema específico. O conhecimento que é acompanhado por emoções prazenteiras fica connosco. Salta para a superfície e, quando invocado, desencadeia outras ligações na memória, criando metáforas, a vanguarda do pensamento criativo. Pelo contrário, a aprendizagem habitual desvanece-se rapidamente numa confusão de palavras, factos e narrativas. O cálice sagrado da educação liberal é a fórmula pela qual a paixão possa ser sistematicamente expandida, tanto na ciência como nas humanidades, a bem da cultura”.
Excerto de E.O. Wilson, “A Criação. Um apelo para salvar a vida na terra” (ed. Gradiva), pág. 169. Recenseado aqui.
Os pedófilos também são vítimas
O P.e Mário de Oliveira por vezes é um exagerado. Mas nesta entrevista tem razão pelo menos num ponto (penúltima resposta - para quem não quiser ler o resto). Pelo que tenho lido, é o primeiro a referir-se aos clérigos pedófilos como vítimas de uma má educação. Fazem vítimas porque foram vítimas primeiro. Entrevista no DN de hoje (28-04-2010).
Sabedoria de Deus na natureza
Pai e filho passeiam pelo campo. O pai procurar transmiti ao filho a fé num Deus bondoso e omnipotente, chamando a atenção para a maravilha que é a natureza. De repente, leva com uma cagadela de pássaro no seu chapéu.
- Olha, papá. Um pássaro sujou o teu chapéu.
- Como Deus é maravilhoso! Temos de dar graças ao Senhor por não ter dado asas às vacas.
Amizade e desejo de Deus em duas frases de Jacques Maritain
Não existe nada de melhor no mundo do que as maravilhosas amizades que Deus desperta e que são como o reflexo da gratuidade e da generosidade do seu amor.
...
Renunciar a guardar no coração o desejo de santidade, mesmo que ela só seja desejada muito longe, excessivamente longe, mesmo que ela esteja no mal, seria uma última traição para com Deus e para com o mundo.
Jacques Maritain (1882-1973)
Mísseis protegem Papa em Fátima
28 de Abril de 1973. Morre Jacques Maritain
Jacques Maritain nasceu no seio de uma família protestante, em 18 de Novembro de1882 e cresceu num ambiente republicano, liberal e anticatólico. Converteu-se ao catolicismo em 1906. Teve como padrinho de baptismo Léon Bloy (1846 – 1917), poeta e polemista católico. Morreu no dia 28 de Abril de 1973.
Maritain é um dos renovadores do tomismo no século XX. Defensor do “humanismo integral” (“Humanisme integral” é uma obra de 1936), que inclui a dimensão espiritual – contra os humanismos seculares, inevitavelmente anti-humanos –, o seu pensamento está na origem da Democracia Cristã.
terça-feira, 27 de abril de 2010
Mário Soares, o aborto e João Paulo II
Sete voltas p’rá muralha cair
De Tiago Guillul (o baptista Tiago Cavaco) e companhia, uma música que mete Bíblia (Livro de Josué) e rock, como só os protestantes de influência americana são capazes de fazer. Desculpe-se, enfim, a saudade dos anos 80 no vídeo de recursos simples, mas eficazes.
Os católicos, por muito que queiram fazer rock cristão, ainda não têm nem tradição nem paixão bíblica, nem pathos nem electricidade para tal.
Desejo de borboleta
27 de Abril de 1992. Morre o músico Olivier Messiaen
Olivier Messiaen (Avignon, 10 de Dezembro de 1908 – Clichy, 27 de Abril de 1992) foi compositor - um dos grandes compositores eruditos do séc. XX -, organista e amante de pássaros, cujo chilrear incluiu em algumas peças musicais. De 1932 até à sua morte foi organista titular da Igreja da Trinité, em Paris. Muita da sua música é de inspiração religiosa.
segunda-feira, 26 de abril de 2010
Os outros dois artigos de João Carlos Espada
João Carlos Espada dizia no artigo abaixo copiado que o texto concluía uma série de três. Procurei os outros. O primeiro, de 10 de Abril, intitula-se “A modernização conduz à secularização?” Parte do livro de John Micklethwait e Adrian Wooldridge, “God Is Back: How the Global Rise of Faith Is Changing the World" (Penguin, 2009), aqui referido, para dizer que a“crença cientista na secularização como produto inexorável da modernização” não é corroborada pelos factos. Em muitos sítios do mundo a emergência religiosa surge a par com o progresso económico. Ler mais aqui.
O segundo artigo, acima copiado, foi publicado no i de 17 de Abril de 2010, centrando-se na conversão de Anthony Flew (1923-2010) – com base na mesma razão que antes fazia com que o filósofo britânico se proclamasse ateu.
João Carlos Espada: "Cristianismo e modernidade"
Gaffe obriga Londres a pedir desculpas ao Vaticano
A primeira missa no Brasil foi assim
“Ao domingo de Pascoela pela manhã, determinou o capitão de ir ouvir missa e pregação naquele ilhéu e mandou a todos os capitães que aprestassem os batéis e fossem com ele. E assim foi feito. Mandou naquele ilhéu armar um esperável e dentro dele um altar muito bem corregido. E ali com todos nós outros fez dizer missa, a qual foi dita pelo padre frei Henrique, em voz entoada, e oficiada com aquela mesma voz pelos outros padres e sacerdotes, que eram todos ali. A qual missa, sendo meu parecer, foi ouvida por todos com muito prazer e devoção.
Ali era com o capitão a bandeira de Cristo, com que saiu de Belém, a qual esteve sempre levantada da parte do Evangelho.
Acabada a missa, desvestiu-se o padre e subiu a uma cadeira alta; e nós todos lançados por essa areia. E pregou uma solene e proveitosa pregação da história do Evangelho, e no fim dela tratou de nossa vinda e achamento desta terra, conformando-se com o sinal da cruz, sob cuja obediência viémos, o que foi muito a propósito e fez muita devoção”.
In Carta de Pero Vaz de Caminha sobre o descobrimento do Brasil.
26 de Abril de 1500. Primeira missa celebrada no Brasil
Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil em 22 de Abril de 1500. No dia 26 seguinte, domingo de Pascoela, Frei Henrique de Coimbra, um dos elementos da frota, presidiu à primeira missa.
Regressado a Portugal, o frade ainda andou por África e Índia, sendo depois nomeado bispo de Ceuta. Morreu em Olivença, que era a sede do bispado de Ceuta, em 1532.
domingo, 25 de abril de 2010
A união faz a força pela criação
A Criação. Um apelo para salvar a vida na terra
E.O. Wilson
Gradiva
230 páginas
Este livro lê-se como uma grande carta de um cientista, notável biólogo da universidade de Harvard (EUA), a um qualquer pastor baptista. E resume-se a um apelo: vamos juntos trabalhar pela salvação da natureza/Criação.
O tom da obra de E.O. Wilson é ligeiramente desadequado ao panorama português, mas o livro é útil para ficar a conhecer mais de biologia por um grande divulgador. Se ninguém pode amar aquilo que não conhece – dizia Aristóteles – talvez após a leitura deste livro o leitor se torne adepto da conservação da natureza. Mas a desadequação ao panorama português vem do seguinte facto: E.O. Wilson fala para baptistas, que nos Estados Unidos são um grupo significativo e têm grande influência, principalmente no sul do país. Ora, os baptistas são criacionistas, tanto teológica como cientificamente. E tendem a ler as primeiras páginas da Bíblia o mais literalmente possível. A teoria da evolução através da selecção natural está excluída à partida.
É para esses que o cientista com grandes certezas quanto à teoria da evolução escreve. No fundo, diz: mesmo que discordemos sobre a origem da natureza, tenha sido Deus o criador ou tenha sido ela gerada por si mesma através de mutações aleatórias e da selecção natural das moléculas codificantes, podemos estar unidos na mesma causa.
Ora os católicos, ainda que haja excepções, já não sentem que o evolucionismo traga grandes complicações. É uma teoria científica. E a Bíblia não é um livro de ciência. É um livro sobre o sentido das coisas. Coisa que a ciência não pode dar. Daí que os católicos (mas também os anglicanos, os metodistas, os luteranos, de um modo geral) coabitem bem com o evolucionismo científico e o criacionismo teológico. São campos diferentes que explicam níveis diferentes da realidade. Não se espere da ciência que ela venha falar de Deus. Nem o contrário. Mas no essencial, a mensagem do livro vale: “Se a religião e a ciência se pudessem reunir sob o tecto comum da conservação biológica, o problema seria rapidamente resolvido” (pág. 14).
25 de Abril de 1595. Morre Torquato Tasso
Torquato Tasso nasceu em Sorrento, perto de Nápoles, no dia 11 de Março de 1544, e morreu em Roma, no dia 25 de Abril de 1595.
Teve uma vida atormentada, entre manicómios e conventos. Publicaram-lhe em 1580 a obra épica “Jerusalém Libertada”, que relatava o combate entre cristãos e muçulmanos, na primeira Cruzada. “Publicaram-lhe” porque a obra foi-lhe roubada e publicada sem autorização.
O que o mundo chama de mérito e valor
são ídolos que têm apenas nome, mas nenhuma essência.
A fama que vos encanta, vós altivos mortais,
com um doce som, e que parece tão bela
é um eco, um sonho, melhor que um sonho, uma sombra,
que a cada sopro de vento se dispersa e desaparece.
(“Jerusalém Libertada”)
Cheio de escrúpulos e mentalmente desequilibrado, sobreviveu graças a uma tença papal.
Dele são estas frases:
O amor é um desejo de beleza.
Perdido é todo o tempo que em amor não se gasta.
sábado, 24 de abril de 2010
Deus mecanicista, geómetra, físico
24 de Abril de 1585. É eleito Sisto V
Sisto V (nome de baptismo: Felice Peretti; 13-12-1521 –27-08-1590) foi papa entre 24 de Abril de 1585 e a data da sua morte. Não é o Papa da Capela Sistina. Esse é Sisto IV (1471-1484).
Sisto V, que tinha sido um excessivo conselheiro inquisitorial em Veneza, ao ponto de as autoridades pedirem a Roma que o tirassem da república do Adriático, tentou derrubar Isabel de Inglaterra. Nesse sentido, convenceu Filipe II de Espanha a empreender uma guerra contra os ingleses. A Armada Invencível, que nessa altura incluía navios portugueses (Portugal estava sob o domínio dos Filipes), perdeu.
A bula de excomunhão de Isabel I, em 1569, no pontificado de Pio V, já havia sido redigida pelo futuro Sisto V, tal como, provavelmente, a bula “Regans in Excelsis”, de deposição da rainha, que teve como efeito directo o fim da tolerância religiosa em relação aos católicos na Inglaterra.
Sisto V é o papa do obelisco na Praça de São Pedro.
Hans Kung pede reformas. Um concílio
Hans Kung, antigo colega de Ratzinger na Universidade de Tubingen, onde é professor emérito de Teologia Ecuménica, é uma das vozes mais críticas ao papado de Bento XVI e exige um novo concílio para salvar a Igreja católica. Por Hans Kung, no "Público".
Joseph Ratzinger, agora Papa Bento XVI, e eu éramos os mais jovens teólogos no Concílio Vaticano II, entre 1962 e 1965. Agora somos os mais velhos, e os únicos que continuam em plena actividade. Sempre entendi o meu trabalho teológico como sendo um serviço à Igreja Católica Romana. Por esta razão, por ocasião do quinto aniversário da eleição do Papa Bento XVI, faço-lhe este apelo em forma de carta aberta. Faço-o motivado pela minha profunda preocupação acerca da nossa Igreja, que se encontra na pior crise de credibilidade desde a Reforma. Desculpe-me ser na forma de carta aberta; infelizmente, não tenho outra forma de o contactar.
Apreciei imenso que o Papa me tenha convidado, a mim que sou abertamente seu crítico, para nos encontrarmos para uma amigável conversa de quatro horas, pouco após ter ascendido ao seu cargo. Este convite acordou em mim a esperança de que o meu antigo colega da Universidade de Tubingen poderia encontrar o seu caminho e promover uma contínua renovação da Igreja e uma aproximação ecuménica dentro do espírito do Concílio Vaticano II.
Infelizmente... ler tudo aqui.
"O animal humano", por Anselmo Borges
Alexandre Ganoczy
"Qual é a constituição do ser humano para poder fazer o que faz e ser como é, no contexto da evolução?" Crónica de Anselmo Borges no DN de hoje (24-04-2010). Retirada daqui.
Tradicionalmente, no quadro da definição clássica do homem: animal racional - ela traduzia Aristóteles: o homem é "o animal que tem Lógos" (razão; melhor, linguagem) -, a filosofia e a teologia fixavam-se no "racional", esquecendo a animalidade. A cisão acentuou-se com Descartes, ao definir os humanos como "coisas pensantes" e "almas imortais", que contrapôs aos animais enquanto "máquinas".
Significativamente, Kant, que limitou os direitos à pessoa - os animais não têm direitos, nós é que temos obrigações para com eles -, não esqueceu a animalidade humana, empregando expressões como "Tiermensch" - o homem animal - e "Tierheit in Menschen" - a animalidade nos seres humanos. De qualquer forma, depois de Darwin, é inegável que a nossa espécie tem a sua origem em espécies pré-humanas. Por isso, já não é mais possível construir uma antropologia a partir "de cima": uma antropologia actual constrói-se a partir "de baixo".
No quadro da evolução, não se pode negar um parentesco entre os animais e o animal humano. Mas a transição entre eles foi quantitativa ou qualitativa? A sua diferença é de grau ou de natureza? Para entrar no debate, o melhor é comparar comportamentos nas suas semelhanças e diferenças, como faz o filósofo e teólogo Alexandre Ganoczy, numa obra inteligente, “Christianisme et neurosciences”.
Apesar de todas as semelhanças, não se pode ignorar as diferenças específicas que separam o homem do animal. Apontam-se exemplos.
O próprio Darwin, referindo-se à linguagem humana, falou do "poder quase infinitamente maior de associar os mais diversos sons e ideias". A linguagem duplamente articulada e a capacidade de discurso são algo que remete para a singularidade única do homem.
O prémio Nobel de medicina G. M. Edelman escreve que "somos os únicos animais capazes de falar, de modelizar o mundo superando o instante presente, de descrever os nossos estados anímicos, estudá-los, relacioná-los com os resultados da física e da biologia"; esta capacidade da "consciência de ordem superior" implica o poder de distanciar-se do mundo ambiente e de si, e é esta distância que nos permite criticar as nossas próprias acções.
É neste contexto que o neuropsiquiatra B. Cyrulnik fala de "transcendência", no sentido de superação, acrescentando que "não há transcendência animal, já que os animais se adaptam ao real". É neste distanciamento, próprio do homem, entre si e o que o rodeia e entre si e si mesmo que se realiza a liberdade, "tanto como poder de escolher como aptidão para tornar-se si mesmo", escreve Ganoczy, e também a aptidão para "elaborar culturas cada vez mais complexas e polivalentes".
Nem o desejo nem o prazer "são o próprio do homem, mas são-no a sua conjunção e o conhecimento da morte", escreve o neurologista J.-D. Vincent, que, evocando a sexualidade, chama a atenção para "o estranho face a face da copulação do homem e da mulher", significando uma personalização do sexo e criação de laços.
A. Damásio reconhece nos outros animais formas de consciência e um "proto-si", mas, como escreveu Jacques Lacan, "o poder de possuir o Eu na sua representação eleva o homem infinitamente acima de todos os outros seres vivos sobre a terra. Por isso, é uma pessoa".
Com estas e outras diferenças, a pergunta é inevitável: qual é a constituição do ser humano para poder fazer o que faz e ser como é, no contexto da evolução? Alguns continuarão a defender que a diferença é apenas de grau. O neurobiólogo J.-P. Changeux refere-se a uma evolução "que se pode julgar como qualitativamente nova das funções do cérebro do homem". O prémio Nobel de medicina J. Eccles, sublinhando a diferença qualitativa entre a linguagem humana e a linguagem dos símios, concluiu por uma descontinuidade ontológica. O neurobiólogo W. Singer não hesita em utilizar o termo "processo metafísico". Para outros, "emergência" e "fulguração" poderiam bastar.
O debate continua. Quem o trava são animais humanos. Esta é a diferença essencial.
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Literatura judaica no Teatro D. Maria II
Ainda no "Ípsilon" de hoje:
O Teatro Nacional D. Maria II agendou uma sessão de leitura de de contos e poemas judaicos para a próxima terça-feira, às 19h, no Salão Nobre. A selecção dos textos desta Viagem pelos Grandes Temas da Literatura Judaica, que ficou a cargo de Lúcia Liba Mucznick, "procura dar uma imagem alargada das formas de expressão judaica na literatura, desde a mística ou o folclore de origem cabalística até à realidade actual no Estado de Israel", passando inevitavelmente pela Shoah. Os actores Ana Bustorff, Pedro Lamares e Rui Spranger farão as leituras.
Filme de Moretti sobre o Papa no fim do ano
23 de Abril de 1616. Morre Shakespeare
Bom amigo, por Jesus, abstém-te
de profanar o corpo aqui enterrado.
Bendito seja o homem que respeita estas pedras,
e maldito o que remover meus ossos.
William Shakespeare nasceu no dia 23 de Abril de 1564, foi baptizado no dia 26 seguinte e morreu no dia 23 de Abril de 1616. Há muito mistério sobre a sua identidade do mais influente dramaturgo de sempre. E de vez em quando corre a "suspeita" de que era católico (ver aqui um dos elementos mais recentes sobre o assunto).
quinta-feira, 22 de abril de 2010
O que Deus pode e não pode fazer?
Um certo devoto pedia todos os dias a Deus um carro. Como o desejo demorava a ser satisfeito, apesar do fervor da oração, resolve perguntar ao padre:
- Por que é que Deus não me dá um carro? É a minha oração que não é boa, ou é Deus que não me ouve?
O padre, com toda a paciência, responde que Deus não costuma satisfazer pedidos assim tão directos. Seria preferível pedir algo “mais espiritual”. As coisas mais materiais deviam ser conseguidas de outro modo. Passados uns dias, o padre encontra o devoto ao volante de um bom carro.
- Tem razão, senhor padre. Agora só peço coisas “mais espirituais”. Por exemplo, peço a Deus que perdoe por ter roubado este carro.
"Bento XVI, o mal-amado", por Esther Mucznik
As 27 proposições do “Dictatus Papae”, de Gregório VIII
I. Que a Igreja Romana foi fundada somente pelo Senhor.
II. Que só o Pontífice Romano é dito legitimamente universal.
III. Que só ele pode depor ou repor bispos.
IV. Que os seus legados, ainda que de grau inferior, num concílio, estão acima de todos os bispos, e pode contra estes pronunciar sentença de deposição.
V. Que o Papa pode depor ausentes.
VI. Que com os excomungados pelo Papa não se pode, entre outras coisas, permanecer na mesma casa.
VII. Que só a ele é lícito, segundo necessidade temporal, ditar novas leis, formar novas comunidades, converter uma fundação em abadia e, reciprocamente, dividir uma diocese rica e reunir dioceses pobres.
VIII. Que só ele pode levar as insígnias imperiais.
IX. Que todos os príncipes devem beijar os pés do Papa.
X. Que o seu nome deve ser recitado em toda igreja.
XI. Que este nome é único no mundo.
XII. Que lhe é lícito depor os imperadores.
XIII. Que lhe é lícito trasladar bispos de uma sede para outra, se lhe obrigar a isso a necessidade.
XIV. Que pode ordenar clérigos de qualquer igreja onde queira.
XV. Que um ordenado por ele pode presidir a outra igreja, mas não servi-la; e que o ordenado por ele não pode receber grau superior de outro bispo.
XVI. Que nenhum sínodo se chama universal se não for por ordem do Papa.
XVII. Que nenhum capítulo nem nenhum livro seja considerado como canónico sem sua autorizada e permissão.
XVIII. Que suas sentenças não sejam retratadas por ninguém e só ele possa revê-la.
XIX. Que não seja julgado por nada.
XX. Que nada pode condenar quem apela a Sede Apostólica.
XXI. Que as causas maiores de qualquer igreja sejam referidas à sede apostólica.
XXII. Que a Igreja Romana nunca errou e não errará nunca, segundo testemunho das Escrituras.
XXIII. Que o Pontífice Romano, uma vez ordenado canonicamente, é santificado indubitavelmente pelos méritos do bem-aventurado Pedro, segundo testemunho do santo bispo Enódio de Pavia, apoiado pelos muitos santos Padres segundo está nos decretos do Beato Papa Símaco.
XXIV. Que por ordem e permissão sua seja lícito aos subordinados formular acusações.
XXV. Que pode depor e restabelecer os bispos mesmo fora de reuniões de sínodo.
XXVI. Que ninguém seja chamado católico se não concorda com a Igreja Romana.
XXVII. Que ele pode eximir os súbditos da fidelidade para com príncipes iníquos.
22 de Abril de 1073. É eleito Gregório VII
Quando foi eleito, por aclamação popular, este monge beneditino não era bispo, pelo que foi consagrado bispo no dia 30 de Junho de 1073. Uma vez Papa, continuou uma das maiores reformas da Igreja, que ficou para a História como reforma gregoriana (que na realidade já vinha de Leão IX, de quem o futuro Gregório VII fora conselheiro).
A reforma consistiu num reforço do poder papal sobre o poder temporal e o poder dos próprios bispos. O fim da simonia (venda de cargos eclesiásticos e favores divinos) e mais disciplina no celibato eram instrumentos da estratégia. Os princípios da reforma estão no “Dictatus Papae”, um documento de 27 proposições sobre o poder papal.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Roma e Brasília
João Paulo II e Wanda Poltawska
Sinodalidade e sinonulidade
Tenho andado a ler o que saiu no sínodo e suas consequências nacionais, diocesanas e paroquiais. Ia para escrever que tudo se resume à imple...
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Não precisei de ler São Paulo, Santo Agostinho, São Jerônimo, nem Tomás de Aquino, nem São Francisco de Assis – Para chegar a ...
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Dostoiévski (imagem retirada daqui ) Dostoiévski escreveu em “ Os Irmãos Karamazo v ” :“Se Deus não existisse, tudo seria permitido”. A fra...
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Gosto das catequeses de Bento XVI, daquelas que começaram nos Apóstolos e continuaram pelos grandes teólogos, mas só até Afonso Maria de ...