Cartune do "Público" de hoje
O DN traz a seguinte afirmação, logo a abrir a peça, que me fez pensar que o Papa Francisco finalmente é claro sobre a existência do diabo:
O papa Francisco apelou hoje [24 de julho, ler online aqui] aos fiéis para não perderam a
esperança, afirmando que ainda que o diabo exista, Deus é o mais forte, e
colocando ainda o povo latino-americano sob a proteção da Virgem de Aparecida.
Só com esta afirmação, parecia-me claro que "diabo" deixava de ser uma representação simbólica do mal para poder ser uma força pessoal, um ser, como afirma a DTDD (doutrina tradicional do diabo e do demónio). E o DN prosseguia:
"Ainda que o diabo, o mal, exista, não é o mais forte, o mais forte é Deus", disse o papa Francisco durante a celebração da missa no Santuário de Aparecida, no interior de São Paulo, a cerca de 200 quilómetros do Rio de Janeiro.
Mas agora já temos uma dissonância em relação à DTDD, que alguns gostam tanto de ver refletida nas palavras de Francisco. De acordo com a frase, o diabo é o mal. Ou então: "mal" esclarece o que Francisco pensa que é o diabo, podendo nós presumir que não se trata do ser pessoal da DDTD, mas do mal cuja existência e efeitos todos notamos, sendo o diabo símbolo de todo o mal. Na realidade, segundo a DDTD, mal e diabo não se equivalem, não são intermutáveis. O diabo está ao serviço do mal, dedicado ao mal, mas não é o mal. Ora, na teologia franciscana, diabo e mal equivalem-se, bem na linha do que propõem alguns teólogos e exegetas: interpretar as referências bíblicas (principalmente neotestamentárias) ao diabo como sendo alusões ao mal (o demónio é outra coisa).
Mas o que disse mesmo Francisco? Vamos ver o que vem no sítio do Vaticano (texto na íntegra aqui):
A segunda leitura da Missa apresenta uma cena dramática: uma mulher – figura de Maria e da Igreja – sendo perseguida por um Dragão – o diabo - que quer lhe devorar o filho. A cena, porém, não é de morte, mas de vida, porque Deus intervém e coloca o filho a salvo (cfr. Ap 12,13a.15-16a). Quantas dificuldades na vida de cada um, no nosso povo, nas nossas comunidades, mas, por maiores que possam parecer, Deus nunca deixa que sejamos submergidos. Frente ao desânimo que poderia aparecer na vida, em quem trabalha na evangelização ou em quem se esforça por viver a fé como pai e mãe de família, quero dizer com força: Tenham sempre no coração esta certeza! Deus caminha a seu lado, nunca lhes deixa desamparados! Nunca percamos a esperança! Nunca deixemos que ela se apague nos nossos corações! O “dragão”, o mal, faz-se presente na nossa história, mas ele não é o mais forte. Deus é o mais forte, e Deus é a nossa esperança! É verdade que hoje, mais ou menos todas as pessoas, e também os nossos jovens, experimentam o fascínio de tantos ídolos que se colocam no lugar de Deus e parecem dar esperança: o dinheiro, o poder, o sucesso, o prazer. Frequentemente, uma sensação de solidão e de vazio entra no coração de muitos e conduz à busca de compensações, destes ídolos passageiros.
Parece-me claro que temos todos os elementos para
interpretar o diabo, "o dragão", como símbolo do mal e não como um
ser pessoal (anjo) dedicado a tentar-nos.