Carlos Fiolhais, no blogue Rerum Natura, transcreve o que António Lobo Antunes diz sobre Deus no livro entrevista “Uma Longa Viagem com António Lobo Antunes”, da Porto Editora” (pág. 29-30) (aqui):
«A propósito do rezar de Orson Welles, qual é a sua posição sobre a religião?
Há um velho provérbio húngaro que diz: "Na cova do lobo não há ateus." Eu julgo que não existe quem não acredite, porque o Nada não existe na Física ou na Biologia e quando se lêem os grandes físicos - Einstein, Max Planck e por aí fora -, vê-se que eram homens profundamente crentes. Chegaram a Deus através da Física e da Matemática e falavam de Deus de uma maneira fascinante. A minha relação é a de um espírito naturalmente religioso - e cada vez mais -, embora não no sentido desta ou daquela Igreja mas naquele que me parece que a ideia de Deus é óbvia. Cada vez o é mais para mim.
Porquê?
É um bocado como quando o Einstein - lá estou eu a citar outra vez! - diz que "Deus não joga aos dados"... É claro que eu me zango com Deus, é uma relação de zanga também porque Ele permite sofrimento, mas talvez os seus desígnios tenham tal profundezas que não consigo atingir. O sofrimento sempre me foi incompreensível e acho que, como disse há pouco, nascemos para a alegria. A minha atitude em relação à religião é essa e não estou a falar de Igrejas mas de Deus. Não acredito quando as pessoas me dizem que são agnósticas ou ateias! Não acredita nisso, não estou a dizer que a pessoa não esteja a ser sincera, mas dentro dela, em qualquer ponto, há algo. Uma vez perguntaram ao Hemingway se ele acreditava em Deus e a resposta foi: "Às vezes, à noite".
E o António, à noite, também acredita?
Acredito sempre, mas zango-me muitas vezes. Eu julgo que o próprio da fé é a dúvida, o questioná-la constantemente, e muitas vezes pergunto-me se existe. É óbvio que sim.»
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