quinta-feira, 24 de junho de 2010

Julia Kristeva: "É preciso promover o diálogo entre quem crê e quem não crê"


Julia Kristeva, psicanalista, romancista e filósofa búlgara-francesa (coincidência, faz hoje 69 anos) publicou em italiano “Bisogno di credere” (“Necessidade de crer”) (Ed. Donzelli), um texto em que, mesmo sem renunciar às suas convicções filhas do Iluminismo, confronta-se com o universo da fé, e “Teresa mon amour. Santa Teresa d'Avila: l'estasi come un romanzo” (Ed. Donzelli), obra entre romance e ensaio, que analisa a personalidade e os escritos da santa espanhola do século XVI.
A filósofa deu uma entrevista ao “La Repubblica” (21-06-2010) que foi traduzida para português pelo Instituto Humanitas Unisinos (aqui).
Primeira pergunta/resposta.
D. Gianfranco Ravasi convidou-a para participar do diálogo entre crentes e não crentes. Parece-lhe uma oportunidade?
Hoje, ainda mais do que o diálogo inter-religioso, é preciso promover o diálogo entre quem crê e quem não crê, principalmente na Europa. Pertenço àqueles que, nas palavras deTocqueville e Hannah Arendt, cortaram o fio da tradição. Considero-me uma descendente do Iluminismo e da secularização que nos colocaram em guarda contra os riscos da religião: a neurose, as ilusões, os abusos, as guerras. O fio cortado da tradição nos permitiu movermo-nos rumo à liberdade, sem a qual não haveria o mundo da ciência nem o da arte, a aventura do empreendimento nem a dos novos amores. O fio cortado da tradição é uma conquista importante, mas é preciso evitar o desvio rumo a um niilismo sem valores e sem autoridade. Eis porque temos a necessidade de "transavaliar" a tradição. Isto é, repensá-la e atravessá-la, procurando tirar dela tudo o que pode ser positivo para nós, contemporâneos. Isso vale para toda a tradição, as três religiões monoteístas, mas também para a cultura clássica, o taoísmo ou o confucionismo.

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