quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Oração para católicos frustrados


O jesuíta James Martin, que é autor de um guia jesuíta para quase tudo, "The jesuit guide to (almost) everything: A spirituality for real life" (ler algumas páginas aqui), de um livro sobre humor e cristianismo (ler introdução e primeiro capítulo, fracote, aqui) e de um outro sobre santos para tempos atuais (ver links aqui), escreveu uma oração para católicos frustados. A certa altura, diz:
Ajuda-me a ser pacífico quando as pessoas me dizem que eu não pertenço à Igreja, que eu sou um herege ao tentar fazer as coisas melhor, ou que eu não sou um bom católico. Eu sei que fui batizado. Tu me chamaste pelo nome para estar em tua Igreja, Deus. Enquanto eu respirar, ajuda-me a lembrar como as águas sagradas do batismo me acolheram em tua sagrada família de santos e pecadores. Que a voz que me chamou à tua Igreja seja o que eu ouço quando outras vozes me dizem que eu não sou bem-vindo na Igreja.
Rezar tudo aqui (texto em português e vídeo em inglês).

Episódio gay num romance impede que búlgaro seja embaixador no Vaticano?

Kiril Marichkov

O Vaticano vetou o diplomata búlgaro Kiril Marichkov, que também é jurista e escritor, para embaixador na Santa Sé. As razões para a nega não foram adiantadas, mas diz-se que se devem a um episódio de homossexualidade narrado no livro “Clandestinação” [desconheço o título original; traduzo o espanhol “Clandestinación”], de que o diplomata, casado e com filhos, é autor.

No livro, dedicado à mulher de Kiril, aos filhos e a Deus, um jovem do Leste da Europa prostitui-se com um homem num bairro periférico de Roma e depois vai a uma igreja pedir perdão a Deus.

Li a notícia aqui.

A serem verdade as presunções da imprensa, pesa mais na decisão um episódio de prostituição homossexual do que a denúncia do drama dos imigrantes de Leste. Ou será que o nome do diplomata (não sei como se pronuncia o apelido) causa engulhos – ou talvez risos - nos corredores latinos do Vaticano?

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Sentido e amparo

Não nego que a fé dá um «sentido e amparo» últimos. Mas é um sentido e amparo «provados e tentados», que não retiram ao crente partilhar a «fria escuridão do cosmos».

J. I. González Faus

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Anselmo Borges: O trabalho, o ócio, festas e férias


Texto de Anselmo Borges no DN de sábado passado (retirado daqui).

O negócio ocupou tudo e esqueceu o ócio, no sentido grego das palavras, como explica o filósofo Gabriel Amengual. Ócio (no grego scholê, no latim otium), em princípio, significa estar livre dos negócios políticos ou do Estado e do governo e de actividades económicas, que, na Antiguidade, se definiam como o não-ócio, o negócio (a-scholía), e implica a orientação para o âmbito do pensar e da contemplação. "Ter ócio" significava festejar, ter alegria e a ocupação própria do tempo descansado - debates, concertos, teatro, etc. -, passando depois a significar o lugar dessas actividades (a escola, scholê). "Ócio significa tempo livre, possibilidade, oportunidade de algo." Neste quadro, o ócio era, para Platão, o pressuposto para a filosofia, em conexão com a liberdade e a verdade. Num contexto de escravatura, era, pois, privilégio dos homens livres. Para superar a tirania e a escravidão, não é, portanto, do ócio para a liberdade e a verdade que precisamos?

Aristóteles mostra a relação entre ócio e negócio ou trabalho: "Somos activos a fim de ter ócio", o que significa que o ócio é de algum modo fim em si mesmo. No início da Modernidade, este primado começou a ser ultrapassado, segundo a ideia de que o saber já não é contemplativo, mas tem como finalidade o domínio da natureza, a utilidade e o poder. Com a segunda revolução industrial, o ócio ficou em conexão com o tempo livre e chegou-se ao paradoxo da "indústria do ócio", de tal modo que tudo se transforma em negócio.

Entre as muitas características do homem, está a de homo faber. Karl Marx escreveu que "o homem se diferencia dos animais a partir do momento em que começa a produzir os seus meios de vida". Referindo-se aos "traços distintivos" estritamente biológicos, como o bipedismo, a estrutura das mãos, com a oposição do polegar, a visão em campos abertos, etc., Eudal Carbonell afirma que "são o substrato biológico sobre o qual se apoiam as aquisições culturais que já são plenamente humanas: a produção de ferramentas, o domínio do fogo, a linguagem duplamente articulada, a arte, a religião...". Mas o que "motiva o seu aparecimento" é "a selecção técnica. Desde o princípio, os humanos adaptam-se porque fabricam ferramentas".

Enquanto o animal se acomoda ao que a natureza dá, o homem, em ordem à satisfação das suas necessidades, transforma-a. O trabalho consiste neste intercâmbio entre o ser humano e a natureza: acolhe a natureza, transforma-a e, nesta transformação, não só recolhe o que precisa para as suas necessidades como se transforma a si próprio, humanizando-se, ao realizar possibilidades.

Na medida em que forma a pessoa e configura as relações sociais, o trabalho, para lá de meio de sobrevivência e realização do indivíduo, adquire o sentido amplo de serviço à sociedade, tanto no trabalho manual, industrial, como no trabalho intelectual, espiritual. Por isso, o desemprego não é só desastroso por pôr em causa os meios de vida, mas também porque fere a dignidade pessoal e marginaliza, impedindo a identidade própria no contributo para a realização da sociedade.

O trabalho vive na ambiguidade, como tudo o que é humano. Assim, pode ser sentido como espaço da liberdade e da auto-realização, mas também da alienação. Não é por acaso que há o trabalho, de tripalium, um instrumento de castigo, e a obra, de érgon, enquanto criação - diz-se de um artista que realizou uma obra.

O ócio, a festa e as férias estão vinculados ao trabalho. O homem é homo laborans, faber e homo festivus. A festa tem originariamente sentido religioso, implicando a suspensão do tempo vulgar; o seu é outro tempo: o tempo originário, sagrado, quando os deuses criaram e puseram a ordem do mundo. As férias, do latim feriae (dies festus), dizem também a interrupção, mas mais longa, das actividades laborais: o homem não é besta de carga.

Uma visão integral do ser humano significa vê-lo na harmonia das suas múltiplas dimensões: "A sua dimensão laboral e cultural-cultural, social e pessoal, activa e contemplativa, produtiva e artística, a dimensão do dever e a do desejo, a determinação e a liberdade", o ter e o ser.

Eurodeputado cita Jeremias

Paulo Rangel dá à sua página de opinião de hoje, no "Público", o seguinte título:

"Jeremias 1,14: omne malum ab Aquilione"

Fala da crise europeia. Fala de política, pois, e não de religião. Termina assim o texto do eurodeputado: "Se se persistir em não cuidar da dimensão política, pode de novo fazer sentido a profecia de Jeremias: omne malum ab Aquilione. Do Norte soprará o mal sobre todos".

A frase latina deve ter sido retirada da Vulgata. A minha Bíblia diz: "E o Senhor retorquiu-me: Do Norte virá a desgraça sobre todos os habitantes do país".

Credo

Toda a gente sabe que nunca murmurei a mínima oração.
Toda a gente sabe também que nunca tentei dissimular os meus defeitos.
Ignoro se existe uma justiça e uma misericórdia.
Contudo, tenho confiança, porque sempre fui sincero.

Omar Khayyãm, matemático persa do séc. XI

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

São estes os padres mais influentes de Portugal?



O "Expresso" fez uma lista dos 100 portugueses mais influentes (edição de 7 de julho). Inclui estes três padres: Lino Maia, José Policarpo e Tolentino Mendonça. Parece-me óbvia a injustiça da ausência de alguns, a começar por Manuel Clemente. E se houvesse uma publicação que listasse as 100 figuras mais influentes da Igreja portuguesa? Quem lá figuraria?


Durante os próximos dias, este blogue não terá novas entradas. A mochila das férias não inclui portátil nem outros dispositivos com ligação à Internet.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Papa olímpico


PioX ainda sem ter calçado as sapatilhas

 A edição dos jogos olímpicos de 1908 esteve para ser em Roma, mas a “cidade eterna” renunciou à organização por causa de uma grave crise económica.


Londres acabou por acolher a 4.ª Olimpíada da era moderna. Entretanto, o inventor dos jogos, o francês Pierre de Coubertin (1863-1937), pediu ajuda à Santa Sé para a promoção do evento e foi o próprio Papa Pio X que se empenhou no processo.


Consciente da dificuldade de incentivar a atividade desportiva nessa época, geralmente ligada aos militares ou à classe nobre, Pio X disse a um dos seus cardeais: “Muito bem. Se não percebem que é algo que se pode fazer, vou pôr-me a fazer ginástica diante de todos, verão assim que se o Papa a faz, toda a gente a pode fazer”.


Adaptado daqui.

A palavra é um soberano poderoso

A palavra é um soberano poderoso
porque com um sopro pequeníssimo e completamente invisível
realiza obras profundamente divinas,
de facto, ela tem a capacidade de apagar o medo
de difundir a alegria
de intensificar a compaixão.


Górgias, "Elogio de Helena""

segunda-feira, 30 de julho de 2012

"A militância de um (ex-)católico crítico", no "Público" de ontem



Notícia do "Público" de ontem sobre o arquiteto Nuno Teotónio Pereira, a quem a Igreja Católica atribuiu o prémio de Árvore daVida / P.e Manuel Antunes.

Obrigação

Quanto mais aprendemos, mais assombrados ficamos ou devíamos ficar... A nossa a obrigação é aprender cada vez mais e assim separar a nossa mera ignorância do verdadeiro mistério.


Lewis Thomas

domingo, 29 de julho de 2012

Preparando as férias



Tchekov disse: "Se tens medo da solidão, não te cases". Eu diria: se tens medo da solidão, não viajes. A literatura de viagem mostra os efeitos da solidão, umas vezes desolada, mais frequentemente enriquecedora, de vez em quando inesperadamente espiritual".


Paul Theroux, "A Arte da Viagem" (Quetzal), pág. 8.

Bento Domingues: "Pão para todos"



Bento Domingues no "Público" de hoje. "A consciência ética começa quando chegamos à conclusão de que o mundo como está é uma vergonha, mas não é uma fatalidade. Jesus Cristo não deixou nenhuma receita automática para vencer este escândalo". O dominicano regressa em setembro.


Breu

O grande enigma da vida humana não é o sofrimento, é a infelicidade. (...) A infelicidade torna Deus ausente durante algum tempo, mais ausente do que um morto, mais ausente do que a luz num cárcere totalmente mergulhado no breu.


Simone Weil (1909-1943)

sábado, 28 de julho de 2012

Cinco pães e dois peixes



"Mandai-os sentar" (Jo 6,10).


A necessidade de nos alimentarmos é, antes de mais nada, sinal da nossa indigência radical. Obscuramente, vamos percebendo que não nos bastamos a nós mesmos. Na realidade vivemos recebendo, alimentando-nos duma vida que, através da terra, se nos oferece em cada dia a cada um. Por isso,é um gesto profundamente humano recolher-se antes de comer para agradecer a Deus esses alimentos, partilhando a sua mesma com familiares e amigos. Comer juntos é confraternizar, dialogar, crescer em amizade, partilhar a dádiva da vida: por isso é tão difícil dar graças a Deus quando uma pessoa tem mais alimento do que o necessário, enquanto outros sofrem miséria e fome.


José Antonio Pagola


Anselmo Borges: "A monja e o capitalismo não ético"

Ir. Teresa Forcades

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje. Aqui.

Nasceu em Barcelona em 1966. É doutorada em Medicina e em Teologia. Muito conhecida pelas suas posições feministas e pelas críticas às multinacionais farmacêuticas, Teresa Forcades é uma monja beneditina do Mosteiro de Sant Benet de Monserrat.

Conheci-a em Julho de 2011, em Santander, num Congresso de Teologia e Ética, e a impressão que me ficou foi a de uma mulher séria e agradável, descontraidamente inteligente e interventiva.

Foi recentemente convidada para a conferência inaugural de um encontro de empresários, talvez o mais importante da Catalunha, com a presença de umas seiscentas pessoas.

Ela é absolutamente favorável ao empreendedorismo. Quereria que isso fosse uma possibilidade para todos, pois isso significa realizar possibilidades e ter iniciativas próprias. Mas põe em causa o empresariado baseado numa relação contratual num quadro capitalista sem ética. Por três motivos.

É uma mentira o mercado que se diz livre. De facto, ao longo da história, o mercado nunca foi livre. "Foi sempre regulado a favor de certos interesses: da realeza, interesses proteccionistas, da classe dominante, do parente dos governantes de turno." Mercado livre é "uma hipocrisia, uma falácia".

Depois, a lógica do capitalismo, no quadro do mercado global, quer "o máximo lucro". Ora, é aberrante, do ponto de vista antropológico e humano, pensar que a melhor maneira de incentivar as pessoas, a sua criatividade, a actividade económica e, em última análise, o crescimento, seja o lucro máximo. Satisfeitas as necessidades básicas, "o que me estimula não é o dinheiro", mas a curiosidade intelectual, o desafio de descobrir potencialidades e encontrar quem ajude a realizá-las, o apreço dos colegas, a valorização do trabalho que faço, ver que o trabalho das pessoas transforma de modo positivo as suas vidas. Porque não criar uma sociedade fundada no que verdadeiramente nos dá gosto e nos realiza? E o direito à alimentação, à educação, à saúde, à reforma tem de estar acima do mercado e do lucro.

Portanto, o capitalismo não lhe parece ético. E assume a crítica marxista da mais-valia, dando um exemplo: no mosteiro, temos uma pequena empresa de cerâmica e há uma pessoa de fora que lá trabalha; se lhe pagarmos um euro e ganharmos mil, o capitalismo dirá: que bem! "Mas isto é indigno, pois vai contra a dignidade do trabalho." Há diferenças aberrantes: num contrato, "talvez esteja bem que eu ganhe um e tu ganhes quatro ou até dez, mas mil não pode ser de modo nenhum".

É, pois, claríssimo que temos de pensar e organizar uma alternativa. "Quem nos ensinou a não confiar que não nos podemos organizar melhor, ao constatarmos, como constatamos, que o modo actual é tão claramente contrário aos interesses da maioria?" O bloqueio da imaginação é um sinal de alarme. É como se se tornasse não possível para mim, que sou monja e prefiro esta vida, imaginar para mim própria uma vida fora do mosteiro. "Se já nem sequer posso imaginar uma alternativa, creio que isso é um sinal de alienação mental."

O que é e aonde leva a especulação? Eu compro todo o trigo e guardo-o. As pessoas vão morrendo, mas, quando os preços subirem, vendo pelo dobro. "Isto aconteceu, e estes senhores do Goldman Sachs sentam-se nas primeiras filas dos convénios e recebem prémios, mas deviam estar na cadeia." São responsáveis por mortes. Jean Ziegler, das Nações Unidas, diz que isto é assassínio organizado. Presentemente, produzem-se alimentos para 12 mil milhões de pessoas, mas há mil milhões com fome. Cada dia morrem 26 mil crianças de fome.

A conversão fundamental é, na nossa visão do mundo, a da passagem da relação sujeito-objecto para uma relação sujeito-sujeito, substituindo assim uma relação de dominação por uma relação de jogo de subjectividades, no qual entram dignidades.

Se continuarmos nesta "alienação mental", neste bloqueio da renovação social, porque os políticos só pensam nas próximas eleições, sem capacidade para criar uma alternativa, a nossa situação pode piorar e podemos assistir a um fascismo social e político e até a uma guerra.

No calor, frescura

Ótimo consolador,
Doce hóspede da alma,
Doce refrigério.


No trabalho, descanso,
No calor, frescura,
No choro, consolação.


De um hino atribuído a Estêvão (Stephen) Langton (séc. XII-XIII) sobre o Espírito Santo.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Deus e os dados



Eu estou convencido que Ele não joga aos dados.
Einstein em carta Max a Born

Não só Deus joga dados com o Universo, como joga em lugares onde não podemos ver o resultado.
Stephen Hawking

Deus joga aos dados, mas escolhe apenas as melhores jogadas.
Anónimo

Porta-voz dos bispos escreve sobre as olimpíadas para que a situação melhore

Texto de P.e Manuel Morujão, s.j., no "Correio da Manhã" de hoje. Refere o jesuíta que o inventor do lema olímpico foi o padre Henri Martin. Julgo que o nome está errado, tratando-se antes do dominicano francês Henri (Louis Rémy) Didon, que já por cá passou.

Ação

Esta é uma forma de Deus agir sobre o Universo: através de nós, como seus agentes com livre arbítrio.


Guy Consolmagno

Sinodalidade e sinonulidade

Tenho andado a ler o que saiu no sínodo e suas consequências nacionais, diocesanas e paroquiais. Ia para escrever que tudo se resume à imple...