“Vamos continuar a lê-lo por muitos anos. Para, como ele gostava,
concordar e discordar”, escreve José Manuel Fernandes no “P2” de hoje, sobre
Christopher Hitchens, que morreu no dia 15 de Dezembro nos EUA.
Hitchens era um homem de excessos, tanto na saúde (“bebo diariamente o
suficiente para matar ou inutilizar uma mula”) como na escrita e na ideologia. “Move-se
exclusivamente em função daquilo em que acredita em cada momento, sem olhar a
conveniências, sem preocupações de grupo, sem olhar a inimizades”. Tanto
desagradava a esquerda quando escrevia que o “feto era um ser vivo desde o
momento da concepção”, diz JMF (eu escolheria outras palavras, mas percebe-se a
ideia), como enervava a direita quando criticava o sionismo e apostolava pelo
ateísmo.
Escreveu um livro contra a Madre Teresa de Calcutá, “A Posição do
Missionário”, porque dizia que ela defendia a pobreza e não os pobres. O livro
esteve para chamar-se “Vaca Sagrada”.
JMF diz que Hitchens, pela “sinceridade desconcertante”, pela “frontalidade
tonitruante”, “merece fazer parte do panteão sagrado dos grandes intelectuais
públicos”.
Não me parece. Daqui a três ou quatro anos, Hitchens parecerá do século
passado. Mas como leitor de “deus não é Grande” (é assim que é o título da obra
publicada na Dom Quixote), confesso que aprendi alguma coisa – factos e cultura
geral. Mas muitos factos podem não fazer uma razão. Um exemplo: diz Hitchens, e
não é mau que qualquer católico o saiba, para ir mais fundo, que Tertuliano (não
um padre da Igreja, como diz, porque morreu fora da ortodoxia, mas, mesmo
assim, teólogo considerado pela Igreja), descrevendo o paraíso, diz que “um dos
prazeres mais intensos da vida depois da morte seria a contemplação eterna das
torturas dos condenados” (pág. 75). Aprende-se sempre com os ateus que lêem
muito.
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