quinta-feira, 3 de março de 2011

Sermão para mim próprio: "Não foi em teu nome que profetizámos?"


Uma amiga do blog Levantai-vos! desafiou-me a dizer o que penso dos evangelhos do domingo seguinte. Inicialmente o desafio não era bem este, mas acabou assim formulado. Começo hoje a dizer o que penso do evangelho que os católicos escutam na missa do domingo seguinte. Não sei se o farei todas as semanas. É um compromisso que tentarei cumprir à quarta ou quinta-feira. São os sermões para mim próprio.

“Senhor, Senhor! Não foi em teu nome que profetizámos, em teu nome que expulsámos os demónios em teu nome que fizemos muitos milagres?” (de Mt 7,21-17)


A resposta é: “Não vos conheci”. Escusava de ser tão ingrato. Mas é que pode tudo ter sido feito no nome do Senhor sem ter sido feito na “vontade” do “Pai que está no Céu”. É um sério aviso para todos os que têm títulos, fazem parte de denominações e confissões, andam com o credo na boca ou coleccionam sacramentos. É que até milagres podem (podemos) fazer na falsidade. E têm abundado os tristes exemplos das vidas duplas. O título não dá garantia.

Noutro ponto, Jesus diz que pelos frutos se vê a árvore, o que quer dizer que, para mais em tempo de engenharia genética, de OGM, e de viveiros especializados em criar árvores pequenas que dêem grandes frutos, o que interessa mesmo é o fruto, não o título. Ninguém pergunta à repositora da frutaria pelo tamanho da macieira quando compra um quilo de maçãs.

Com o bem, é a mesma coisa. Interessa mais o bem bem feito (não há nenhuma palavra a mais) do que o título de quem o faz. Por isso é que há mais cristãos do que os que foram baptizados. Por isso é que há muitas moradas no reino dos céus.

E como não ser apanhado em falso quando se diz “Senhor, Senhor”, já que religião é dependência e todos desejamos genuinamente ser dependentes do Senhor realmente Senhor?

Aqui, a reposta já não está nos frutos, que se vêem, mas nas raízes, que não se vêem. Nos alicerces da casa. A casa que não cai é a que está fundada sobre a rocha. Isso é que é construir com qualidade e garantia contra os lobos maus. Essa é a guerra preventiva no interior de nós próprios que temos de levar a cabo.

A crise que nós, cristãos, estamos a viver tem raízes sociológicas e culturais muito concretas, mas obriga-nos a rever os alicerces e a observar sobre que bases estamos a construir a nossa vida cristã. 
Talvez não tenhamos enraizado o nosso cristianismo sobre o alicerce sólido do evangelho, mas sobre costumes, modas e tradições, nem sempre muito de acordo com a verdade do evangelho. 
Quisemos apoiar a nossa religião na segurança das nossas fórmulas e no rigor da disciplina, mas talvez não nos tenhamos preocupado demasiado em procurar a verdade do evangelho. 
Vivemos muitas vezes demasiado atentos aos códigos, rubricas, normas e prescrições, e não aprendemos a confrontar a nossa própria responsabilidade e os riscos da liberdade cristã. 
José Antonio Pagola, pág. 77 de “O caminho aberto por Jesus”

1 comentário:

Anónimo disse...

Excelente ideia! Força!

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