segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Ordenação das mulheres em questão

Dois artigos sobre a questão do sacerdócio ministerial das mulheres, a propósito do documento que aborda os delitos da ordenação de mulheres e da pedofilia, esta última eufemisticamente tida como “atentados contra a castidade”.


Discordo de um aspecto, mas são textos que exigem reflexão e debate por quem sente a Igreja católica como a sua Igreja. Ambos os textos concordam que a não ordenação de mulheres é uma “discriminação” com base na identidade das mulheres, uma “proibição”. Na realidade, não é bem esse o pensar da Igreja. A Igreja católica não ordena mulheres, porque não se acha com o direito e o mandato de ordenar mulheres. E ordena homens porque se acha com o mandato e o direito de ordenar homens. De resto, e ordenação não é um direito dos homens, mas da Igreja. E, nesse sentido, nunca poderá ser um direito das mulheres. Esta é teologia do sacerdócio, simplificando. Vejamos um exemplo: ninguém tem vocação para bispo (e até para Papa, embora no caso não haja um grau específico). Mas a Igreja ordena os que bem entende. E não faltam bispos à Igreja.


Porém, na prática, a pastoral vocacional é vivida noutro sentido. A vocação para padre é vivida como um desejo individual, e não como um apelo-mandato comunitário – em contradição com a teologia do sacerdócio. De outro modo, não faltariam padres à igreja. Não faltariam ministros às comunidades.


O pensamento de Bento XVI, quando responsável pela Congregação para a Doutrina da Fé, ia nesse sentido. Disse um dia numa entrevista que a Igreja não ordenava mulheres porque a ordenação é uma submissão. Cito de cor, mas creio que não erro nisto: “A ordenação é uma submissão”. Num fundo, queria dizer que a Igreja protegia as mulheres ao não lhes conferir a ordenação que as submeteria a si própria. Talvez a emenda seja pior do que o soneto. A igreja passa, num instante, de ofensora da mulher a vítima de Deus. Tudo requer que pensemos mais a fundo no assunto. De qualquer forma, a questão a colocar será, então: Porque é que a Igreja não se sente mandatada para ordenar/submeter mulheres? A resposta vai sempre dar nisto: por causa da Tradição. E a saída para o impasse terá a ver com isto: a Tradição pode não ser unívoca (houve diaconisas; houve proibições de ordenação das mulheres nos primeiros séculos, o que quer dizer que houve tentativas de as ordenar…); a Tradição pode estar errada; pode estar eivada de concepções antropológicas ultrapassadas, anticristãs, mesmo; pode ser simplesmente tradição e não Tradição.


Penso, em resumo, que um aprofundamento da teologia do sacerdócio devia levar a Igreja a escolher homens e mulheres, casados ou solteiros, para melhor desempenhar a sua função no mundo. Sim, não se trata de direitos dos ordenados, mas cumprimento de uma missão. E é esta missão que é prejudicada pela, quanto a mim, auto-insuflada incapacidade eclesial de ordenar mulheres.


O texto de Teresa Toldy saiu no "Público" de 2 de Agosto. O de Narciso Machado saiu no de 1 de Agosto.


Acrescento posterior: Sobre as palavras de Ratzinger, ler aqui.



1 comentário:

paulo disse...

Concordo. Só mesmo a Tradição pode justificar esta discriminação.
É, parece-me, uma questão de tempo, pois não vejo argumentos lógicos e sólidos em defesa da situação actual. Como já escrevi (http://regador.blogspot.com/2010/07/ordenacao-de-mulheres-e-pedofilia.html).
Um abraço!

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