O Papa pediu aos cardeais, novos e velhos, que evitem “intrigas, maledicência, fações, favoritismos, preferências”. Li aqui.
Com certeza não falou por falar. A linguagem dos mais altos responsáveis da
Igreja deve ser a do Evangelho, disse Francisco. Na realidade, isso vale para
qualquer cristão. Em Roma ou na Romelha de Baixo.
Temo, porém, que o Papa esteja a contribuir para a destruição de um forte
argumento para acreditar na Igreja Católica: o da pecaminosidade dos seus
membros.
Duas histórias vão contra Francisco. A primeira, vem daqui. Durante
as convulsões napoleónicas, queixam-se ao cardeal Consalvi que “Napoleão quer
destruir a Igreja”. E o cardeal responde: “Isso nem sequer nós fomos capazes de
fazer”.
A outra tem mais uns séculos. Vem no “Decameron”, de
Boccaccio (séc. XIV). Tento resumir.
O mercador Giannotto di Civigni, cristão,
quer convencer o seu colega Abraão, judeu, a converter-se ao cristianismo.
Depois de muita catequização, Abraão dispõe-se a aceitar a nova fé, mas precisa
de ir a Roma observar “a vida e os costumes” do vigário de Deus na Terra e dos
seus irmãos cardeais. Giannotto bem tenta convencê-lo a não sair de Paris, onde
há muita gente sábia, mas Abraão não cede. E vai mesmo a Roma.
Quando regressa, o judeu vai ter com Giannotto, que perdera toda a esperança de ver o seu amigo batizado. Abraão conta o que viu em Roma: “Nenhuma santidade, nenhuma devoção, nenhuma boa obra, nenhum exemplo de vida”, e segue-se uma descrição dos pecados (aqui não há espaço!) para mostrar que Roma era uma “oficina de diabólicas operações mais do que divinas”. Por fim, revela o seu veredicto: se aqueles que deveriam ser o “sustentáculo” da religião tudo fazem para a “reduzir a nada” e mesmo assim ela se dilata, “radiosa”, é porque é a “verdadeira e mais santa” e “tem no Espírito Santo fundamento e sustentáculo”. E o judeu recebe o batismo na Notre-Dame de Paris.
Quando regressa, o judeu vai ter com Giannotto, que perdera toda a esperança de ver o seu amigo batizado. Abraão conta o que viu em Roma: “Nenhuma santidade, nenhuma devoção, nenhuma boa obra, nenhum exemplo de vida”, e segue-se uma descrição dos pecados (aqui não há espaço!) para mostrar que Roma era uma “oficina de diabólicas operações mais do que divinas”. Por fim, revela o seu veredicto: se aqueles que deveriam ser o “sustentáculo” da religião tudo fazem para a “reduzir a nada” e mesmo assim ela se dilata, “radiosa”, é porque é a “verdadeira e mais santa” e “tem no Espírito Santo fundamento e sustentáculo”. E o judeu recebe o batismo na Notre-Dame de Paris.
Claro que, na linha se Francisco, a nossa conclusão será
outra. Se mesmo com pessoas de maus hábitos a Igreja é boa, como não seria se
todos cultivassem as atitudes evangélicas.
5 comentários:
“intrigas, maledicência, fações, favoritismos, preferências”... auch... as orelhas de frei Bento Domingues devem estar a arder.
Frei Bento é cardeal?
Boa pergunta!
Quem não quer ver as evidências, pergunta disparates. É como aplaudir um texto de um velhaco que comenta o que "não veio a público" (ou seja, faz ficção científica).
O Papa falava dos cardeais e para os cardeais. Não falava para os bispos portugueses nem para frei Bento Domingues. Em todo o caso, todos temos vantagens em seguir os conselhos do Papa. "Intrigas, maledicência, fações, favoritismos, preferências" não é exclusivo de ninguém. Todos praticamos isso. Inclusive muitos dos que anonimamente por cá vão comentando. Nem todos. Mas alguns.
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