1. O livro de Jonas, na Bíblia, enquadra-se no chamado género literário midráshico, portanto, sem pretensão de narrar acontecimentos históricos, mas com intenção didáctica. No caso, essa intenção é a superação do particularismo da salvação e a proclamação do amor e misericórdia universal de Deus. Ficou no imaginário popular e artístico sobretudo por causa dos três dias e três noites que Jonas passou no ventre de um peixe.
Jonas começou por não querer cumprir a ordem de Deus, que o enviou a Nínive: "Levanta-te, vai a Nínive, a grande cidade, e anuncia-lhe que a sua maldade subiu até à minha presença". Mas, depois de o peixe o ter vomitado em terra firme, Jonas foi, entrou na cidade e andou um dia inteiro a apregoar: "Dentro de quarenta dias Nínive será destruída". Ora, diz a Bíblia, "os habitantes de Nínive acreditaram em Deus, ordenaram um jejum e vestiram-se de saco, do maior ao menor. A notícia chegou ao conhecimento do rei de Nínive; ele levantou-se do seu trono, tirou o seu manto, cobriu-se de saco e sentou-se sobre a cinza". E publicou um decreto para que "cada um se convertesse do seu mau caminho e da violência que há nas suas mãos".
Então, "Deus viu as suas obras, como se convertiam do seu mau caminho, e, arrependendo-se do mal que tinha resolvido fazer-lhes, não lho fez". Aí, Jonas sentiu-se atraiçoado, pois a sua profecia não se cumpria. Andara a fazer o quê? "Ficou profundamente aborrecido com isto e, muito irritado, pediu ao Senhor: 'Peço-te que me mates, porque é melhor para mim a morte que a vida'".
2. Cassandra, a bela filha de Príamo, rei de Tróia, recusou os amores de Apolo, que, por isso, lhe impôs um castigo terrível: mesmo sabendo e proclamando a verdade, ninguém acreditaria nela. Assim - profetisa inútil -, foi em vão que previu a desgraça que ia cair sobre a sua cidade bem como as suas próprias amargas desventuras. Assistiu impotente à guerra e à ruína de Tróia e, conhecendo a sua própria desgraça, nada pôde fazer para evitá-la: acabou por ser violada por um guerreiro brutal, Ájax, foi entregue como escrava ao chefe inimigo, Agamémnon, e morta pela vingança de Clitemnestra. O seu destino foi patético e trágico.
O famoso filósofo Ernst Bloch juntou as duas figuras, para mostrar como a Bíblia se encontra sob o desígnio da liberdade - a profecia de Jonas não se cumpriu, porque é sempre possível arrepiar caminho e mudar -, enquanto o universo grego clássico é comandado pela fatalidade do destino.
O resto, sobre a actualidade portuguesa, pode se lido aqui.
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