quinta-feira, 19 de maio de 2011

Acreditar apesar dos milagres

Eu não gosto de milagres. Acho-os desnecessários e irrelevantes para a fé. Por vezes, penso mesmo que são contraproducentes. Seria mais fácil acreditar se não houvesse certos milagres ridículos. E mesmo milagres em geral. Não vejo para que serve o desconforto que provocam nem para a fé, que, por definição, deles prescinde ("nenhum outro sinal será dado para além do de Jonas"; "felizes os que acreditam sem terem visto"), nem para a razão, que, mais do que ultrapassada e aberta ao transcendente, se pode sentir ridicularizada.

Parece-me um pouco injusta a quebra de leis físicas por parte de Deus, que as quebra para umas coisas e não para outras, por intercessão dos santos, segundo os Seus superiores desígnios que, dizem os defensores dos milagres, não nos cabe a nós indagar. A minha sensação de injustiça será – já vi argumentar – uma resposta à mesma perplexidade que noutros pode provocar a fé, na linha da desusada apologética tradicional. Terei de conceder que rezar a um santo é uma possibilidade aberta a todos. E algo mais democrático do que um crítico raciocínio teológico.

Já os cépticos argumentam que nunca viram milagres evidentes e impossíveis (uma perna amputada voltar a crescer, por exemplo), que há milagres sem ser por intercessão de santos (ou seja, que não são verdadeiros milagres mas coisas que acontecem ainda sem explicação), que há milagres noutras religiões, que é uma questão de estatística, que a mente manda no corpo de formas ainda não desvendadas...

De qualquer forma, quase todos os milagres católicos são uma boa história, como a de Georgina Monteagudo, contada pelos principais diários de hoje. E uma boa história (em geral, é irrelevante se é verdadeira ou falsa) é sempre bom ouvir.

No "Diário de Notícias"

No "Correio da Manhã"

No "Público"

Nota: Ao escrever isto tive a sensação de que há dias tinha lido algo sobre milagres em Anselmo Borges. Fui confirmar e é verdade, aqui, nas linhas finais do artigo. A argumentação é ainda mais radical. Radical no sentido de séria e profunda.

1 comentário:

SilverTree disse...

Mais uma vez revejo-me na sua opinião, que mais uma vez expressa com uma lucidez grande e conseguindo não se tornar belicoso. Este seu estilo é apenas mais uma das razões que me fazem apreciar tanto o seu blogue.
Isto também para lhe deixar os parabéns pelos dois anos que o espaço completa, espero que se mantenha por muito mais.

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