quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Lamet: “Bento XVI é menos fundamentalista do que Wojtyla”


Com quase 40 obras publicadas de diversos géneros literários, Pedro Miguel Lamet já não precisa de se defender das pressões censoras do franquismo e daquelas que o fizeram abandonar o jornalismo em 1987 para continuar a pertencer à Companhia de Jesus, porque retoma essa actividade agora como bloguista na revista digital 21rs.es. Sobre um dos seus romances, “Bórgia: los enigmas del duque” [Borja: os enigmas do duque], Pedro Lamet preferiu uma conferência na terça-feira, na capital das Ilhas Canárias, dentro da programação do quinto centenário do nascimento de Francisco de Bórgia. Entrevista-o C.S. no jornal “Las Provincias”. Copiado daqui. Em espanhol aqui.

Fale-me dos enigmas do duque jesuíta.
Esta personagem é fascinante porque poucos santos na história da Igreja reúnem tantas facetas diferentes e até contraditórias. Um homem que foi Grande da Espanha, com uma linhagem de escândalos. Um dos enigmas mais fortes é como este homem veio a ser santo, quando teve aqueles antepassados.

Bisneto do Papa Bórgia [Alexandre VI], amigo íntimo de Carlos V, vice-rei da Catalunha e até mentor da regente Joana da Áustria. Qual é a actualidade, para o mundo religioso e laico, de um homem que acabou jesuíta?
Estamos num mundo em que se valorizam muito o poder, o dinheiro, a fama e a juventude. Estes são os elementos dominantes na publicidade, na televisão, no consumo. Um homem deste calibre rompeu com os prazeres da sociedade mediterrânica e valorizou mais o mundo espiritual. Há uma grande sede de mítica na sociedade actual. Precisamos de espiritualidade, de voltar ao centro do nosso ser, quer se seja católico ou não.

E Bórgia pode ser uma referência, um exemplo a seguir.
Pode ser um exemplo perfeito, inclusive para os grandes e poderosos. Esta sociedade vive muito na funcionalidade, no que é efémero e na necessidade de viver no agora. Disso necessita todo homem para se centrar, inclusive, psicologicamente, porque vivemos muito dispersos, muito tensos.

Qualificou a escassa liberdade de opinião durante o pontificado de João Paulo II como uma etapa de catacumbas e autoritarismo. Nota mudanças com Bento XVI?
Estamos num pontificado em que se equilibrou um pouco a situação. Não diria que Bento XVI é um papa progressista porque é um homem conservador. Mas é menos fundamentalista do que João Paulo II, que acreditava que a Europa tinha que ser confessionalmente católica. Este Papa respeita mais o pluralismo e a liberdade de expressão, mas evidentemente ainda fica muito por caminhar. Sobretudo, a Igreja espanhola está muito centrada no dogma e falta-lhe dar uma boa notícia de liberdade, de alegria. Estamos ainda numa época de castelos de Inverno, de protecção contra a sociedade civil.

Parece que a Companhia não abandona esse papel de besta negra para o Vaticano.
As relações melhoraram sensivelmente em relação a João Paulo II porque Bento XVI é um homem que precisa de nós, que nos valoriza. João Paulo II estava muito centrado nos novos movimentos. Nesse aspecto, Bento XVI é um Papa mais de todos. A Companhia está centrada, está a trabalhar bem e a fazer coisas que os outros não fazem.

Algo a objectar em relação a Ratzinger?
Centrou um pouco a Igreja, mas tem uma série de questões pendentes que ainda não colocou em prática e não sei se o fará. Esperava-se alguma aproximação maior dos divorciados, que agisse em favor da união das igrejas, em temas como o celibato e a mulher na Igreja.

E os escândalos sexuais?
A este Papa se deve o facto de ter trazido à tona o escândalo de Marcial Maciel, o dos Legionários de Cristo, que é alucinante. Sabia-se disso desde os tempos de João Paulo II, contudo, Wojtyla não o revelou. É preciso reconhecer que Bento XVI foi muito corajoso neste aspecto. E também em condenar claramente esta mancha da pederastia no sacerdócio. Um problema que a comunicação social exagerou.

1 comentário:

Zadok disse...

Curiosamente já há muito partilhava destas ideias...
Não conhecia o Blog. Parabéns!
Nuno Queirós

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