“Existem em Portugal três feriados mais do que a média da União Europeia, sem contar com os casos dessa curiosíssima prática que se chama «tolerância de ponto»”, escreve Vasco Pulido Valente, em mais um texto sobre o excesso de feriados no calendário português.
Mas antes do assunto em si, duas observações. Escreve a certa altura: “Mas neste ano da Era Comum (e não do Senhor) de 2010”. Não percebo por que é que ele, como outros, fala da Era Comum. Sei que quem usa a expressão pode ser ou não ser crente. Ainda há pouco vi um conhecidíssimo professor da católica, padre, usar a mesma expressão. Supõe-se que é para não ferir a sensibilidade de quem não é crente. Mas quando se fala de “Era Comum”, pergunto: Comum a quê? A quem? O que é que aconteceu para ser Comum? Quando é que começa a contagem? Se uma pessoa viesse de outro mundo e lhe disséssemos que estamos no ano 2010 da Era Comum, o que é que ela ficava a saber? Nada. Teríamos de explicar que há 2010 anos, mais coisa menos coisa, nasceu Jesus Cristo. Ainda não percebi para que é que serve esta espécie de eufemismo. Que se supõe religiosamente correcto.
A outra observação. Diz o cronista: “Chegamos mesmo ao cúmulo de parar tudo, a 15 de Agosto, por causa, salvo erro, da Ascensão da Virgem, quando nem 1 por cento dos portugueses poderia dizer de que Ascensão se trata”. Ora, Vasco Pulido Valente não está incluído nesses 1 por cento. É que a 15 de Agosto, celebra-se a Assunção da Virgem Maria. Ascensão, só a de Cristo (este ano celebrada a 16 de Maio, uma semana antes do Pentecostes; já foi celebrada na quinta-feira antes do domingo actual e nessa altura era feriado, como ainda é em alguns países). Terá sido brincadeira de VPV?
Sobre a discussão em si, concordo com o facto de haver demasiados feriados, sabendo que há séculos eram muitos mais. Nalgumas comunidades não se podia trabalhar em quase metade dos dias do calendário. E concordo que há pontes horríveis para quem tem de trabalhar com outras pessoas. Poderiam abolir-se todos os feriados religiosos e todos os civis e dizer: cada um tem um “pack” de, vá lá, 10 feriados que usa como quiser. Veria com alguma dificuldade a “abolição” do Natal. Mas essa seria, com certeza, uma ocasião para a maioria dos cidadãos gastar um dos dias do “pack”.
Claro que isto só significa que caminharíamos para uma sociedade sem referências colectivas. Por outro lado, os crentes de outras religiões teriam direito aos seus próprios feriados. E os monárquicos trabalhariam no 5 de Outubro (se bem que nesse feriado há um grande feito monárquico qualquer). E os adeptos do Estado Novo poderiam ir trabalhar alegremente no dia 25 como no dia 24 de Abril.
Sem comentários:
Enviar um comentário