terça-feira, 31 de maio de 2011

Quando a minha igreja não é verdadeira igreja não é igreja sequer?


Slavoj Zizek é um neocomunista ou neomarxista ou neo qualquer coisa destas, que aqui há dois anos andei ler por causa do que dizia do cristianismo e de São Paulo (alguns ecos aqui). É também um neo-sofista que passa incólume às provocações diárias que lança. Não percebo como é que se aguenta com o que diz de Hitler. Talvez porque sendo de esquerda tem à partida a superioridade moral que é negada a outros. Ele reconhece “muitos problemas” por causa do que disse, mas julgo que não deixou de ensinar nas universidades nem de ser convidado para palestras (veja-se o que aconteceu a Lars von Trier):
Hitler "não foi violento o bastante nesse sentido autêntico, revolucionário, em que a violência significa transformação das relações sociais, e não tortura ou assassinato. Hitler matou milhões de judeus em nome da manutenção do sistema. O que estou dizendo é que não quero dar a Hitlersequer esse crédito, na linha “ele foi um criminoso, mas era um líder corajoso”. Não, ele não era. Nesse sentido, Mahatma Gandhi foi mais violento do que Hitler. Gandhi é sem dúvida um modelo de paz, mas nesse sentido básico ele foi violento, organizou protestos de massa com o objetivo de impedir o funcionamento do Estado colonial inglês na Índia. Isso é algo que Hitler nunca ousou fazer.
Mas ao ler a entrevista que no sábado, 28, saiu n’“O Globo” (aqui), encontrei um bom excerto para pensar nas mais lamentáveis páginas da história cristã. Também eu já me vi a justificar: “Não, isso não é o verdadeiro cristianismo”. Com as seguintes palavras de Zizek, mutatis mutandis, tenho hoje um bom motivo para pensar se na defesa da Igreja também não seremos (serei) sofistas inveterados. Mas não há que temer o pretenso totalitarismo da verdade.
Detesto os marxistas que dizem: “Stalin traiu o verdadeiro espírito do marxismo”. Não, não se pode permitir que isso seja dito. Se as coisas deram tão terrivelmente errado com Stalin, isso significa que havia uma falha estrutural no próprio edifício de Marx. Não acredito nessa baboseira do tipo “a ideia era boa mas infelizmente foi mal realizada”. Aqui eu sou freudiano. O resultado da ideia é como um sintoma, que aponta para algo errado na ideia. Não acho que os liberais de hoje consigam admitir isso. Por exemplo, tive um debate na França com Guy Sorman, um defensor radical do capitalismo e ele dizia: “capitalismo significa justiça e democracia”. Então eu perguntei, “mas e a China hoje?”, e ele respondeu “Ah, mas isso não é capitalismo”. Isso é um pouco fácil demais. Quando você tem um capitalismo que não se encaixa no seu ideal, você diz “não, não, não é disso que se trata”. É como a piada contada por Lacan, “meu noivo nunca está atrasado pois no momento em que se atrasa ele deixa de ser meu noivo”. Claro que você pode dizer, “o comunismo é sempre democrático pois no momento em que não é democrático ele deixa de ser comunismo”. Ok, mas isso é fácil demais.

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