José Ignacio González Faus é professor emérito da Faculdade de Teologia da Catalunha, autor, entre muitos outros títulos, de “La Humanidad Nova. Ensayo de Cristologia” (Ed. Sal Terrae, Santander). As declarações foram feitas numa entrevista ao jornal espanhol “Hoy”, no dia 5 de Outubro de 2010 (aqui).
Quem faz mais ateus?
Disse uma vez que a cúria romana fez mais ateus que Marx, Freud e Nietzsche juntos. O que não dá para negar é que muitos homens se afastam dela e, mesmo que mais tarde se sintam vazios e queiram preencher esse vazio, se dão conta de que têm que procurar fora da Igreja. Diante disso, não parece que a Instituição procure aproximar-se. Os pontos fracos da Igreja actual são muitos, e eu disse já disse várias vezes é a cruz da minha fé, mesmo que procure carregá-la com elegância. Vejo que ela é incapaz de compreender o positivo do mundo moderno e os seus dirigentes desejam poder solucionar os problemas com base no poder.
Democracia
Não me parece evangélico que o Papa seja chefe de Estado, nem o modo de nomear a dedo os bispos nem os “príncipes da Igreja”. Quando não havia democracia, eram eleitos democraticamente a partir das comunidades locais.
Mulher
É inegável que a mulher não ocupa na Igreja o lugar que merece.
O que há a mudar
Não é uma questão de receitas. A Igreja tem que mudar muitas coisas. Devia começar por reconhecer que está em crise. Na qual todos temos um pouco de culpa. A partir daí teria que ver como e por onde se pode caminhar. Começando por não excluir como hereges aqueles que pensam diferente.
Linguagem antiga
Algo simples por onde se poderia começar é a linguagem. Não se podem manter as palavras antiquadas da liturgia. Não se entendem ou suscitam imagens contrárias ao que na sua origem se queria expressar.
Por que devemos criticar a Igreja
Ratzinger tem um artigo já clássico no qual diz que se hoje não se critica tanto a Igreja como na Idade Média, não é porque se a ame menos, mas porque falta esse amor que é capaz de arriscar a própria sorte ou a própria carreira pela amada [parte desse artigo foi aqui citada]. E eu tenho um livro sobre a liberdade da palavra na Igreja que é só uma antologia de textos de santos, bispos e cardeais, alguns muito mais duros do que as coisas que se dizem hoje. Também é normal que as autoridades não gostem disso e que de vez em quando te dêem com algum pau ou chamem à atenção “de cima”. E o que sinto é que isso não é feito directamente para mim. Quem tem que arcar com as críticas é o meu provincial, o que não está certo. Bom, não há parto sem dor. E como disse Santa Teresa, a verdade padece, mas não perece.
Newman foi incómodo no seu tempo
Creio que o balanço da visita do Papa não é mau. A experiência foi positiva. A beatificação de John Henry Newman parece-me significativa. Uniu muito a Igreja, apesar de ter sido um homem crítico que incomodou tanto a direita católica como muitos anglicanos. Quando se converteu não sentia nenhuma simpatia pela Igreja católica, mas o estudo da história fê-lo ver que a continuidade com as origens estava em Roma.
Diálogo inter-religioso
A convivência, o afecto e a colaboração entre religiões é um imperativo. E na palavra religiões incluo agora também o ateísmo. Os poderes públicos devem ser neutros e buscar a convivência. Em alguns lugares, como na Catalunha, há muitas iniciativas bem positivas. É preciso buscar o encontro naquilo que nos une como humanos. Devemos buscar no outro a melhor versão de sua personalidade, que é o que Deus pede a todos.
Drogados pelo consumo
Deixamos passar uma grande oportunidade para mudar os elementos injustos e irracionais de nosso sistema económico. Esta crise serviu apenas para ajudar aqueles que a provocaram, mas não as verdadeiras vítimas. Todos fomos cúmplices do sistema, drogados como estamos pelo consumo. Isto foi um passo a mais rumo ao desmantelamento do Estado de bem-estar social. A culpa é em parte da esquerda, que participou desse “socialismo assistencial” da partilha de subvenções, em vez de se ocupar em fazer justiça social.
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