quarta-feira, 8 de julho de 2009

DSI 5 - Da RN à "Caritas in veritate". Início do associativismo (e sindicalismo) dos operários católicos


A aplicação da máquina (“rápidas, regulares, precisas, incansáveis” – a expressão é de David Landes, na obra “A Riqueza e a Pobreza das Nações”, Ed. Gradiva) ao trabalho gerou a revolução industrial. Não uma revolução rápida, como são as políticas, mas profunda, como são as económico-sociais. Nada ficou como antes. E muitos ficaram pior do que antes, “numa situação de infortúnio e de miséria imerecida” ("Rerum Nvarum" 1), “como instrumentos de lucros”, apenas considerados “em termos de quanto podem a sua fora e o seu vigor” (RN 14), embrutecidos de espírito e enfraquecidos de corpo (RN 31)...

Onde havia massas de operários (centro e norte de Europa), a Igreja percebeu que estava a perder a classe trabalhadora, atraída pelas ideologias socialistas (“perdeu os intelectuais no séc. XVIII, os trabalhadores no séc. XIX e está a perder as mulheres nos séc. XX”, afirmou um padre teólogo espanhol, há década e meia). Note-se que no “socialismo” desta época cabiam diversas ideologias de esquerda, todas elas muito distantes do actual socialismo democrático.

Leão XII denota o afastamento dos trabalhadores da Igreja em diversos pontos da RN. Tal acontece por dois motivos: por um lado, o próprio trabalho impede o descanso e a dedicação de um dia por semana a Deus (RN 31); por outro, há a influência de associações “de que a religião tem tudo a temer”, “governadas por chefes ocultos” e obedecendo a uma “orientação externa” (RN 37). Estas associações e partidos, nas suas correntes mais extremadas defendiam a supressão da propriedade privada. Contra eles, escreve Leão XIII, quase a abrir a encíclica: “Os socialistas, para curar este mal [a imposição por um pequeno número de ricos e de opulentos de um jugo quase servil à massa imensa do proletariado], instigam nos pobres o ódio contra os que possuem, e pretendem que toda a propriedade de bens particulares seja suprimida, que os bens de qualquer indivíduo sejam comuns a todos, e a sua administração pertença aos municípios ou ao Estado” (RN 2). Não se pense, contudo, que a defesa contundente da propriedade privada é a defesa do liberalismo económico vigente da época. Pelo contrário, Leão XII defende a propriedade privada na óptica do trabalhador, visto que “o fim imediato visado pelo trabalhador [ao trabalhar] é conquistar um bem que possuirá como seu” (RN 3).

Contra o “erro capital” de “crer que as duas classes [patrões / trabalhadores, ricos / pobres] são inimigas natas uma da outra”, o Papa parece embarcar numa visão fixista da sociedade ao invocar a imagem da complementaridade dos vários membros no corpo humano (RN 14), mas a seguir afirma principalmente as obrigações dos “ricos e patrões”. “Devem respeitar no operário a dignidade de homem (…). Devem ter em conta os interesses espirituais dos operários (…). Que o trabalhador tenha tempo para cumprir os seus deveres religiosos (…), não seja afastado da família. (…) Não tenha um trabalho superior às suas forças ou que não seja adaptado à sua idade ou sexo. (…) Receba um salário justo.” (RN 14).

A "Rerum Novarum" representou uma sistematização do pensamento social católico e foi positivamente acolhida por trabalhadores cristãos. Sem dúvida que fez despertar uma esquerda católica que veio mais tarde a constituir-se em socialismo cristão (com ou sem esse nome) e na democracia cristã.

Passados quarenta anos, Pio XI escreveu: “Deve atribuir-se à Encíclica Leonina o terem florescido tanto por toda a parte as associações operárias. Apesar de serem, infelizmente, ainda inferiores em número às dos socialistas e comunistas, agrupam notável multidão de sócios e podem defender energicamente os direitos e aspirações legítimas do operariado católico e propugnar os salutares princípios da sociedade cristã” (QA 36).

Há um sínodo?

O sínodo que está a decorrer em Roma é de uma probreza que nem franciscana é. Ou há lá coisas muito interessantes que não saem para fora ou ...