quinta-feira, 8 de março de 2012

Igreja e homossexuais. Polémica à volta do funeral do músico Lucio Dalla


Em Itália, por estes dias, há um grande debate sobre a Igreja e os homossexuais, devido ao funeral de Lucio Dalla (04-03-1943 – 01-03-2012), em Bolonha. Dalla era músico e reconhecido homossexual. Não conhecia o cantor. Dizem que os seus maiores êxitos foram “Caruso” e “Gesù bambino”, qualquer das canções desconhecida para mim. Mas estou a acompanhar a polémica.

O teólogo Vito Mancuso, amigo pessoal de Lucio Dalla tem a posição mais sensata. Vale a pena ler a entrevista publicada no “La Repubblica” de 07 de março.


''É um erro contrapor Igreja e gays. Também há homossexualidade dentro da Igreja''

Em vez do silêncio respeitoso pela morte, como consequência do funeral de Lucio Dalla, chega a balbúrdia da polêmica. De um lado, os gays, lembrando as procissões marianas desviadas para não passar em frente da sua sede em Porta Zaragoza, que acusam a Igreja bolonhesa de hipocrisia. De outro, o padre Bernardo Boschi, o confessor do artista, que rebate clamando vingança. No meio, a memória do cantor e compositor na qual muitos querem colocar um rótulo.

Vito Mancuso, teólogo e amigo de Dalla, que o hospedou no outono europeu em sua casa da Via D'Azeglio, foge das contraposições e dos jogos de facção: "Se não sairmos da lógica dos alinhamentos em grupos, nunca vamos conseguir. É um vício tipicamente italiano o de sempre tentar a contraposição, colocando-se de um lado, contra um outro, sem considerar a humanidade individual. É preciso rejeitar esse jogo", explica.

A seu ver, é justificada a acusação de hipocrisia lançada contra a Igreja?
Antes, interroguemo-nos sobre o que é a Igreja. Eu acho que são muitas coisas. É o arcebispo Carlo Caffarra que não se apresenta, mas também Enzo Bianchi, que parte do profundo Piemonte e desce até Bolonha para saudar seu amigo. A Igreja também é os franciscanos que estiveram presentes com uma mensagem do seu máximo representante e com dois padre vindos de Assis.

Estamos falando da Igreja bolonhesa. Do Pe. Boschi que autoriza implicitamente a pensar em alinhamentos quando se fala de vingança do mundo gay...
E, a meu ver, fez mal. Eu jamais teria dito essas palavras, porque, desse modo, se comete o mesmo erro de quem busca a contraposição. E, além disso, o mundo gay se diz de muitos modos. Uma coisa são as acusações contra Dalla de Aldo Busi, outra coisa é a proximidade de Benedetto Zacchiroli. Rejeito toda instrumentalização dos casos humanos para levar adiante a própria batalha. Considero tudo isso um modo violento de estar no mundo. Seguindo essa linha, jamais encontraremos os outros.

Portanto, houve uma instrumentalização até nesse caso?
Dalla, na sua singularidade, subverteu todos os alinhamentos, porque nunca aceitou se apresentar ao mundo reduzindo-se totalmente à sexualidade. Por isso, fez explodir a lógica daqueles que não pensam no indivíduo, mas sim na facção ou no lobby.

Como você considera a ausência de Caffarra?
Estou em Bolonha há pouco e encontrei o cardeal em uma ocasião, tendo ficado impressionado com a sua humanidade. Mas, justamente por causa dessa humanidade, esperava a sua presença em San Petronio para saudar um grande filho de Bolonha e um fiel como Dalla. Mas não conheço a sua agenda, e a sua ausência certamente será justificada. Digo apenas que teria sido bonito se estivesse estado presente o sumo pastor da Igreja bolonhesa.

O desdobramento da celebração também criou alguma polêmica. Em particular, aquela advertência ao correto comportamento antes da Eucaristia. O que você pensa a respeito?
Isso me irritou muito, porque eu considero uma traição doutrinal. Não é verdade que não se pode comungar na presença de pecado. Se a sua consciência sente sinceramente que você pode fazê-lo, jurando a si mesma que irá se confessar em um segundo tempo, a participação na Eucaristia é possível. Até porque a proibição fecha o sopro da graça. Além do mais, não se entenderia por que Jesus estigmatizava os fariseus que se consideravam motu proprio dignos da Comunhão. Somos todos indignos diante da pureza de Deus, e quem se considera digno é, ele mesmo, indigno. Com relação ao resto, o rito foi positivo em geral.

Você não acha que, em geral, há uma ambiguidade na atitude da Igreja com relação à homossexualidade?
Uma certa incoerência sempre está presente, dependendo se prevalece o aspecto ético-doutrinário ou a consideração humana. No fim, são as decisões dos indivíduos que determinam. A Mario Cal, suicida, ou a Versace, homossexual, não foram negadas as exéquias.

A Piero Welby sim...
Essa foi uma decisão do cardeal Camillo Ruini de sabor político. O cardeal Martini jamais faria tal ato. Mas voltemos ao início: são os indivíduos que decidem, dependendo se olharmos para a doutrina ou para o humano. O pluralismo é a característica e a beleza do Cristianismo, e, não por acaso, a Bíblia é um corpus de 73 livros. Os Evangelhos também são quatro e às vezes em contradição.

Um gay declarado, sem a fama de Dalla, teria sido aceito na Igreja?
Eu acredito que sim. A Igreja não condena a homossexualidade como tal, mas sim os comportamentos ativos nesse sentido. Além disso, a homossexualidade também é interna à Igreja, visto que há párocos e bispos que têm essa orientação.

Vito Mancuso

Copiei a entrevista daqui. No final há mais links para outros textos, incluindo um artigo de Enzo Bianchi.

16 comentários:

João Silveira disse...

Em relação à comunhão em pecado mortal está aqui tudo explicado: http://www.youtube.com/watch?v=ZJOS97r_Gt4

Chamar 'orientação' à atracção por pessoas do mesmo sexo, é um engano. Essa atracção é profundamente desordenada, daí que todos os seminaristas que sofram dessa desordem devem ser convidados a sair do seminário.

Anónimo disse...

Que idade tem, João ? Ou antes, em que século vive ? Que mal lhe fizeram para pensar assim ?

Anónimo disse...

Quanto à sua primeira frase, João, muito bem! A verdade não está com modas ou "séculos"! Discordo, porém, de tudo o mais.

Por outro lado, chamar de ´"teólogo" a Vito Mancuso é uma ironia ridícula.

Fernando

HD disse...

É uma tempestade num copo de água, estimulada tanto por ateus gays, como pela forma inadequada como alguns sectores conservadores da Igreja Católica respondem, qual elefante dentro de uma loja de porcelanas…
Bater na Igreja está na moda e há partes dela, que se colocam a jeito.
Tudo aconteceu de forma simples. Durante as exéquias fúnebres, o elogio feito em oração final, pelo companheiro do referido cantor.
Foi escândalo para uns, afirmação para outros.
Houve um homem crente que morreu, …..e houve um gesto emocionado e simples, de despedida de quem o amava.
A maioria do Clero presente teve a sabedoria, para agir sem discriminar , tal como Jesus o faria.
O resto, é terrorismo verbal de parte a parte, com alguns pelo meio a tentarem colocar água na fervura.
Mas o que conta, é o que Jesus faria.
Essa, é que é a Verdade.

HDias

Jorge Pires Ferreira disse...

Caro João. Perdi 13 minutos a ver o vídeo. Já conhecia o sr. padre de outros vídeos. Nada contra. Terá os seus fiéis. Pouco a favor. E explico porquê.Em 13 minutos, quantas vezes falou do Direito Canónico? Muitas. Perdi-me na contagem. E do Catecismo? Outras tantas. E de Trento? Mais uma série delas. E de Jesus, que é o autor da comunhão e comia com pecadores? Zero. E dos Evangelhos? Zero. E da misericórdia? Zero. Já para não falar do Vaticano II, que, para ele, com certeza que nunca deveria ter acontecido. Se está lá tudo explicado, está tudo muito mal explicado.

João Silveira disse...

Mas o Jorge é que faz o antagonismo, como se fossem coisas diferentes, e até opostas. Parece aqueles que não rezam a Nossa Senhora, porque o que interessa é Jesus...como se uma coisa não conduzisse à outra.

Se Jesus lhe aparece em sonhos a dizer como deve comungar acho óptimo, que grande graça. Não sou desses eleitos, tenho de confiar no que a Igreja, criada por Ele, me diz.

Anónimo disse...

Esse Padre deixa um lastro de inferno por onde passa!

Chamou de "otários" em público aos evangelicos !

Que conseguiu colocar a maioria do clero da diocese contra ele,pela sua atutude mesquinha de que ele é que santo !

Que o proprio Bispo já não o suporta com tanta falta de bom senso?

Por utilizar a TV Canção Nova, para os seus ataques viscerais?

È só ver a Carta que inumeros padres subcreveram contra ele http://beinbetter.files.wordpress.com/2012/03/carta-aberta-dos-anti-padrepaulo.pdf

Jorge Pires Ferreira disse...

Caro João, O sr. é um espetáculo. Também se aprende a ler os seus argumentos, com o seu modo de argumentar. Se eu digo que não coisas iguais, Evangelho e Lei (seja de Trento ou do Código), que o Evangelho está ausente da argumentação, logo o sr. diz que eu penso que são antagónicas (e por vezes até são, mas eu não o disse), contraditórias. Mas dizer que uma coisa é mais importante do que outra não quer dizer que se excluam. É uma questão de hierarquias. O Evangelho interessa mais do que o Código. Ou duvida disso?
Falar da Comunhão com Jesus - é disso que se trata - sem falar de Jesus... Só revela por onde anda a nossa mente quando invocamos razões. A do sr.padre do vídeo anda por Trentos e Direitos Canónicos. É muito pouco.
Por outro lado, há pelo menos uma "coisa" humana que está acima da Igreja, a consciência. É do Vaticano II. Não me venha dizer que as oponho. E, como sabe, a Igreja não proíbe que se desconfie dela. Ela mesmo diz dela própria que também é pecadora. O sr., como eu, porque estamos dentro, sabe que os pecados da Igreja são muito mais do que os afirmados pelos que estão fora. Eles é que ignoram muito.

Anónimo disse...

Ponham 1000 animais num campo da bola e vejamos quantos são larilas. Querem mais evidências do que estas. Contra natura. Venham cá com argumentos que quiserem. Se fosse Jesus perdoava mas certamente dava umas receitazitas aos larilas

Anónimo disse...

João, João, porque me persegues?

João Silveira disse...

Amigo Jorge, eu também vou aprendendo a ler os seus posts. Acho perfeitamente normal que alguém que lê tantos artigos do Frei Bento Domingues, Pe.Anselmo Borges, e outros que tal, viva nessa divisão, nesse preconceito da Sagrada Escritura contra o Catecismo.

Mas essa visão é um engano, amigo Jorge. Se a Igreja se enganou no catecismo e no direito canónico, porque é pecadora, porque será infalível na escolha do canon? Tentar ler a Escritura fora da Tradição leva ao engano. A Escritura apareceu e foi escolhida na Tradição.

Acho que o Jorge tem uma visão romântica do Evangelho, como se tivesse descido directamente do Céu, desligado de tudo o que se passava na Terra. Essa é uma visão muito infantil, devemos agradecer todos os dias a Nosso Senhor ter criado a Igreja, só assim podemos ter certeza na nossa fé.

Por outro lado, essa visão do espírito do concílio também está mais do que acabada. Há um tempo atrás, o Frei Bento e os amigos do Nós Somos Igreja, decidiram organizar no convento de S.Domingos um dia de conferências sobre o Vaticano II. Resolvi aparecer lá com uns amigos meus, e foi impressionante ver que eramos os únicos jovens. O resto era um grupo de velhos ressabiado a mal-dizer a Igreja a torto e a direito, e que o Vaticano II tinha que ser posto em prática. Mas quando lhes fizemos perguntas, baseados em textos do Concílio, rapidamente mudaram de assunto. Isto porque o Concílio não diz nada do que eles dizem, mas continuam a viver nesse espírito da ilusão. Essa geração está a desaparecer. Não porque lhes tenhamos rogado pragas, mas porque a idade não perdoa, e esse pensamento antiquado já tem hoje pouca expressão.

Tenho pena que o Jorge, sendo um jovem, também alimente essa mentalidade velha e ultrapassada.

Anónimo disse...

Para João "o discipulo amado" Silveira, a propóssito do seu "piedoso" relato de conferência
sobre o Concílio Vaticano II, a que assistiu com outros jovens, padecendo a extrema velhice (a velhice, para si, será pecado ?) dos conferencistas :
Jovens, caro João Amado Silveira, eram também os apoiantes de Hitler...

Jorge Pires Ferreira disse...

Ó João. Eu gosto das suas provocações. Por exemplo, se me fala da Sagrada Escritura, não lhe respondo tudo quanto poderia para não parecer imodesto. Mas sei, por exemplo, que o discípulo amado não era João, como já lhe disse. Qualquer bom dicionário bíblico lhe explica isso, mesmo que o catecismo ou Bento XVI digam que é mesmo o João apóstolo.

Mas se me chama jovem, recuso porque já não o sou.

É pena não poder agora responder-lhe como merece. Neste tempo em que há mais monólogos paralelos do que diálogos, falar com alguém, mesmo discordante, é uma bênção.

Infelizmente, o meu blogue é só a quinta ou sexta ocupação. Uma coisa que se faz de intervalos de outras mais importantes - ou pelo menos as que pagam as contas.

Já agora, diga-me, há alguém do CL a escrever semanalmente na grande imprensa sobre temáticas cristãs? Se houver, diga-me. Estou disposto a ler e reproduzir no meu blogue. Se não houver, é capaz de me dizer porque não há?

João Silveira disse...

Amigo Jorge, um dia havemos de combinar um café aí algures, prometo ir desarmado.

Em relação a textos do CL realmente nos jornais portugueses não abundam. Existem as pequenas crónicas da Aura Miguel na rádio renascença, e parece-me que mais nada. A nível internacional, tem aqui textos interessantes: http://www.30giorni.it/index_l6.htm.

Mas não acho especialmente importante se a pessoa é do CL, do LC ou do XPTO, importa-me mais que sejam fiéis à Igreja. Que não escrevam como simples má-língua, que não falem como se a Igreja tivesse começado há 50 anos, e mesmo assim está toda errada, e que não escrevam do alto das suas cátedras, para criticar a cátedra legítima de Pedro. Os textos do Frei Bento e do Pe.Anselmo, quase sempre, acusam os outros de soberba com palavras soberbas. Ora, entre a Igreja e esses dois senhores, escolho a Igreja sem sequer pestanejar.

Jorge Pires Ferreira disse...

Caro João, conheço a revista 30giorni, já várias vezes citada neste blogue.

O pensamento de Aura Miguel não cria pontes para a cultura contemporânea (de certo que há.de encontrar nesta frase algo para me contradizer). Aprecio a senhora, com que já tive oportunidade de falar algumas vezes, mas não a vejo a abordar assuntos que Bento e Anselmo abordam. Quais? A situação do ser humano no mundo actual, o pensamento filosófico e artístico, a economia (assunto em que, provavelmente, me sinto mais próximo de Aura do que de Bento e Anselmo), a política, a doutrina social, enfim, tudo o que tem a ver com a vida em sociedade.

Por outro lado, não sei a que igreja o sr pertence, mas estou certo de que Bento e Anselmo são católicos. Profundamente católicos, mesmo. Ainda que certamente (e posso falar mais porque um, de quem sou amigo e com quem já tenho falado da nossa fé católica comum, do que pelo outro, com quem só me cruzei algumas vezes) procurem mais ser cristãos. Católico é só adjectivo.

João Silveira disse...

Amigo Jorge, como lhe disse os artigos não Aura Miguel são pequenas crónicas. Só falei nela porque me perguntou por pessoas do CL, e eu artigos do CL só leio na Passos (em italiano Tracce), e leio sempre em papel.

Quanto ao cristianismo do Pe.Anselmo e do Frei Bento não duvido nem durante um minuto. Mas cristãos há muitos, desde os evangélicos à IURD, passando pelos Adventistas. Eu cá para mim prefiro o original, não gosto de fotocópias mal tiradas.

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