O discurso da verdade, ou da procura da verdade, não pode nunca ausentar-se do cristianismo, quer na mais pura especulação teológica de uma qualquer faculdade, quer na mais singela homilia de uma aldeia perdida nos montes ou de uma comunidade suburbana.
Santo Agostinho dizia que é preciso compreender para acreditar (“intellige ut credas” – “compreende para acreditares”) e acreditar para compreender (“crede ut intelligas”). E acentuava que o primeiro momento precedia a opção de fé. Compreender, o esforço da razão, seria uma condição prévia à opção da fé. Por outras palavras, não pode haver decisão de coração (numa linguagem que nos aproxima de Rahner e Balthazar), sem haver decisão da cabeça, ainda que, para Agostinho, como mais tarde para Tomás, num segundo momento, só a Revelação permitisse aceder à verdade. A razão é uma escada que nos permite subir no entendimento da realidade, mas para a ver melhor, a partir de certo ponto, só a iluminação de Deus.
Hoje, contudo, no discurso da fé, a procura da razão é muito discreta se não totalmente ausente. Quem fala da adesão à fé, do Baptismo e do Matrimónio, da contracepção e da economia, das seitas e das religiões como questões da procura da verdade? O Papa lá vai atirando umas farpas ao relativismo, mas esse combate não desce do pico da pirâmide às bases.
Estes três parágrafos são apenas introdução para esta pérola de C. S. Lewis (na imagem):
"Pode-se ter uma boa vida sem se acreditar no cristianismo? Esta é a questão sobre a qual me pediram para escrever e, imediatamente antes de tentar respondê-la, tenho um comentário a fazer. A questão parece ter sido formulada por uma pessoa que diz a si própria, “Não me importo se o cristianismo é ou não verdadeiro. Não estou interessado em descobrir se o universo real é mais parecido com o dos cristãos ou com o dos materialistas. Tudo em que estou interessado é em ter uma vida boa. Vou escolher minhas crenças não porque as penso verdadeiras mas porque as considero úteis.” Francamente, acho difícil alguém simpatizar com esse estado mental. Uma das coisas que distingue o homem de outros animais é que ele quer conhecer as coisas, quer descobrir o que é a realidade, simplesmente por conhecer. Quando esse desejo é, em alguém, completamente sufocado, penso que esse alguém tenha se tornado algo menos que um homem. De fato, não acredito que nenhum de vocês tenha perdido esse desejo. Muito provavelmente, pregadores tolos, ao sempre dizerem o quanto o cristianismo ajudará a vocês e o quanto ele é bom para a sociedade, tenham levado vocês a esquecerem que o cristianismo não é um comprimido que se toma para algum mal. O cristianismo alega ter uma explicação para factos – alega poder dizê-los o que é o universo real. Sua explicação sobre o universo pode ser verdadeira, ou pode não ser, e uma vez que a questão está à sua frente, então sua natural curiosidade deve fazê-los querer conhecer a resposta. Se o cristianismo não é verdadeiro, então nenhum homem honesto desejará nele acreditar, não importa o quão útil ele seja: se ele é verdadeiro, cada homem honesto desejará nele acreditar, mesmo se isso não o ajudar de forma alguma”.
(Excerto de God in the dock, que surge no Blog do Angueth)