No dia 14 de Maio, São José Almeida escreveu no “Público” uma opinião sobre o programa de intervenção na economia portuguesa elaborado pela troika. Deu-lhe o título de “A Contra-Reforma” e usou diversas expressões de origem religiosa para falar do assunto.
Sendo a troika constituída por representantes de três instituições (FMI, BCE e CE), só faltou falar em trindade.
Vejamos as frases e expressões com linguagem de inspiração religiosa (os negritos são meus):
- “O documento da troika surge assim como uma espécie de Missal do Novo Catecismo da Contra-Reforma, imposto por um novo Concílio de Trento que instalou a sua doutrina na Europa. E nele surge uma visão salvífica e redentora, que ignora a degradação social que provoca, e que se apresenta como um novo dogmatismo que promete trazer um paraíso de leite e mel ou ser uma espécie de novo sol na terra”;
- [documento apresenta-se como] "verdade absoluta";
- “Não sendo demonstrável a capacidade salvífica do documento da troika…”;
- “Será que contém alguma solução milagrosa para o desenvolvimento económico que tenha resultado na Grécia?”;
- "Contra isso [tensão e revolta social] o Missal da troika não apresenta ainda milagre".
Mais para o final a jornalista, que já em diversos textos mostrou que é ateia ou pelo menos agnóstica, volta a falar do enigmático “Missal do Novo Catecismo desta Contra-Reforma”. Digo enigmático porque não existe nenhum “Missal do Novo Catecismo”. O que existe é o Catecismo de Pio V, preparado pelo Concílio de Trento (1545-1563) e publicado por Pio V em 1566, e o Missal Romano, publicado pelo mesmo Papa em 1570. Mas são coisas diferentes. A jornalista devia ser mais cuidadosa. Devia ter mais trento na língua.
1 comentário:
Partilho da sua análise. Mas não deixa de ser curioso anotar o seguinte: o religioso acaba por ser uma linguagem em que qualquer conteúdo se expressa.
Enviar um comentário