quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Livros (3): Descobrimentos como cruzadas, uma tese nova com séculos de existência



O livro sobre “Vasco da Gama para estrangeiros”, como alguém escreveu, de Nigel Cliff, diz que a aventura dos descobrimentos foi uma cruzada, uma guerra santa contra os muçulmanos.

O livro intitula-se “Guerra Santa” e em antetítulo tem na capa: “As viagens épicas de Vasco da Gama e o ponto de viragem em séculos de confrontos entre civilizações”.

A tese da guerra santa nos descobrimentos tem sido recebida com alguma surpresa e como novidade onde o livro tem sido publicado. Mas, na realidade onde está a novidade? Talvez para ingleses e americanos. Pelo menos do ponto de vista português, não há surpresa nenhuma. Nos autos de Gil Vicente, autor coetâneo da expansão, os soldados mortos em combate contra os mouros vão diretamente para o céu, como em qualquer cruzada. E a ideia do encontro e aliança como reino cristão do Prestes João é isso mesmo, uma aliança contra o inimigo comum. As cruzes de Cristo nas caravelas são mesmo cruzes da cruzada. A cruz vai à frente.

Claro que, com as modas historiográficas - o positivismo, o marxismo, o estruturalismo… - as motivações económicas ou outras predominam na explicação dos factos. Mas o mundo dá tantas voltas que a explicação primeira acaba por vir a cima como se fosse novidade.

Por outro lado, o livro talvez contribua para acabar com um grande equívoco cultural. O feito de Vasco da Gama (1498) é incomparavelmente maior do que o de Colombo (1492), embora na mentalidade anglo-saxónica a descoberta da América esgote a epopeia das descobertas. Mas o que estava em disputa era chegar à Índia. E foi Gama quem lá chegou primeiro.

Com a ascensão da Índia e da China no campeonato das nações, é provável que o feito de Gama venha mesmo a sobrepor-se nas mentalidades ao de Colombo.

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