Jesus dizia de si próprio: “Veio João, que não come nem
bebe, e dizem dele: «Está possesso». Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e
dizem: «Aí está um glutão e bebedor de vinho (…)»” (Mt 11,18).
Esta passagem serve para Tomás Noronha dizer que “Jesus
admite que gostava da pingoleta e que era um valente garfo” (p. 271).
Umas páginas à frente, ficamos a saber que Jesus era um “parolo
da província”, que “veio das berças”, “onde só havia pacóvios” (p. 278).
Há uma lei antiga que diz que sempre que alguém escreve
sobre Jesus Cristo revela-se a si próprio. Era Albert Schweitzer quem o dizia,
afirmando que não há nada mais pessoal do que escrever uma biografia de Jesus
Cristo. Mostrou-o em “The Quest of the Historical Jesus”, no início do século
XX. Rodrigues dos Santos refere a obra (p. 560). Mas saberá o jornalista que Schweitzer,
convencido de que pouco de “científico” se poderia saber de Jesus, considerou
que nada mais restava do que a dedicação ao próximo? Consequentemente, o
alsaciano partiu para a selva africana, que fica um bocadinho para lá das berças, dedicando-se aos últimos do seu tempo. Isso
valeu-lhe o Nobel da Paz em 1952.
O que valerá a Rodrigues dos Santos a sua cristologia? Sim,
há uma. Mesmo que se trate de um romance. Falando de Jesus, há uma imagem e uma
identidade de Jesus. Veremos como acaba. Para já, segundo o protagonista, a cristologia da Igreja baseia-se em fraudes
inconsistentemente cosidas. Mas a que perpassa pelo livro, baseada em leituras parciais, quase de tipo - ou talvez de técnica - fundamentalista, que acaba por revelar o que pensam o protagonista, o narrador e o autor (ok, não se pode falar de uma continuidade entre os três, dizem os académicos, mas neste caso parece-me evidente), é uma cristologia de átomos descontextualizados. De pingos. Eu diria mesmo, e digo, cristologia de pingoleta.
1 comentário:
É chocante a forma como Rodrigues dos Santos se refere a Jesus Cristo. O Jesus Cristo deste escritor/jornalista é alcoólico, lambão, agressivo, lunático e apocalíptico.
Esse não é, com toda a certeza o meu Jesus Cristo, nem o Jesus Cristo dos católicos.
Helena
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