quarta-feira, 30 de junho de 2010

A verdadeira origem das vuvuzelas

O De Rerum Natura diz (aqui) que a origem das vuvuzelas está no capítulo 8 do Apocalipse, que reza assim no versículo 6: “E os sete anjos, que tinham as sete trombetas, prepararam-se para tocá-las”.

Mas está enganado. O Livro de Josué, escrito cerca de oitocentos anos antes e reportando-se à conquista de Jericó pelos israelitas, que, histórica ou não, terá de datar-se pelo 1200 a.C., diz em 6,8: “Mal Josué acabou de falar, os sete sacerdotes puseram-se em marcha diante do Senhor, tocando os seus instrumentos”. Versículo 20 do mesmo capítulo: “Mal o povo escutou o som das trombetas, fez[-se] ouvir um grande clamor e as muralhas da cidade [de Jericó] desabaram”.

Ontem, caiu a muralha defensiva portuguesa - e não adianta culpar as vuvuzelas.

Dádiva de livros e da noite


Que ninguém se abaixe ao nível da censura.
Ou das lágrimas, essa afirmação da mestria
De Deus, cuja maravilhosa ironia
Ao mesmo tempo me fez dádiva de livros e da noite

Jorge Luís Borges (1899-1986)

30 de Junho de 1860. Debate em Oxford sobre o darwinismo

Thomas Huxley (em cima) e o bispo Wilberforce.
Imagens da "Vanity Fair"

Ontem referi aqui o inventor da palavra “angosticismo”, Thomas Huxley. Hoje, reparo que no dia 30 de Junho de 1860 (há 150 anos) deu-se um dos mais célebres debates sobre a teoria da evolução, na Universidade de Oxford. De um lado, Thomas Huxley, defensor aguerrido de Darwin, do outro, o bispo (anglicano) Samuel Wilberforce, defensor da verdade das Escrituras.

Diz-se que foi neste debate que Wilberforce (“o melífluo” Sam e popular entre as senhoras da época) disse: “Gostaria de perguntar ao professor Huxley, que julga que descende do macaco e espera a hora de me desfazer em migalhas, de onde lhe vêm as suas origens simiescas, de do lado do seu avô ou da sua avó?”

Afirma Jacques Arnold, em “Requiem por Darwin” (ed. Gráfica de Coimbra 2; livro que há um ano andou muito por este blogue), que o episódio faz parte da “mitologia científica, tal como a maçã de Newton e a tina de Arquimedes”. É difícil separar a realidade da ficção. Para mais, parece que o interlocutor de Wilberforce mais interveniente foi Dalton Hooker e não Thomas Huxley, que no entanto era o principal defensor de Darwin nesta época.

Leituras matutinas: Ian McEwan fala de Deus


Excerto da entrevista de José Rodrigues dos Santos a Ian McEwan em “Conversas de escritores” (Gradiva), pág. 34.

José Rodrigues dos Santos – Não acredita que Deus existe?
Ian McEwan – Acreditaria se tivesse alguma prova. Não vejo razão para acreditar. Penso que o mundo é tão maravilhoso e tão estranho que quero ver até onde chegamos sem explicação do sobrenatural.

JRS – E se Deus é natural e não sobrenatural?
IM – Então teremos de modificar a nossa ciência para o integrar. Todavia, neste momento não há nada que sugira que a oração funciona. Muitas crianças adoecem e morrem, apesar de todas as orações dos pais. Perguntaram um dia a Bertrand Russell, um ateu famoso, o seguinte: “O que aconteceria se ao morrer descobrisse que Deus existe? O que Lhe diria?” E Bertrand Russell respondeu: “Dir-lhe-ia: não chega como prova, meu caro”. Aí está.


Perplexidades: Se tivesse provas, ainda se tratava de acreditar? O específico de Deus é dar explicação ao mundo? Deus natural? (Esta merece um Nobel da Teologia - deve ter a ver com "A fórmula de Deus"). A oração não funciona em relação a “muitas crianças”? E em relação às outras? A eficácia da oração é um argumento? (Talvez para um Deus muito sacrificial e utilitário). A resposta de Russell às vezes parece-me inteligente (dizia Agostinho: Trabalha como se Deus não existisse, reza, porque Deus existe). A existência não é prova da existência. Outras vezes, acho que não percebi.

terça-feira, 29 de junho de 2010

29 de Junho de 1895. Morre o inventor da palavra “agnosticismo”

Thomas Henry Huxley morreu no dia 29 de Junho de 1895. Tinha nascido no dia 4 de Maio de 1825. Para a história ficou com o apelido de “buldog de Darwin” por ser o principal discípulo e defensor da teoria da evolução pela selecção natural, de Charles Darwin.

Thomas Huxley cunhou o termo “agnosticismo” por achar que “ateísmo” era demasiado dogmático. Além disso, na Inglaterra vitoriana, a palavra “ateísmo” estava muito conotada com as políticas revolucionárias da extrema-esquerda. “Agnosticismo”, segundo Huxley adequava-se mais correctamente à falta de indícios racionais sobre a existência de Deus. O agnosticismo não era um novo credo, como no fundo o ateísmo, mas um desconhecimento metafísico.

Fascínio de Saramago pela Bíblia?

"Bíblia" ("Ateísmo", aqui) é outra das palavras para um minidicionário saramaguiano, segundo António Guerreiro. Há que dizer que o crítico do "Expresso" tem razão alguma. A "Igreja (....) nunca promoveu a leitura direta dos textos sagrados". "Nunca" é muito tempo. "Quase nunca" seria mais correcto. Hoje, há imensos grupos bíblicos, há imensos esforços que promovem a leitura da Bíblia. António Guerreiro não terá a obrigação de conhecer o dia-a-dia de uma paróquia, de um movimento de cristãos, de um grupo. Mas é isso que acontece numa imensidão deles.

O "ateu Saramago" pareceu "fascinado pelo texto bíblico". A mesma opinião tem o padre, poeta e teólogo Tolentino Mendonça. Não sei se ao interesse de Saramago chamaria fascínio. Fascínio, penso eu, é uma atracção amante, atracção do objecto sobre quem gosta dele. Saramago não gostava da Bíblia, ainda que a lesse com uma óptica muito própria.

Eu critico as críticas do crítico do "Expresso" às críticas do crítico do "Osservatore Romano" às críticas de Saramago à Igreja e à Bíblia

O suplemento “Actual”, do “Expresso” do último fim-de-semana, tem um “vocabulário essencial” sobre Saramago. Os termos termo escolhidos por António Guerreiro foram estes: Alegoria, Ateísmo, Bíblia, Comunismo, História, Iberismo, Ideias, Nobel, Pilar del Rio, Polémica, Portugal, Vírgula.

Em “Ateísmo”, o crítico do “Expresso” diz que o “Osservatore Romano” mostrou a “intolerância e ira da Igreja contra o escritor que ultrapassam tudo o que seria de esperar”. Fui reler o artigo (ou um eco dele, aqui), e não percebo onde é que António Guerreiro encontrou a intolerância. Numa frase ou noutra, encontrei umas ideias de defesa – mas isso é imprescindível num jornal católico, quando se expõe o pensamento de um autor declaradamente anticatólico.

O título do texto do “Osservatore Romano” tem piada, “A (presumível) omnipotência do narrador”, porque o narrador de Saramago, geralmente, é omnisciente – o que lhe permite os comentários ora fatalistas, ora irónicos. De resto, quando Claudio Toscani diz que Saramago foi “um homem e um intelectual de nenhuma admissão metafísica, ancorado até ao final numa confiança arbitrária no materialismo histórico”, está a descrever e não a fazer um juízo de valor. O “Expresso” só poderia concordar, ao escrever que a “religião ateia” do Nobel não se pode confundir com uma teologia negativa (aquela que afirma sobre Deus negando que dele se possa falar com sentido). Em Saramago, segundo a sua própria intenção, nem teologia negativa há. Estou convencido de que ele recusaria uma boa parte das afirmações que, após a morte, o colocaram próximo do texto bíblico, da figura de Jesus ou de Deus, ainda que pela via negativa.

Escreve o italiano: “Relativamente à religião, atada como esteve sempre a sua mente por uma destabilizadora intenção de tornar banal o sagrado e por um materialismo libertário que quanto mais avançava nos anos mais se radicalizava, Saramago não se deixou nunca abandonar por uma incómoda simplicidade teológica”. Concordo em absoluto. Essa simplicidade teológica foi o que lhe permitiu a ironia, o sarcasmo, a interpretação literalista, a paródia em relação à Bíblia, a Jesus Cristo, à fé cristã. Diz ainda Toscani que “Caim” é “um romance-saga sobre a injustiça de Deus, uma antileitura bíblica parodiante”. Não vejo como discordar.

Daqui a uns anos, um olhar mais livre dirá quem está mais perto da verdade, se o crítico do “Expresso”, se o do “Osservatore Romano”. Para já, parece-me que António Guerreiro afina pelo diapasão da catofobia.

Deus em Auschwitz


O argumento do mal, contra a existência de Deus, é um argumento coxo. Aliás, se não houvesse mal, para quê acreditar em Deus? Se deste modo parece que a questão de Deus é uma questão de utilidade, ponhamos a questão de outra forma. Se estivéssemos num mundo perfeito, para quê Deus? Vem isto a propósito desta frase:

“Não há para mim nenhum Deus que eu possa adorar de costas voltadas para Auschwitz (…). Se nós não vemos Deus em Auschwitz, como é que o podermos ver noutro lado?”

Johann Baptist Metz

29 de Junho. De Pedro a Ratzinger

O Google recorda hoje que Antoine de Saint-Exupéry, o autor de “O Principezinho”, nasceu há 110 anos, no dia 29 de Junho de 1900. A Igreja diz que foi num 29 de Junho, mas no ano 96, que morreu Pedro, o primeiro Papa. E em 1951, neste dia, Ratzinger, futuro sucessor de Pedro, foi ordenado padre.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Rousseau e a mudança de mentalidades na Europa - o caso do paraíso

De um livro de três entrevistas sobre a felicidade que li há pouco, no dia em que Rousseau faz anos (nasceu há 298 anos), realço isto:

"Após a revolução científica, não foi a revolução das mentalidades que transformou a representação do paraíso?

Jean Delumeau – A segunda revolução é, com efeito, a dos sentimentos, que se pode datar, em França, pelo menos, da publicação d’A Nova Heloísa, de Rousseau. Nessa obra, um pastor protestante pede a Júlia, que está a morrer, que se desprenda dos bens deste mundo, do rosto dos seres amados, pois no além já não há marido nem esposa. Júlia contesta que, pelo contrário, espera poder amar no além aquele a quem não teve o direito de amar na Terra. A Nova Heloísa de Rousseau corresponde a uma mudança das mentalidades que atingia não só a França mas a Europa: a felicidade definitiva foi, desde então, cada vez mais identificada com a ideia de reencontrar aqueles que amámos e que nos amaram. O paraíso tornou-se assim – e continua a ser hoje – o lugar do reencontro com os entre os entes queridos. No entanto, esse tema do reencontro não é novo no cristianismo e não esperou pela revolução dos sentimentos e pela época moderna para ser realçado. Um jesuíta do século XIX, F. R. Blot, retomando uma obra dominicana anterior, esforçou-se por recensear todos os textos cristãos antigos nos quais tinha sido desenvolvido o tema do reencontro dos entes queridos no paraíso. O título da sua obra é significativo: Au ciel, on se reconnaît (1863). De facto, a aspiração a reencontrar no além os entes queridos perpassou toda a história cristã".

André Comte-Sponville, Jean Delumeau e Arlette Farge, A mais bela história felicidade, Texto & Grafia, páginas 72-73.

Como o fim de escravidão nos EUA influenciou Nietzsche

Na "Folha de S. Paulo" saiu há dias uma pequena entrevista muito útil para compreender Nietzsche. Pelo menos, chama a atenção para um aspecto que passa despercebido quando se estuda este filósofo (falo da minha experiência, obviamente) - a influência da Guerra de Secessão no pensamento do alemão.


Diz Domenico Losurdo, professor em Urbino (itália), autor da biografia "Nietzsche - O Rebelde Aristocrata”:

O início da atividade literária de Nietzsche ocorre em meio à Guerra de Secessão (1861-65), que marca a derrota do Sul dos EUA em eternizar a escravidão negra.

Ele manifestou todo seu desprezo por Beecher-Stowe, a autora do célebre romance abolicionista "A Cabana do Pai Tomás".

Mas, onipresente em Nietzsche e no debate cultural e político da segunda metade do século 19, o tema da escravidão se dissipa ou se transforma numa inocente metáfora no âmbito da hermenêutica da inocência (Bataille, Deleuze, Vattimo, Colli, Montinari etc.).

Sobre a relação entre Nietzsche e nazismo, o ensaísta italiano afirma:

A categoria de "irracionalismo" não me parece particularmente produtiva para explicar Nietzsche e Hitler.

São claros os elementos de continuidade e descontinuidade que subsistem entre um e outro. Quando lemos em Nietzsche terríveis palavras de ordem ("aniquilamento das raças decadentes", "aniquilamento de milhões de malsucedidos"), não podemos deixar de pensar na tradição colonial e no sociodarwinismo, herdados e radicalizados por Hitler.

Também a celebração nietzschiana da escravidão nos reconduz ao nazismo. O Terceiro Reich pretendia encontrar na Europa Oriental, entre os eslavos, os escravos para trabalhar para a "raça dos senhores".

No entanto esse motivo é antípoda ao pensamento de Nietzsche, que, vivendo numa época histórica diferente (anterior à Primeira Guerra), se bate pela unidade da aristocracia de todos os países europeus, inclusive os da Europa Oriental.

Ler tudo aqui.

28 de Junho de 1712. Nasce Jean-Jacques Rousseau

Retrato de Rousseau em 1766, por Allan Ramsay

Jean-Jacques Rousseau nasceu no dia 28 de Junho de 1712, em Genebra, na Suíça. E morreu no dia 2 de Julho de 1778. Foi levado para o Panteão Nacional, em Paris, em 1794.

Amado e odiado tanto por causa das suas ideias educativas, que enformaram correntes pedagógicas, como pelo contrato social, que influenciou política, economia e sociedade, Rousseau escreveu umas “Confissões” (publicadas em 1782), que são a primeira autobiografia moderna no sentido estrito da palavra. Antes disso, dentro do género, só havia as de Agostinho de Hipona.

domingo, 27 de junho de 2010

Terry Eagleton: Deus volta ao debate intelectual pela esquerda

O crítico inglês Terry Eagleton vai estar na próxima Festa Literária Internacional de Paraty (Flip, 4 a 8 de Agosto), no Brasil, para falar de Deus. Eagleton é um marxista (não sei se muito, se pouco ortodoxo, mas quer publicar um livro sobre como Marx estava certo).

Nos anos 60 e 70, colaborou na revista “Slant” - vem sempre nas notas biográficas do crítico. Eu nunca tinha ouvido falar da revista “liberal”, “católica”, “esquerdista”, mas uma gloogagem revela logo que era uma publicação ligada aos dominicanos e à Universidade de Cambridge. Publicaram-se 30 números.

Terry Eagleton, que tem sido crítico no “novo ateísmo” (de Dawkins e Hitchens – ou numa palavra, como prefere, Ditchkins; disse Eagleton sobre um livro de Dawkins: “Imagine alguém discorrer sobre biologia tendo como único conhecimento do assunto o «Livro dos pássaros da Inglaterra» e você terá uma ideia do que é ouvir Richard Dawkins discutir teologia”), dá uma entrevista ao suplemento “Prosa & Verso” de “O Globo”.

Diz isto, por exemplo:

Se existe isso que se pode chamar de neoateísmo [Dawkins, Hitchens e outros], há também um novo ateísmo teológico: Habermas, Badiou, Agamben, Zizek etc. Um fenômeno impressionante e incomum de todo um conjunto de pensadores de esquerda lidando seriamente com teologia.

Deus volta ao debate intelectual de duas maneiras: há uma polêmica contra ele, por um lado, e por outro um aproveitamento de recursos teológicos por parte de uma série de pensadores de esquerda declaradamente ateístas. E acho que essa segunda história ainda precisa ser examinada com mais profundidade. O que está acontecendo, para que parte do trabalho teológico mais importante de hoje esteja sendo feito por ateístas de esquerda? Parte da resposta, na minha opinião, é que, quando a esquerda passa por tempos difíceis, ela não pode ser dar ao luxo de olhar os dentes do cavalo, como se diz. E se ela descobre que algumas ideias teológicas podem ser úteis, então, por que não?

A entrevista pode ser lida aqui.

Caminho mais curto

Deus é o caminho mais curto entre os homens.

Anónimo

27 de Junho de 1844. É assassinado o fundador dos mórmons

Joseph Smith Jr. (Vermont, 23 de Dezembro de 1805 - Illinois, 27 de Junho de 1844) é o fundador da Igreja dos Santos dos Últimos Dias. Ou “restaurador”, como dizem os mórnons (que preferem não ser identificados por esta palavra que tanto deriva do nome de um local onde o profeta Alma ensinou o Evangelho de Jesus Cristo ao povo do Rei Noé, em 146 a.C., como do nome do profeta que viveu nas Américas em 321 d.C. e que deu origem ao Livro de Mórmon).

No meio de uma revelação, Joseph Smith recebeu o Livro de Mórmon – a “bíblia” desta igreja de características milenaristas, publicada em 1830.

No dia 27 de Junho de 1844, enquanto aguardava por julgamento numa prisão devido à acusação de poligamia, Joseph Smith é assassinado por dissidentes da sua igreja.


Uma vez, aceitei mórmons em minha casa. Conversámos durante umas duas horas sobre religião. Não chegamos a lado nenhum, mas aumentei os meus conhecimentos sobre a organização.Os jovens americanos - já não me lembro de onde, mas na altura dei-lhes um mapa para me dizerem quais as suas terras - mantiveram sempre um semblante imperturbável. Perguntei-lhes pelos gostos. Música, cinema, desporto. Há mais de um ano e tal que... nada. Não podiam ver nem ouvir. Tinha ficado tudo na América. Mas um deles pôs os olhos nos meus CD e acabamos os três a ouvir Beck (Mellow Gold, Odelay, Mutations...). Teve algo de transgressão - para eles. Voltaram a passar para me convidar para o culto. Era à quarta à noite. Nessa altura eu tinha basquete. Não dava. Não que eu gostasse de basquete. Mas se faltasse as equipas ficavam desequilibradas.

Bento Domingues: Uma confiante peregrinação da razão


Bento Domingues fala da conversão de Anthony Flew como consequência de "seguir a razão para onde quer que ela nos leve". Outro texto sobre Anthony Flew pode ser lido aqui. O livro inicialmente apontado por Bento Domingues, sobre o regresso da fé, está aqui referido.

sábado, 26 de junho de 2010

Doença em Lisboa muda percurso de teólogo espanhol

Díez-Alegría é o do meio. O da direita é Pedro Lamet, jesuíta, biógrafo

Pedro Lamet, autor de "Díez-Alegría: un jesuita sin papeles" (aqui), escreve no seu blogue sobre José Maria Díez-Alegría, que morreu ontem. Note-se que se não fosse a doença em Lisboa, em 1971, o percurso do teólogo jesuíta teria sido outro.

"2. El libro: En 1971 mientras daba una conferencia en Lisboa cae enfermo. Mielopatía por espondelosis vertical. Operado en Madrid y convencido de que puede morirse decide escribir un libro en el que exponer sin rodeos todo lo que piensa sobre la fe, la Iglesia, el celibato, el marxismo. etc. Se lo comunica al general P.Arrupe, haciendo de objeción de conciencia a la censura. Al final el libro aparece en España y se convierte en un escándalo internacional. En nuestro país el escándalo es doble por la situación política y por sus dos hermanos, jefe del Estado Mayor y de la Casa Militar de Franco.Destituido como profesor la Universidad Groriana vuelve exclaustrado a Madrid y se aloja en el Pozo del Tío Raimundo".

Ler tudo aqui.

Morreu o teólogo José Maria Díez-Alegría

Morreu na sexta-feira, 25 de Junho, na residência dos jesuítas de Alcalá de Henares, perto de Madrid, o teólogo espanhol José Maria Díez-Alegría, nascido a 22 de Outubro de 1911 em Gijón. Nasceu na sucursal do Banco de Espanha, onde o seu pai era director e, não certamente por isso, tornou-se teólogo da libertação, sempre atento à exploração dos mais frágeis.

Em 1972, quando era professor da Gregoriana, em Roma, publicou o livro “Eu creio na Esperança” e foi expulso (“exclaustrado”) da Companhia de Jesus para evitar problemas com o Vaticano. Continuou a ser padre, vivendo com o jesuíta Llanos na casa “Pozo del Tío Raimundo”, em Madrid, um importante centro de teologia da libertação.

José Maria Díez-Alegría intitulava-se “jesuíta sem documentos”. Pedro Lamet escreveu uma biografia sobre este jesuíta com “piadas e passagens deliciosas”. Nesta, Díez-Alegría harmoniza “com a fé católica a sua radical teologia da libertação”. Li aqui e adaptei o mínimo.

Um catequista de mulheres adultas, na Andaluzia, encontrou uma jovem muito pobre, casada, com filhos e que passou a viver com um velho.

- Mulher, você não pode continuar a viver com o velho.

- Mas, claro que sim, senhor. O velho vai morrer logo e eu vou ficar com uma boa casa, trago meu marido e meus filhos e o problema está resolvido.

- Mas, mulher, isso é contra a lei de Deus.

E a jovem com a sua convicção:

- Não, senhor. Se eu for ter com Deus, não tenho dificuldades. Eu digo-lhe: Senhor, perdoas-me e eu perdoo-te por eu ser tão pobre. E estamos quites.

Papas simultâneos


Este esquema retirado da Wikipédia esclarece sobre a questão dos Papas e antipapas durante o Cisma do Ocidente. Mas houve mais períodos com antipapas.

26 de Junho de 1409. O que é que um Papa diz aos outros dois?

Há uma anedota que diz:
- O que é que um Papa diz ao outro?
- Nada. Só existe um Papa de cada vez.

Mas houve um tempo em que havia dois papas. E a seguir a 26 de Junho de 1409, houve três.

O Concílio de Pisa reuniu em 1409 para resolver o Cisma do Ocidente. A ideia era simples. Adeptos do Papa em Avinhão, Bento XIII (hoje considerado antipapa), e do Papa em Roma, Gregório XII, concordavam em eleger um novo Papa que acabasse com o triste espectáculo da divisão de obediências.

O cardeal Philarghi, de origens humildes, educado por um frade capuchinho, liderou o processo. Pregou o sermão de abertura do Concílio, em Março de 1409, condenou o cisma que a divisão representava e acabou por ser a escolha unânime dos cardeais. É eleito Papa no dia 26 de Junho de 1409. Alexandre V.

Acontece que a seguir nem Bento XIII nem Gregório XII desistem das reivindicações e dão o dito por não dito. Volta tudo atrás. Ainda pior. Agora há três papas. A cristandade não sabe a quem ser fiel.

Alexandre V morre no dia 3 de Maio de 1410, sem a questão ficar resolvida. E nunca ficou bem claro que este papa é legítimo ou não. Legítimo era Gregório XII, que parece ter abdicado, mas depois disse que não. Para todos os efeitos, o retrato de Alexandre V está nos muros da Basílica de São Paulo Extra-Muros. E o célebre Rodrigo Bórgia, um século depois, ao escolher o nome Alexandre V, assumiu que o anterior foi Papa. Mas também há quem o coloque na lista dos antipapas.

O Cisma, esse, terminaria somente em 1417, com Martinho V.

4 em 10 americanos dizem que JC volta antes de 2050

Sou da opinião de que se perguntarmos as coisas mais disparatadas obteremos as respostas que quisermos. Um inquérito inglês revelou há uns anos que um terço dos ingleses acha que a Terra anda à volta do Sol. Pensando que aqui em Portugal seria impossível tal percentagem, perguntei num grupo de adultos, no contexto de uma aula sobre o livro bíblico de Josué, que diz que "a terra parou", se o Sol anda à volta da Terra ou é o contrário. Não houve unanimidade. Muitos diziam que a o Sol é que anda à volta da Terra. Tenho pena de não ter contado quantos assim pensavam.

Agora leio que "el 40% de los ciudadanos de Estados Unidos creen que Jesucristo retornará a la Tierra en 2050, según una curiosa encuesta que ha elaborado el Instituto y la Fundación Smithsonian sobre cómo será el mundo a mitad de este siglo". Aqui. O teor é diferente. Mas quando se pergunta alguma coisa na rua, tudo é possível. E, no segundo seguinte, o seu contrário.

Anselmo Borges: Católico e questões fracturantes

Estatístias e questões no texto de Anselmo Borges no DN de hoje (aqui). "(...) Há padres e bispos de alto coturno moral, intelectual, espiritual. Mas, depois, também viria a ladainha das queixas, mais ou menos justas. Um estilo de vida burguês e instalado, pouco conforme com o Evangelho. Padres com demasiada idade, obrigados ao ministério. Incapacidade de compreensão do mundo contemporâneo. Falta de preparação em psicologia, sociologia e mesmo teologia. Homilias gagas e vazias. Celebrações que nada têm a ver com o pedido papal para que sejam lugares de beleza. Onde está o testemunho alegre do Evangelho, uma notícia boa e felicitante? Na presente situação de crise, na qual os mais atingidos não são os ricos, porque não há uma palavra iluminante por parte dos bispos?"

Dias antes da chegada de Bento XVI a Portugal, a Intercampus fez para o Rádio Clube e para a TVI uma sondagem aos portugueses em geral e aos católicos sobre várias questões, incluindo as ditas fracturantes. São os resultados dessa sondagem que gostaria hoje de comentar brevemente.

1. Quanto à interrupção voluntária da gravidez, 57, 9% dos portugueses concordam com a decisão de 2007, sendo a maioria dos católicos (54, 6%) igualmente favorável.

Julgo que seria preciso perguntar se também concordam com que as mulheres que abortam não paguem taxa moderadora e façam dois abortos num ano. Estou à vontade, pois, na altura, pronunciei-me a favor da descriminalização.

2. Quanto ao uso de contraceptivos, os portugueses são claros: 95, 8% concordam; entre os católicos, a percentagem é semelhante: 95, 4% também concordam.

Estes números deveriam obrigar a hierarquia a pensar. Precisa-se na Igreja de uma reflexão profunda para uma nova atitude face à sexualidade. Não é sustentável um discurso sobre a sexualidade baseado numa concepção exclusivamente biológica da natureza, porque o ser humano é racional e autónomo.

3. Sobre o casamento gay - na altura, o Presidente ainda poderia vetar a lei -, revelou-se que 51, 8% dos portugueses não concordam, aumentando o número para 57, 3% entre os católicos. Quanto à adopção de crianças por casais do mesmo sexo, 68, 1% responderam não; entre os católicos, 72, 8%.

Estou convicto de que se, em vez de casamento, se tivesse encontrado outra palavra, a percentagem seria diferente. Afinal, a maior parte dos portugueses manifesta a opinião de que, se não se pode tratar o igual como diferente, também não é bom tratar o diferente como igual.

4. Significativamente, 59, 7% dos inquiridos pensam que a lei portuguesa deveria permitir que doentes incuráveis e em situações clínicas dolorosas terminais possam pôr fim à vida, havendo apenas 27, 6% a não concordar com a eutanásia; a percentagem dos católicos que aceita a eutanásia é de 55, 4%.

Mais tarde ou mais cedo, esta é uma questão que será debatida. Afinal, a vida é dom e não um fardo. O próprio Thomas More, canonizado pela Igreja, levantou o problema na Utopia. Mas será necessário, em tempos de economicismo e de menosprezo pelos velhos e doentes, reflectir bem sobre todas as consequências.

5. Finalmente, a sondagem diz que os portugueses confiam, mas não a cem por cento, nos padres e bispos portugueses. Assim, 52, 7% dos inquiridos responderam que confiavam parcialmente nos padres e 49, 8% também parcialmente nos bispos. Admite-se que os escândalos de pedofilia poderão ser uma das explicações. Seja como for, a sondagem revelava que 42, 2% dos portugueses (entre os católicos, 43, 2%) achavam que o Vaticano não tinha lidado bem com a situação. Note-se que o Papa ainda não tinha tido sobre o tema o pronunciamento forte no avião, a caminho de Lisboa, nem tinha pedido expressa e publicamente perdão numa celebração solene no Vaticano.

Aqui, é necessário, em primeiro lugar, perceber que agora as pessoas são críticas e já não confiam de modo cego. Ainda bem. De qualquer modo, seria muito interessante questioná-las sobre as razões para este distanciamento. Aí, encontraríamos com certeza que reconhecem que há padres e bispos de alto coturno moral, intelectual, espiritual. Mas, depois, também viria a ladainha das queixas, mais ou menos justas. Um estilo de vida burguês e instalado, pouco conforme com o Evangelho. Padres com demasiada idade, obrigados ao ministério. Incapacidade de compreensão do mundo contemporâneo. Falta de preparação em psicologia, sociologia e mesmo teologia. Homilias gagas e vazias. Celebrações que nada têm a ver com o pedido papal para que sejam lugares de beleza. Onde está o testemunho alegre do Evangelho, uma notícia boa e felicitante? Na presente situação de crise, na qual os mais atingidos não são os ricos, porque não há uma palavra iluminante por parte dos bispos?

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Supostos segredos do Vaticano

Os segredos do Vaticano
Bernard Lecomte
Ed. Asa
288 páginas

Sobre este livro o jornal francês “Libération” disse que “é a prova de que a realidade é muito mais fascinante do que as teorias da conspiração”. A revista “Pèlerin Magazine” declarou: “Mais apaixonante do que muitos romances de mistério”. Ambos têm razão.

Os 17 textos de “Os segredos do Vaticano” lêem-se quase como 17 romances. Têm acção, personagens célebres (o Papa ou lá perto), tramas de poder (1. “Um Papa contra os Soviéticos. Como Pio XI quis ludibriar os bolcheviques russos”), dinheiro (15. “Sua Excelência, o «Banqueiro de Deus». Como o Papa se viu envolvido no maior escândalo financeiro do pós-guerra”), sexualidade (8. “A pílula por um triz. Como a Igreja Católica esteve quase a aprovar a contracepção”), morte (12. “A Máfia Búlgara. Quem esteve por detrás da tentativa de atentado contra João Paulo II em 1981?”), segredo (16 “O Terceiro Segredo de Fátima. O que revelou realmente a Virgem aos três pastorinhos portugueses?”), e, uma vez iniciada a leitura de cada um desses enredos, é difícil não deixar de querer saber como acabam, mesmo que já se conheça o fim da história.

Já agora, aqui ficam os títulos dos outros “segredos do Vaticano”: 2. “Viva o Papa! Viva o Duce. Porque foi a cidade do Vaticano fundada por Mussolini”; 3. “A encíclica interrompida. Quando o Papa esteve prestes a condenar o racismo e o anti-semitismo”. 4. “Os silêncios de Pio XII. O que podemos realmente censurar ao Papa durante a guerra”; 5. “O Caso Finaly. Quando o Papa e os judeus disputavam as crianças vítimas da guerra”; 6. “O Drama dos Padres-Operários. As razões que levaram Pio XII a cortar as ligações com o mundo dos proletários”; 7. “Ataque ao Concílio. Como o Vaticano II esteve prestes a soçobrar no dia da abertura”; 9 “Um Cisma para Nada. Porque razão o caso Lefebvre foi um verdadeiro falso cisma”; 10. “A morte do «Papa do Sorriso». A terrível verdade sobre a morte misteriosa de João Paulo I”; 11. “So-li-darnosc. Como o Papa polaco inverteu o curso da História”; 13. “A vingança da Opus Dei. Porquê e como o fundador da «Obra de Deus» foi canonizado”; 14 “O Santo Sudário de Turim. Porque se recusa a Igreja a considerar que a mortalha é autêntica”; 17. “A surpresa Ratzinger. Porque não devia o ‘Panzerkardinal’ suceder a João Paulo II”.

Transcrever o índice da obra poder parecer fastidioso, mas é, em primeiro lugar, útil. Por aqui se vê que os “segredos do Vaticano” abarcam todo o século XX. Esta obra acaba por ser uma história do papado no século XX (até Bento XVI, já no presente século).

Bernard Lecomte conta bem os segredos que, quase sempre, são apenas supostos segredos. Pense-se em todos os boatos que rodearam a morte de João Paulo I ou o Terceiro Segredo de Fátima. São bem desmontados pelo autor, que foi jornalista do jornal “La Coix” (diário católico francês) e das revistas “L’Express” e “Le Figaro Magazine”. Actualmente, Lecomte dirige uma editora regional, na Borgonha. No seu sítio e blogue, fala de livros, política, religião e vinhos. Em português tem também publicado o livro “João Paulo II, O Papa que venceu o comunismo” (ASA). Em francês publicou recentemente “Pourquoi le pape a mauvaise presse” (“Por que tem o Papa má imprensa”), sobre como os meios de comunicação social têm lidado com Bento XVI e o seu pontificado.

25 de Junho de 1852. Nasce o arquitecto Gaudí

Antoni Placid Gaudí (Reus, 25 de Junho de 1852 — Barcelona, 10 de Junho de 1926), grande arquitecto, passou a maior parte da vida em Barcelona. É autor da Igreja da Sagrada Família, que ainda está em construção.

A Igreja Católica tem em andamento o processo de beatificação, cuja fase diocesana encerrou em 2003. Na altura, estudava eu espanhol no Instituto Cervantes e a minha professora dizia que não compreendia por que queriam fazê-lo santo (também não compreendia por que é que o Digo Infante dava voz a tantos anúncios, isto, respondendo a um aluno que dizia que a publicidade televisiva espanhola tinha toda a mesma voz – mas essa é outra história).

Gaudí ia à missa todos os dias. O arcebispo de Barcelona diz que “era um grande cristão, tinha uma espiritualidade franciscana, de amor e contemplação das belezas da natureza, imagens da beleza do Criador".

Papina Joana, agora em filme

Já havia vários livros sobre a Papisa Joana (em português conheço dois, li um). Agora há um filme, segundo a revista "Sábado" desta quinta-feira.

A lenda diz que entre Leão IV e Bento III houve a Papisa Joana - ou Papisa João, segundo a notícia. A História e a Igreja dizem que não. Mas se a lenda o diz, filme-se a lenda, parafraseando um dito célebre dum filme de John Ford.

Quem escreveu a notícia, ao dizer que "o caso, que a Igreja sempre negou, aconteceu no séc. X", mostra não só demasiada certeza como principalmente pouca seriedade.

Portugal-Brasil: Quem irá Deus hoje abençoar?

Hoje é dia do Portugal-Brasil ou Brasil-Portugal, não sei bem. Se os jogos entre nações são um sucedâneo vantajoso das batalhas medievais (Paul Auster dixit: “Os europeus descobriram a maneira de se odiarem uns aos outros, sem por isso terem que se despedaçar à dentada. Este milagre tem o nome de futebol”), faz algum sentido que se continue a invocar as forças do Alto. Na Idade Média, cá por estes lados, era São Tiago contra São Jorge.

Dizem que a equipa portuguesa tem Nossa Senhora de Fátima. Alguém ofereceu uma ou umas imagens a Carlos Queirós. A equipa do Brasil tem, como é óbvio, Deus, que, como é quase universalmente reconhecido, é de nacionalidade brasileira. Deus vs Mãe de Deus. Hoje é capaz de dar empate. Mas sabemos do poder da Mãe de Deus. Todo o bom católico sabe das fraquezas do coração de Deus perante os pedidos da Mãe. Desde as Bodas de Caná que assim é.

No jogo anterior do Brasil, contra a Costa do Marfim, apesar da fé de Drogba, que é cristão, mas não sei de que confissão, Deus esteve do lado do Brasil. Pelo menos assim disse Juliana Clemente, 28 anos, mulher de Luís Fabiano: “Na hora certa Deus foi lá e abençoou” (Folha de S. Paulo, 22-06-2010). Abençoou duas vezes. O ex-jogador do FCP marcou dois golos. Quem irá Deus hoje abençoar?

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Papá, são judeus que vivem aqui?

Um pequeno israelita viaja pela primeira vez de avião, na companhia do pai. Ao sobrevoarem a Grécia, o miúdo olha pela janela e pergunta:
- Papá, que grande que é! São judeus que vivem aqui?
- Não, meu filho, são cristãos.
- Ah…
Sobrevoando a Itália:
- Papá, e aqui, são judeus?
- Não, meu filho, são também cristãos.
- Ah…
Sobrevoando a França:
- Papá, e aqui, há judeus?
- Não, meu filho, há sobretudo cristãos.
O rapazinho pensa e exclama de seguida:
- Papá, como estão dispersos os cristãos!

Alcorão Sagrado

Com o “Público” de hoje (e mais 5,95 euros) sai uma edição do Alcorão, “Alcorão Sagrado”, assim se chama. A tradução é de Samir El Hayek, feita em São Paulo, Brasil, em 1974 d.C. ou, segundo a era islâmica, 1394 H. (da Hégira). Estamos agora, em Junho de 2010, no mês Rajab de 1431 H.

Julia Kristeva: "É preciso promover o diálogo entre quem crê e quem não crê"


Julia Kristeva, psicanalista, romancista e filósofa búlgara-francesa (coincidência, faz hoje 69 anos) publicou em italiano “Bisogno di credere” (“Necessidade de crer”) (Ed. Donzelli), um texto em que, mesmo sem renunciar às suas convicções filhas do Iluminismo, confronta-se com o universo da fé, e “Teresa mon amour. Santa Teresa d'Avila: l'estasi come un romanzo” (Ed. Donzelli), obra entre romance e ensaio, que analisa a personalidade e os escritos da santa espanhola do século XVI.
A filósofa deu uma entrevista ao “La Repubblica” (21-06-2010) que foi traduzida para português pelo Instituto Humanitas Unisinos (aqui).
Primeira pergunta/resposta.
D. Gianfranco Ravasi convidou-a para participar do diálogo entre crentes e não crentes. Parece-lhe uma oportunidade?
Hoje, ainda mais do que o diálogo inter-religioso, é preciso promover o diálogo entre quem crê e quem não crê, principalmente na Europa. Pertenço àqueles que, nas palavras deTocqueville e Hannah Arendt, cortaram o fio da tradição. Considero-me uma descendente do Iluminismo e da secularização que nos colocaram em guarda contra os riscos da religião: a neurose, as ilusões, os abusos, as guerras. O fio cortado da tradição nos permitiu movermo-nos rumo à liberdade, sem a qual não haveria o mundo da ciência nem o da arte, a aventura do empreendimento nem a dos novos amores. O fio cortado da tradição é uma conquista importante, mas é preciso evitar o desvio rumo a um niilismo sem valores e sem autoridade. Eis porque temos a necessidade de "transavaliar" a tradição. Isto é, repensá-la e atravessá-la, procurando tirar dela tudo o que pode ser positivo para nós, contemporâneos. Isso vale para toda a tradição, as três religiões monoteístas, mas também para a cultura clássica, o taoísmo ou o confucionismo.

24 de Junho de 1542. Nasce João da Cruz

É provável que S. João da Cruz tenha nascido no dia 24 de Junho de 1542, em Fontiveros, perto de Ávila, mas não há certezas absolutas. Como é dia de São João (o baptista), é provável. Morreu no dia 14 de Dezembro de 1591 em Úbeda, na Andaluzia.

Carmelita, poeta, místico, foi perseguido pela própria Igreja Católica. Amigo de Teresa de Ávila, com ela reformou a ordem carmelita.

É um dos grandes poetas espanhóis, com "Noite Escura da alma", "Subida do Monte Carmelo", "Cântico Espiritual" e "Chama de amor viva".

Cântico Espiritual (excerto)

Quando tu me fitavas,
Teus olhos sua graça me infundiam;
E assim me sobreamavas
E nisso mereciam
Meus olhos adorar o que em ti viam.

Não queiras desprezar-me,
porque, se cor trigueira em mim achaste,
já podes ver-me agora,
pois, desde que me olhaste,
a graça e a formosura em mim deixaste.

Demasiadas certezas sobre Deus


Revolta-me o modo como todas as religiões falam de Deus, por o tratarem com tanta certeza, ligeireza e familiaridade. (...) É uma espécie de espirro que lhes é habitual: a bondade de Deus, a cólera de Deus, ofender Deus são alguns exemplos. É considerá-lo como um homem e, o que é pior, como um burguês.

Gustave Flaubert (1821-1880)

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Padre António Vieira e a relação dos portugueses com as horas

Li na Estação Cronográfica um texto sobre uma certa relação entre o tempo e a religião.

No início do séc. XVIII, Soror Maria do Céu, em Avés Ilustrados, comparava: “Um mosteiro sem união é como um relógio desconcertado, tudo é tempo confuso, horas perdidas, cordas quebradas; uma congregação de religiosas é um retrato do Céu, se tem paz; e é um bosquejo do Inferno, se a não tem”.

O texto começa com uma citação do "imperador" da língua portuguesa.

No séc. XVII, o padre António Vieira lamenta-se nas suas Cartas de uma característica portuguesa que, porventura, hoje se manterá: “Já eu noutro melhor tempo me queixava de que a nossa nau não fazia viagem, por serem muitos os timoneiros e cada um na sua ampulheta seguir diferente rumo”.

Esta citação faz-me lembrar uma outra do mesmo António Vieira. Dizia ele, mas não sei localizar em que sermão, que Santo António (seria no "Sermão de Santo António aos peixes"?) tinha um duplo mérito. Primeiro, conseguia estar em dois locais ao mesmo tempo. Depois, sendo português, não se atrasava. Este segundo mérito sem dúvida que não era menor do que o primeiro.

Só há doze bispos no mundo. São todos homens e judeus

No início de novembro este meu texto foi publicado na Ecclesia. Do meu ponto de vista, esta é a questão mais importante que a Igreja tem de ...