Elisabeth Schüssler-Fiorenza
Joseph Ratzinger não dizia que “a ordenação é uma submissão” mas antes que a “ordenação é subordinação”, citando a teóloga Elisabeth Schüssler-Fiorenza. Copio das páginas 164-165 de “O Sal da Terra” (ed. Multinova, 1997).
Ainda acrescentaria uma informação que me parece ser muito interessante. É um diagnóstico sobre este problema, feito por uma das feministas católicas mais importantes, Elisabeth Schüssler-Fiorenza. É alemã, uma exegeta conhecida, que estudou exegese em Münster, se casou lá com um italo-americano e que hoje ensina na América. Começou por participar fortemente na luta pela ordenação das mulhares, mas actualmente diz que se tratou de um objectivo errado. A experiência feita com mulheres ordenada na Igreja Anglicana levou-a a reconhecer: ordination e not a solution (“a ordenação não é solução”), não é o que queríamos. E também explica porquê. Diz: ordination is subordination, portanto, a ordenação é subordinação – significa inserir-se numa ordem estabelecida e subordinar-se, e é exactamente o que não queremos. E aí faz um diagnóstico correcto.
Entrar numa “ordo” significa sempre entrar numa relação em que uma pessoa se insere na ordem existente e se subordina. No nosso movimento de libertação, assim diz Elisabeth Schüssler-Fiorenza, não queremos entrar numa “ordo” nem numa “subordo”, numa subordination, mas é precisamente este fenómeno que queremos superar. A nossa luta – assim nos diz ela – não deve, portanto, visar a ordenação das mulheres; se é esse objectivo, fazemos o que está errado, mas a nossa luta deve visar que a ordenação acabe de todo e que a Igreja se transforme numa comunidade entre iguais em que só haja uma shifting leadership, portanto, uma liderança que mude. Viu isto correctamente, a partir das motivações anteriores, a partir das quais se luta pela ordenação das mulheres, em que, na realidade, se trata de participação no poder e de libertação da sujeição. É então preciso dizer que por detrás se esconde, realmente, a pergunta: o que é o sacerdócio? O sacramento existe ou deve apenas existir uma liderança que mude em que não seja dado a ninguém o acesso permanente do “poder”? Julgo que, neste sentido, a discussão talvez mude um pouco no decorrer dos tempos mais próximos.
(Fim de citação)
Comentário. Há que realçar que Ratzinger expôs, julgo eu, o essencial do pensamento de Schüssler-Fiorenza. Se citasse só o “ordination is subordination”, ficaríamos com uma ideia errada do que ela pretenderia dizer. Contudo, Ratzinger é retorcido no seu pensamento. Cita um autor para defender um ponto com que esse autor não concorda, pelo menos dessa forma. E não concorda, ele próprio, cardeal, com o que a teóloga diz. É um tipo de raciocínio comum em Ratzinger (lembro-me de três ou quatro casos – um deles está no polémico e muito referido discurso de Ratisbona). Geralmente irrita o interlocutor, porque se aproxima das técnicas sofistas.
Se a teóloga afirma que o objectivo da ordenação das mulheres está errado é porque é um equívoco, em si, a ordenação, seja de homens ou de mulheres. Ela vai mais além e põe em causa, digamos, o sistema. Usar as suas palavras para manter a “ordem estabelecida” (expressão de Ratzinger) é manipular a sua intenção. Elisabeth não deve ter gostado.
Este texto retoma um assunto iniciado aqui.
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