O Papa Bento XVI deu início, em Barcelona, ao Século XXI. Um dia comentar-se-á assim a primeira sagração que se fez de uma parte da catedral da Sagrada Família. Ainda faltam construir três quartos, as melhores previsões atiram a sua conclusão para 2025 ou 2030, mas o actual momento da obra, com a finalização e funcionalidade da nave central, coberta com um inesquecível céu de colunas arborescentes, representa a viragem há muito desejada.
Só para termos uma ideia. Notre-Dame de Paris tem duas torres mais a agulha do transepto. A Sagrada Família tem, neste momento oito torres, que nos próximos quinze anos, segundo o que está projectado, se converterão em dezoito. E as dez que faltam são ainda mais altas do que as existentes. A grande cúpula de São Pedro (os romanos chamam-lhe, para sublinhar o espanto, “il cupolone”) mede 137 metros. As belíssimas agulhas góticas da Catedral de Colónia (as mais altas da Europa) estendem-se numa vastidão de 157 metros. Ora, a torre central da Sagrada Família estará coroada por uma cruz a 170 metros do chão. A cruz terá 15 a 20 metros com quatro braços horizontais para assegurar, de qualquer ângulo donde se contemple, uma visão central.
E a Sagrada Família não trabalha só o prodígio da altura. Nestes tempos, como dizia Pierre Bordieu, tão afunilados numa desvitalizante miséria simbólica temos aqui o dinâmico esplendor do símbolo. Gaudí, «o arquitecto de Deus» como lhe chamam, idealizou a “sua” Sagrada Família com base no número 12, o número da Jerusalém terrestre, mas também o da Jerusalém do Alto (leia-se a impressiva descrição feita no capítulo 21 do Apocalipse). Gaudí não partiu de soluções pré-existentes, nem repetiu manuais. A sua arquitectura não tem apenas uma sensibilidade ao espiritual, tem a estrutura de uma visão e a profundidade de uma experiência mística. Gaudí mostra a grande Arte como oração intensíssima. E mostra amplamente aquilo que talvez já tínhamos esquecido: os homens do século XXI sabem ainda construir e amar catedrais.
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