terça-feira, 25 de janeiro de 2011

25 de Janeiro de 2006. É publicada a primeira encíclica de Bento XVI


Assinada por Bento XVI no dia 25 de Dezembro de 2005, a encíclica “Deus caritas est” (“Deus é amor”) é publicada no dia 25 de Janeiro de 2006, dia litúrgico da conversão de São Paulo.

Se me é permitido escolher uma afirmação-chave da encíclica, escolho a seguinte:
Na realidade, eros e agape — amor ascendente e amor descendente — nunca se deixam separar completamente um do outro. Quanto mais os dois encontrarem a justa unidade, embora em distintas dimensões, na única realidade do amor, tanto mais se realiza a verdadeira natureza do amor em geral (do n.º 7).
Nunca se tinha visto um Papa falar do amor eros. Isto não é uma mudança, é uma revolução. Parecia abrir as portas para quase tudo, a começar por uma nova compreensão da sexualidade pela Igreja católica. As consequências ainda estão por tirar. Mas nunca mais se voltou a falar disso. Talvez o Papa se tenha arrependido.

3 comentários:

Anónimo disse...

Arrependido de quê???

Jorge Pires Ferreira disse...

Arrependido de ter falado do eros. O termo aparece 39 vezes no documento papal. Mas não sei se Bento XVI voltou a usá-lo nas suas intervenções. Julgo que não. Ou talvez sim, mas eu é que não conheço, apesar de estar mais ou menos a par das intervenções papais. Não é estranho? Não foram poucas as pessoas que se sentiram incomodadas com a primeira parte da encíclica. E hoje quando se fala ou cita a "Deus caritas est", prefere-se a segunda parte, que fala da prática da caridade, da Igreja e do Estado, de alguns bons exemplos da história da Igreja. A primeira parte, eclesialmente, é como se não existisse.

Anónimo disse...

Quando o cristianismo apareceu no âmbito do mundo, o amor havia tido já diversos cantores. O mais ilustre tinha sido Platão, que havia escrito sobre ele um tratado inteiro. O nome comum do amor era então Eros (daí os termos atuais erótico e erotismo). O cristianismo percebeu que esse amor passional de busca e de desejo não bastava para expressar a novidade do conceito bíblico. Por isso evitou completamente o termo Eros e o substituiu com o de ágape, que se deveria traduzir por dileção ou caridade, se este termo não tivesse sido adquirido já um sentido demasiado restringido (fazer caridade, obras de caridade).

A diferença principal entre os dois amores é esta. O amor de desejo, o erótico, é exclusivo; ele se consuma entre duas pessoas; a intromissão de uma terceira pessoa significaria seu final, a traição. Às vezes, até a chegada de um filho pode pôr em crise esse tipo de amor. O amor de doação, o ágape, pelo contrário, abraça todos, não pode excluir ninguém, nem sequer o inimigo. A fórmula clássica do primeiro amor é a que ouvimos nos lábios de Violeta na Traviata de Verdi: «Ama-me Alfredo, ama-me quanto eu te amo». A fórmula clássica da caridade é aquela de Jesus, que diz: «Como eu vos amei, amai-vos uns aos outros». Esse é um amor feito para circular, para expandir-se. Outra diferença é esta. O amor erótico, na forma mais típica, que é o enamoramento, por sua natureza, não dura muito tempo, ou dura só mudando de objeto, isto é, enamorando-se sucessivamente de várias pessoas. Da caridade, São Paulo diz, ao contrário, que «permanece», ainda mais, é o único que permanece eternamente, inclusive depois de que tenham cessado a fé e a esperança.

Entre os dois amores, contudo, -- o de busca e o de doação -- não existe separação clara nem contraposição, mas desenvolvimento, crescimento. O primeiro, o Eros, é para nós o ponto de partida; o segundo, a caridade, o ponto de chegada. Entre ambos existe todo o espaço para uma educação ao amor e um crescimento nele. Tomemos o caso mais comum, que é o amor de casal. No amor entre esposos, no princípio prevalecerá o Eros, a atração, o desejo recíproco, a conquista do outro e, portanto, um certo egoísmo. Se esse amor não se esforça por enriquecer-se , pouco a pouco, de uma dimensão nova, feita de gratidão, de ternura recíproca, de capacidade de esquecer-se pelo outro e de projetar-se nos filhos, todos sabemos como acabará.

A mensagem de Paulo é de grande atualidade. O mundo do espetáculo e da publicidade parece hoje empenhado em incutir nos jovens que o amor se reduz ao Eros, e o eros ao sexo. Que a vida é um idílio contínuo em um mundo onde tudo é belo, jovem, saudável; onde não existe velhice, doença, e todos podem gastar o quanto quiserem. Mas esta é uma colossal falsidade que gera expectativas desproporcionadas, que desilude, provocando frustrações, rebelião contra a família e a sociedade, e abre com freqüência a porta ao delito. A Palavra de Deus nos ajuda a que não se apague totalmente nas pessoas o sentido crítico frente ao que diariamente lhe é proposto.

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