terça-feira, 20 de outubro de 2009

Não lhes chegava a Lua, foram para a Amazónia


A propósito dos jesuítas, que dão nome a 35 crateras lunares, Fernando Correia de Oliveira (Estação Cronográfica) dá-me a conhecer o livro “Astronomia na Amazônia no século XVIII (Tratado de Madri). Os astrônomos Szentmártonyi e Brunelli – Instrumentos astronômicos e livros científicos" (Real Gabinete Português de Leitura, 2008), da autoria do historiador Carlos Francisco Moura.
Carlos Francisco Moura é arquitecto e membro da Academia Portuguesa de História, da Academia de Marinha de Lisboa e sócio dos Institutos Histórico Geográfico do Mato Grosso e de Minas Gerais. Tem outro livro sobre a arquitectura portuguesa em Nagasaki, onde estiveram os… jesuítas.
O historiador dá destaque ao trabalho de dois padres: Ignác Szentmártonyi, jesuíta croata, e Giovanni Angelo Brunelli, padre de Bolonha.
Os padres matemáticos, como eram chamados, foram encarregados de fazer as demarcações na Amazónia. Ao que tudo indica, D. João V dava preferência a matemáticos e astrónomos jesuítas, diz o autor da recensão. Mas Brunelli terá sido contratado porque outros padres jesuítas não quiseram aventurar-se na Amazónia.
A preferência do monarca português explica-se, creio eu, pelo avanço tecnológico dos jesuítas no que diz respeito a observações astronómicas, indispensáveis para as demarcações. No Colégio Romano (em Roma), os jesuítas tinham desenvolvido o telescópio de Galileu e esquadrinharam o céu de uma ponta à outra.
[Nos debates do séc. XVII sobre o heliocentrismo, “a intuição da verdade estava do lado de Galileu, mas o rigor estava mais próximo dos jesuítas”, diz Claude Allègre, na pág. 37 do livro “Deus face à Ciência”, na Gradiva/Universidade de Aveiro. Na realidade, Galileu tinha vários amigos jesuítas e só não terá sido mais apoiado por estes, inclusive por Urbano VIII, por causa do carácter arrogante do próprio Galileu.]
Diz a recensão assinada por Paulo Cunha que “Szentmártonyi teve grande importância nos levantamentos feitos na Amazônia e foi designado para a demarcação do trecho de maior responsabilidade, ao longo dos rios Guaporé e Madeira. É dele o estabelecimento da longitude de Belém e a diferença de longitude entre Belém, Macapá e Mariuá, tendo como base a observação de eclipse lunar e a observação de satélites de Júpiter. Há três documentos de época reproduzidos no livro que evidenciam o trabalho desse croata. Eles compõem trechos de uma correspondência do próprio Szentmártonyi dirigida a Carvalho e Melo (que ficou conhecido, posteriormente, como Marquez de Pombal), que consta de três páginas que incluem: a) observações das latitudes; b) longitudes astronomicamente determinadas; c) variações da agulha; e d) termômetros e barómetro”.
Mais tarde, Szentmártonyi seria encarcerado juntamente com outros jesuítas como parte da campanha de Marquês de Pombal contra a Companhia de Jesus. Detido no Pará e enviado para as prisões portuguesas, esteve preso durante 17 anos, até ser libertado depois da morte do Rei D. José e da queda de Pombal. Não se sabe ao certo do ano da sua morte. Apontam-se datas tão díspares como 1793 ou 1806.
Sobre Brunelli, o apontamento sobre o livro refere que nasceu na Itália, provavelmente em Bolonha. Teve melhor sorte. “Na época de sua contratação pela Coroa Portuguesa era considerado um astrónomo emergente e respeitado. No Brasil, fez diversas medições importantes para a cartografia e observou e descreveu vários eclipses. Quando voltou para Portugal foi contratado como professor de matemática do Real Colégio de Nobres de Lisboa, e traduziu, para português, a obra «Elementos», do grego Euclides (por volta de 300 a.C). Após seu falecimento, a sua biblioteca de mais de 3 500 volumes com inúmeros manuscritos foi adquirida pela Real Biblioteca do Rio de Janeiro (actual Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro), em 1818”.
Recensão de “Astronomia na Amazônia”, aqui.
E uma sugestão interessante sobre Galileu e os telescópios – observações astronómicas – para quem estiver em Lisboa nas noites de 23 e 24 de Outubro, aqui.

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